Artigos de Economia

Luiz Gonzaga de Sousa

 

OS LUCROS INDUSTRIAIS

O problema dos lucros passa pela questão da distribuição de renda funcional visto que o produto nacional bruto ou renda nacional, mais especificamente, deve ser distribuído por quem teve participação em seu todo, isto é, em primeiro lugar, aos trabalhadores e em segundo, aos donos do capital. É este segundo ponto que se pretende trabalhar neste pequeno artigo, considerando a polêmica posição de que se considera lucro; a sua essência na relação capital/trabalho e seus efeitos dentro da economia como um todo. Por isto, é de fundamental importância fazer as seguintes perguntas: o que é lucro? Como se determina o lucro? O que é que dizem as teorias que discorrem sobre o lucro? Quais são os seus efeitos no processo de acumulação de capital? E assim por diante.

Ao se estudar a problemática do trabalhador, está-se buscando entender a sistemática salarial, mais claramente, a remuneração pelo trabalho de alguém, pois ambos são diferentes, entretanto, pela ótica do capital, o que se apresenta de imediato é o lucro, ou os ganhos de alguém pelo uso de seu capital e isto diz respeito à distribuição. Os determinantes da distribuição, em primeira instância, podem ser colocados pelo lado da alocação dos fatores, quer dizer: o trabalho que envolve habilidades (skills) e desejos, assim como o capital que é a riqueza através de herança, casamento bem sucedido, capacidade de poupar e depois a remuneração dos fatores (price), que leva em consideração a competição e o poder de monopólio que delimita cada vez mais o poder de barganha dos trabalhadores.

A questão da distribuição envolve eficiência e havendo eficiência, ter-se-á equidade entre os participantes agentes da economia. A eficiência chama a uma discussão muito longa e dificilmente se chegará a um denominador comum, porque este termo exige um sistema econômico perfeitamente equilibrado. Na realidade cotidiana, isto não acontece pelo excesso de acumulação; esta acumulação conduzindo a uma concentração e obviamente a uma centralização de poder, de decisões como ocorrem no mundo capitalista dos tempos hodiernos. Mais complicado ainda é a equidade, ou grosseiramente, justiça social, porque nisto está envolvida a questão de equidade para quem! É o problema da relatividade. O trabalhador tem um ponto de vista. O dono do capital tem outro. Assim seque sem solução.

Dentro desta linha de raciocínio, MUSGRAVE (1973) comenta KANT (1781) e RAWLS (1974) ao expressar que em algumas ocasiões um conjunto de imperativos maiores apontam para uma única solução positiva, enquanto que em outras, tais princípios apenas servem para definir as regras que irão orientar a tomada de decisões. Veja que o processo de decisão das remunerações envolve além da relação capital/trabalho a própria evolução da humanidade em cada contexto, ou em cada situação, isto é, a moral, os costumes, a sociologia das relações humanas são fatores essenciais na estipulação da participação relativa dos fatores produtivos na renda nacional, a tal ponto que tem levado a uma acumulação acima das necessidades prementes de determinada sociedade, criando estratificações deprimentes.

Fundamentalmente quanto a questão do lucro envolvido no processo distributivo, pode-se considerar que lucro, dentro da visão capitalista é tudo aquilo que sobra além dos custos que foram imputados durante o processo de produção. Esta visão é muito simplória propositadamente, tendo em vista que quem participa diretamente desta produção, no caso o trabalhador, é-lhe escondida a sua real participação neste contexto, pois, sabe-se de quanto um trabalhador ganha, mas não se tem consciência exata dos lucros do dono do capital. Sofisticadamente, diz-se que o lucro é o pagamento feito ao dono do capital pela sua participação na produção, o que significa dizer, depois de todos os gastos na produção de um determinado produto, imputa-se um ganho ao seu proprietário.

Para melhor se entender a questão do lucro, D. M. LAMBERTON (1965)41 diz quem muitas são as definições de lucro e mesmo nos escritos dos contemporâneos elas são encontradiças. Ouvem-se ainda os ecos da identificação mercantilista do lucro com o comércio (muito criticado) e do seu uso, ligeiramente menos amplo, na teoria da distribuição na qual ele é contrastado com os salários e compreende, em geral, a renda dos proprietários. Como a diferença entre a renda esperada e a realizada, o lucro, seja ele positivo ou negativo, pode ser um componente de todas as categorias de renda. Si se atribui essa divergência de valores ex-post e ex-ante à mudança econômica e essa mudança surge do processo de inovação, o lucro se torna a recompensa do inovador. Pode também o termo ser aplicado à remuneração do poder de venda de preferência à remuneração da produção.

Esta posição de LAMBERTON (1965) dá um conceito bem moderno de lucro, uma definição bem próxima de Josepf SHUMPETER (1939), abstraindo-se das posições clássicas e neoclássicas de que seja lucro. Para estes, o lucro seria uma decorrência de mercado, isto é, numa situação perfeitamente competitiva, o curto prazo determinaria lucros extraordinários cuja mobilidade dos fatores e dos produtos e livre troca seriam eliminados ao longo do tempo. Neste caso, o lucro seria uma decorrência das forças competitivas, quer dizer, seriam ganhos que o produtor/vendedor teria por participar do mercado e a magnitude deste lucro seria determinado pelo grau de competição interprodutores, pois os clássicos e neoclássicos não levavam em consideração o empresário no processo de barganho.

A figura do empresário é nova. O empresário retira do capitalismo a noção de dono e produtor do capital. O empresário exerce as funções do capitalista, mas não o é, tendo em vista que o processo de dinamização do capital é assumida pelo empresário, entretanto, este é um funcionário do capital para esconder da visão da crítica a sua estrutura de exploração e despotismo. Nesta fase, realmente o lucro toma nova substância, deixa de ser o ganho pela aplicação de seu capital e passa a ser um pagamento ao empresário pela sua criatividade e inovação e o lucro capitalista agora é chamado de dividendos, ou pagamentos pela suas cotas acionárias, cuja autoridade empresarial continua tendo as mesmas funções de domínios e exploração.

Quer queira, quer não, o lucro ainda é o meio de acumulação de capital e mesmo transmutando em diversas categorias, não se pode esquecer essa face de acumular riqueza, de fomentar a concentração e de dificultar uma otimização no processo distributivo, isto é, participação igual a quem contribui para a formação da renda nacional. A atuação dos lucros na economia fez estratificá-la em grandes, médios, pequenos e micros industriais (empresários), induzindo a cada um, um processo de exploração diferente, dependendo de sua atuação no mercado em termos de concorrência. Frente a isto, as idéias rousseaunianas de que os indivíduos são potencialmente iguais e que as relações sociais devem ser derivadas dessa premissa não tem nenhuma razão de ser.

Observe que os grandes conglomerados utilizam a busca pelos seus lucros de maneira distinta dos demais, pois o mesmo acontece com os pequenos industriais. Veja que, considerando que as grandes indústrias têm seu módus operandi na alta escala, mesmo obtendo uma massa de lucros mus vezes maior do que os pequenos empresários, sua taxa de retorno é bem menor do que a deste último, que tem uma massa de lucratividade bem menor. Por que acontece tal fato? Em princípio é a tecnologia de livre acesso aos grandes e dificilmente chega aos pequenos e depois, é a estrutura de poder quem lhe garante segurança na efetivação de seus investimentos com cobertura do Estado e até mesmo a sua participação em termos de incentivos e subsídios a fundo perdido.

Deste fato já se tem um problema, isto é, uma estratificação dentro da própria classe de indústrias, pois esta taxonomia decorreu da própria imperfeição do mercado e pautada no princípio do laissez-faire. A liberdade (freedon) geral do mercado facultou a intensificação da exploração; a contenda exagerada inter-industrial e a fomentação do "salve-se quem poder", pois é difícil compreender tal raciocínio. A formação de grupos ricos e grupos pobres em todos os sentidos, dificultou e dificulta uma estabilidade plena e duradoura, mas apenas criando momentos de prosperidade econômica, embora uns vivam bem e outros sobrevivam mal como é próprio de um sistema que vive eternamente de crises e até se alimenta delas, para a sua permanência como capitalismo.

Ainda na pretensão de entender o significado de lucros Joseph Antoine SCHUMPETER (1939)42 explicou que lucro, no nosso sentido, é um rendimento funcional - suas peculiaridades e especialmente seu caráter temporário constitui uma razão justificável para que se hesite em denominá-lo renda - mas nem sempre seria prudente distribuir a função empresarial de acordo com o critério do processo de acumulação. Quer ele acresça ou não, ao empresário depende do padrão internacional... Na indústria organizada sob a forma de sociedades por ações, os lucros acrescem à própria firma, sua distribuição deixa de ser automática e torna-se um assunto de política - acionistas, dirigentes contratados (sejam ou não empresários) e empregados recebendo sob as mais variadas formas... quinhões indeterminados dos lucros ou equivalentes contratuais de participação nesses lucros.

Nas palavras de SHUMPETER, verifica-se que mais um significado do termo lucro e se acrescentaria com mais força, acresce-se neste instante mais uma complexidade de inter-relação lucros econômicos como um todo. É evidente que lucro nesta hora quer dizer um pagamento pelo trabalho do empresário, entretanto, como coloca SHUMPETER, nas sociedades anônimas o lucro não toma a forma de pagamento ao empresário, tendo em vista que existe uma parte que volta ao setor produtivo em forma de re-investimento. Neste contexto, o que prevalece são as decisões sobre o andamento da empresa como um todo, portanto, a política da empresa é salutar para verificar como os lucros serão distribuídos aos seus acionistas, pois o pagamento ao empresário constitui-se em um salário.

Mudando de ótica sobre a questão do lucro, observa-se que o lucro realiza-se quando uma mercadoria é vendida pelo valor segundo Karl MARX (1867), pois aqui vale apenas conceituar o que significa valor e segundo a versão marxista, valor quer dizer o quanto custa uma mercadoria, levando-se em consideração as horas efetivamente empregadas de trabalho humano. Nas palavras de MARX (1967)43, o valor de uma mercadoria é determinado pela quantidade total do trabalho que contém. Porém, uma parte dessa quantidade de trabalho representa um valor pelo qual foi pago um equivalente sob a forma de salários e outra parte acha-se incorporada num valor pelo qual não se paga equivalente. A este equivalente não pago, MARX chamou com mu propriedade de mais-valia, ou sobre-valor.

Entendido este aspecto, pode-se já neste momento, definir o que MARX (1867)44 denominou de lucro, pois em seus escritos ele disse o seguinte: assim ao vender a mercadoria pelo seu valor, ou seja, como cristalização da quantidade total do trabalho nela empregado, o capitalista deve fazê-lo forçosamente com um lucro. Não vende apenas o que lhe custou um equivalente, mas também o que não lhe custou nada, embora isto custasse trabalho ao seu operário. As despesas de produção da mercadoria para o capitalista e o seu custo real são duas coisas diferentes. Repito, pois, que se conseguem lucros normais e médios quando se vendem as mercadorias, não acima do seu valor real, mas pelo seu valor real.

Para Karl MARX (1867) há sempre no sentido capitalista uma super-majoração dos lucros que os empresários industriais recebem pela confecção de um determinado produto, isto significa dizer que há sempre o lucro normal do industrial e, sobretudo, um excedente que este se apropria sem nenhuma contra-partida. É este ponto que se denomina de mais-valia, cuja resultante proporciona maior rapidez no processo de acumulação de capital e, obviamente, a concentração que forma os conglomerados, os cartéis, os trustes e/ou qualquer forma de congregação que busque eliminar a competição e fomentar o lucro excessivo. Essa meta conduz a formação de monopólios que dm as normas da economia e planejam a política para assegurarem o seu domínio hegemônico no comércio.

O mercado livre foi ultrapassado ao longo da história e, especificamente, depois da "Revolução Industrial", considerando que os progressos tecnológicos que aconteceram naquele momento e ao longo desses anos, fizeram com que alguns industriais que tiveram acesso a estas novas tecnologias, acumulassem e conseguissem concentrar em seu poder grandes fortunas. Este acesso decorreu de duas maneiras, em primeiro lugar, por ter financiado as grandes invenções e depois, por ter acumulado pela hegemonia empresarial que tinha sobre a agricultura, pois aqueles industriais que caminhavam lentamente neste processo foram açambarcados por aqueles que tinham alguns recursos e partiam para novas investidas na busca de grandes lucros e/ou novas explorações econômicas.

Este sistema de oligopolização da economia já sobrevive a muito tempo e tem causado mus dificuldades à humanidade como um todo, impondo multi-explorações, tais como lucros excessivos e salários baixos a quem participa diretamente do processo produtivo e além do mais, tem criado na humanidade o princípio do egoísmo e ganância de maneira generalizada. Todavia, vendo que todas as artimanhas de exploração estavam se esgotando, partiram para a formação das sociedades anônimas, tendo em vista a contenda inter-industrial, com repercussões catastróficas para todos e a maneira mais viável foi unir forças para que o inimigo comum não fosse o companheiro, mas sim os consumidores que tem a função de serem duplamente massacrados nesta luta de feras.

Inegavelmente as sociedades anônimas foram um prenúncio disfarçado de que a economia se socializava, pelo menos dentro da ótica da distribuição dos lucros dentro da estrutura dos monopólios societários, quer dizer, socialização dos ganhos inter-industriais e nunca em conjunto com os trabalhadores que é quem realmente proporciona valor à mercadoria. Dentro do aspecto da centralização, MARX já tinha antevisto este ponto, pois ficou claro em seus escritos que a sociedade anônima exerce efeito muito mais longe do que se imagina sobre o caráter e a maneira de funcionar a produção capitalista. Este pensamento de Paul M. SWEEZY (1981) denota que tipo de socialização que a economia industrial tinha com as sociedades anônimas, portanto, uma farsa.

F. ENGELS (1847)45 foi quem divulgou esse pensamento de MARX, quando juntou seus rascunhos e formou o volume II de O Capital, que é o ápice do pensamento marxista e uma das maiores obras do pensamento econômico. Quanto às sociedades por ações MARX colocou três pontos de fundamental importância para o seu entendimento, quais sejam: a) Uma enorme expansão da escala de produção e das empresas, que eram impossíveis para os capitalistas individualmente...; b) Capital... está aqui diretamente dotado de forma de capital social... em contraposição ao capital privado, e suas empresas assumem a forma de empresas sociais em contraposição às empresas individuais. É a abolição do capital como propriedade privada dentro dos limites da própria produção capitalista e c) A transformação do capitalista atual num simples gerente, administrador do capital de outras pessoas, e dos proprietários do capital em meros capitalistas do dinheiro.

Estes pontos levantados por MARX em seus alfarrábios trabalhados por F. ENGELS (1847), são prodigiosos quanto a formação e dinâmica das sociedades anônimas indicando a perda de poder direto do capitalista/dono, para o Capitalista/acionista, cujo dono do capital se afasta do processo produtivo atribuído a um novo assalariado o poder de mando, o empresário. Quanto a isto MARX usa de sua inteligência e não exalta a sociedade anônima como um primeiro passo para o controle da produção está nas mãos da sociedade, pois pensando desta forma, estaria totalmente correto no seu ponto de vista. A liberação do dono do capital industrial fez surgir ou fomentar um novo tipo de capitalismo, o do capital financeiro que sangrou ferozmente o processo de produção ativo.

No mundo moderno, propaga-se já a livre concorrência, quer dizer um retorno ao laissez-faire; não como foi nos séculos XVII e XVIII, mas com uma roupagem adaptada à tecnologia, às habilidades e ao pensamento do século XX. Em si investigando esta questão GRAY (1965)46, declarações perante a Sub-Comissão sobre Antitruste e Monopólio, da Comissão do Judiciário, do Senado dos Estados Unidos, colocou que as grandes empresas só empreendem inovações como promessas de aumento em seus lucros e em seu poder ou para proteger sua posição no mercado (...) homens livres e competidores sempre foram os verdadeiros inovadores. Sob a disciplina rigorosa da competição, eles têm de inovar para prosperar e sobreviver.

Esta posição diz respeito a uma abertura internacional para uma maior dinamização do capital monopolista que se encontra com seus lucros aprisionados pelas barreiras aduaneiras, como proteção aos lucros internos de cada país e isto está acontecendo porque o processo de exploração capitalista foi intenso e precisava ser barrado. Todavia, tinha que se tomar uma posição quanto ao avanço dos trustes e cartéis que ameaçavam a soberania nacional de países pobres e que precisava sobreviver, mas não tinham condições, devido os altos lucros que eram transferidos às suas matrizes sem nenhuma contra-partida. O desenvolvimento deve ser de todos e para todos, pois isto só se faz através do lucro que se reinveste na produção doméstica, e nunca enviado ao exterior.

Em suma, o lucro é a fonte fundamental de acumulação, de concentração e de centralização de poder. Visto por este lado, a desigualdade é a primeira arma que aparece contra quem tem mais participação em sua formação que são os trabalhadores; os geradores de mais valores expropriados por alguém que os relega à própria sorte. O lucro é fonte de ganância, de ódio, de rancor e desarmonia entre os agentes econômicos da sociedade que busca a sobrevivência, mas só encontra o subterfúgio e a degradação do ser humano. Desta feita, o lucro deveria ser apenas uma variável de remuneração do capital (reposição e acumulação) e de pagamento pelo trabalho do empresário e nunca um meio de exploração e demolição da raça humana, como está acontecendo hoje em dia.


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