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Keynes em Cambridge 1932-1935
Mario Gómez Olivares

1.         A discusão sobre o problema da acumulação: o mundo antes da grande depressão

 

Robertson atribui a Keynes o ponto de vista de que o excesso de poupança sobre o investimento poderia ser medido pela existência de depósitos ociosos nos bancos[1]. Concordando com Keynes no problema do excesso de poupança sobre o investimento, insiste em que os depósitos ociosos são uma primeira evidência disso[2], não objetando que o conceito de propensão à ‘hoarding‘ é correctamente um dos elementos importantes na caracterização do  ‘trade depression‘. Keynes analisando o artigo de Robertson conclue que este utiliza o conceito de ‘hoarding‘: a) como um incremento nos depósitos ociosos; b) como um incremento na propensão à ‘hoarding‘ e c) como um excesso de poupança sobre o investimento. Concluído que apenas nos casos b) e c) dá uma interpretação correcta da sua opinião[3]. No caso de interpretar a versão do problema  do excesso de poupança no ‘Treatise‘, como depósitos ociosos, incorreria do mesmo erro de Pigou que considerando o excesso de poupança, como manifestando-se nos depósitos ociosos, está dizer  de outra maneira que um incremento nos depósitos ociosos é uma redução da velocidade de circulação da moeda, i.e., quando Keynes diz que um excesso de poupança produz uma baixa dos preços, está a dizer, segundo Pigou e Robertson, que a velocidade de circulação da moeda diminui.

A fim de clarificar esta situação Keynes, publica um artigo no Economic Journal destinado a elucidar como se determi­nam os preços dos activos líquidos e não líquidos[4]. O conceito de ‘hoarding‘ era importante no seu sistema do ponto de vista do motivo psicológico que leva às mudanças dos preços. Se existe uma procura adicional de investimento, o preço dos bens de investi­mentos teriam que “ rise sufficiently to induce the existing holders, given their degree of bearishness, to part with non-liquid assets”..”presumably this will mean some increase in the price of non-liquid assets, how much depending on the shape of the curve”..”what the state of mind of the public towards holding money, and the change in this state of mind, determine is the price of non-liquid assets”, dependendo da propensão a ‘hoarding‘‘. Este é um argumento que não repete exclusivamente o argumento do ‘Treatise‘ sobre o sentimento ‘bear‘, move-se no sentido da preferência pela liquidez[5], embora seja difícil dizer até que ponto o próprio Keynes identifica a novidade do seu argumento. Nesta discussão com Robertson vem a luz a falta de claras definições relativamente a poupança e investimento.

No ‘Treatise‘ a distinção entre poupança e investimen­to permitiam distinguir que tratava-se de duas actividades económicas que poderiam não conduzir a uma igualdade. Distinguin­do entre ‘thrift‘ e ‘enterprise‘, Keynes tinha dito que ‘mere abstinence is not enough by itself to build cities or to drain fends”, e que foi ‘enterprise which builds and improves the world‘s possession[6]“.

Mas no ‘Treatise‘, a igualdade entre S e I, toma como base que o rendimento não inclui perdas ou ganhos ocasionais. A poupança pode ser definida como sendo o rendimento menos o consu­mo. O valor do output é por definição igual ao rendimento. Como o rendimento apenas pode ser gasto em bens de consumo e bens de investimento, então o investimento é rendimento menos consumo, a mesma definição que para poupança. Desse modo a poupança é igual ao investimento, desde que as expectativas sejam realizadas.

No ‘Treatise‘, Keynes pretendeu responder ao problema do desequilíbrio entre S e I, considerado as expectativas reali­zadas; a novidade teórica era considerar que eles poderiam ser desiguais. Todo depende de se a definição  de rendimento implica lucros realizados ou esperados. Se existe uma situação de excesso de poupança, o consumo seria reduzido; se a procura de bens de consumo não fosse compensada com um incremento da procura de bens de investimento, o output no seu conjunto decairia necessaria­mente. A parte do rendimento que os empresários esperavam ser o seu lucro normal é perdido. Mas o conceito de rendimento no ‘Treatise‘ apenas compreendia o nível das receitas esperadas e não as realizadas, e o investimento era definido como igual às actuais remunerações menos o consumo. A definição de poupança não era a mesma de Keynes. No comentário de Kahn a Keynes, este escreve: “ surely Dennis is merely adopting a perfectly simple-minded and natural definition of saving-receipt minus expendi­ture[7].

Nesse caso poupança é o mesmo que investimento. Mas Keynes considera a poupança um residual do rendimento, em que inclue os lucros esperados, e não das receitas, pelo que um excesso de poupança sobre o investimento é igual a um perda não esperada. Robertson marca sem dúvida um ponto ao criticar Keynes na sua confusa terminologia: “ How many of those who have taken up the cry that a slump is due to excess of Saving over Investment, and a boom to be an excess of Investment over Saving, realise that the saving which are so deplorably abundant during a slump con­sist largely of entrepreneur‘s income which are not being spent, for a simple reason that they have not been earned?[8]. De acordo ao ‘Treatise‘, o excesso de poupança re-equilibra as perdas ocasionais ou inesperadas, sendo o produto da diferência entre o nível do rendimento antecipado e o actualmente realizado. No excesso de poupança encontraria-se a cobertura da existência de perdas, sendo o investimento produtivo actual a expressão das poupanças desejadas. As perdas ocasionais reflectem a extensão  dos rendimentos reduzidos.

A ambigüidade colocada em evidência por Robertson consiste em que na formulação do ‘Treatise‘, o excesso de poupança manifesta as perdas financeiras, mas que não tem forma de poupança, porquanto nunca foram, nem podem ser constituídas como tal. Para manter a igualdade entre S e I, era necessário que o nível de rendimento se modifica-se, mas isso seria uma outra teoria, que Keynes ainda não tinha em mente, pelo que mantendo-se aferrado ao seu conceito de ‘hoarding‘ para o excesso de poupança, sem realmente sair da confusão, mantinha-se no caminho da sua nova teoria da procura efectiva.

A discussão com Hawtrey também parte do problema dos conceitos, como anteriormente tivemos oportunidade de dizer e agora podemos aprofundar. Para Hawtrey a poupança era a diferença entre receitas (earning) e as despesas(expenditure) e, o investi­mento era a diferença entre o valor do output e a despesa em consumo, pelo que a diferença entre poupança e investimento é igual a diferença entre receitas e o valor do output[9]. A diferença entre S e I, “is simply another name for the windfall gains or losses or for the difference between prices and cost of the output and dependeded therefore on movement of the price level relative to cost[10]“. A diferença poderia ser compensada ou não através das flutuações dos stocks. E este era o ponto cruxial para  Hawtrey: “ It is mainly on this point that I find it neces­sary to differ from Mr Keynes‘s analisys[11]“, porquanto Keynes assume que não há variação nos stocks dos bens acabados, o que equivale a dizer que os preços dos bens acabados se ajustam imediatamente às mudanças da procura, de modo que a quantidade vendida permanece intacta a menos que e antes de que o output seja afectado[12].

O ponto de vista de Keynes é que as mudanças nos stocks eram uma indicação prévia de que os preços iriam descer e que o que interessa é a queda antecipada dos preços no fim do período de produção, pelo que a acumulação de stocks não era significativa exceptuo quando “ it temporary retards and dis­guises the ultimate effect on prices[13]. Na Addemdum ao ‘Treatise‘, Hawtrey utilizando um exemplo numérico, conclui que se os preços dos bens de consumo caem suficientemente, a equação fundamental dos preços explica bem o ciclo dos preços, no sentido que os produtores, face as perdas ocasionais, são forçados a poupar as receitas que eles não recebem. Mas se os preços não caem em primeiro lugar, as equações fundamentais não registam as perturbações do equilíbrio; se as encomendas são reduzidas, com consequências sobre o nível do output, isso conduzirá a uma redução dos rendimentos, do que se seguirá alguma redução dos preços, com o corte do output provocada pela redução da procura, sublinhando “it may be pointed out that this progressive contrac­tion in the consumer‘s income could not fail to cause some fai­ling off of saving[14]. Este também era o ponto de crítica de Robert­son.

Para Keynes a ordem normal dos acontecimentos seria: a) um declinio no investimento, b) uma queda dos preços, c) uma queda do output e d) uma maior e severa queda dos preços, maior que o requerido pelo ajustamento. O exemplo de Hawtrey não constitue para Keynes senão a forma como o processo no mercado tem lugar condizendo à mudança dos preços. O problema de Hawtrey estava em querer demonstrar que as equações fundamentais não consideravam as variações nos stocks, pelo que um declino na procura dos bens de consumo provocaria um corte no output antes que tivesse consequências sobre o nível de output, “ the greater the contraction of output the less is the windfall loss[15]“.

A resposta de Keynes procurando esclarecer a confusão, deriva numa re-apreciação do que significa ‘departure of equilibrium‘, i.e., define-o como equilíbrio de preços e custos, mantendo que “ that there is not likely to be more then a transitory departure from the optimum level of output unless there is an actual or antici­pated profit disequilibrium[16]“. Mas como no conceito de rendimen­to, os lucros eram antecipados, o conceito de equilíbrio signifi­cava equilíbrio de output óptimo ou e pleno emprego[17].

Na lógica de Hawtrey, de acordo com a sua definição de rendimento, a poupança é igual ao investimento, enquanto que para Keynes, nada pressupõe  que poupança seja igual ao investimento e que o investimento produtivo resulta dos fundos disponíveis, mas para Hawtrey seria verdade se houvesse criação de credito para fins de investimento. Os pontos de vista eram divergentes. No ‘Treatise‘ Keynes procurou argumentar que havia um problema na contabilidade entre poupança e investimento. Hawtrey sugere que se uma nova emissão excede os fundos disponíveis para investimen­tos, i.e. a poupança, o mercado encontrará o expediente para utilizá-la. Keynes sublinha que o equilíbrio seria surpreendido por uma tendência crescente ao desvio(divest) ou uma tendência crescente ao investimento, o que representa um mercado com uma propensão à ‘bearnishness‘.

Esta diferença de opiniões encerra uma discrepância filosófica maior, pois reflecte um grau de crença diferente na qualidade da estabilidade do sistema e da eficácia da política monetária. O entendimento de Hawtrey é de que o mecanismo de mercado, quando a poupança aumenta, faria com que se a nova emissão é insuficiente para tomar o excesso de fundos disponíveis, os bancos iriam a reduzir a taxa de juro; isto iria a ter um efeito estimulante e reforçar o incentivo ao investimen­to. O crédito mais barato iria  incrementar os rendimentos e despesas dos consumidores, incrementar as vendas de bens de consumo, incrementar as despesas em bens de capital e estender a capacidade produtiva. Alternativamente, o mercado seria capaz de gerar uma actividade nos produtores de bens de capital equiva­lente às perdas dos produtores de bens de consumo, o que implica que existiria um efeito de transferência, um crowding out secto­rial, pelo que apenas um afrouxamento nas condições de crédito teria efeitos expansivos.

O ponto central da discórdia mantinha-se: as definições e significado do excesso de poupança sobre o investi­mento. Keynes escreve a Hawtrey “ as I mentioned to you, I am working it out all over again. Whilst in some respect my new version will please you no more than the old, in some respect I shall, I think, be meeting some of your points. The main respect in which you may find the exposition easier is that I put less fundamental reliance on my conception of saving and substitute for it the conception of expenditure. Also generally speaking I do not have to deal with absolute amounts of expenditure, but with increments and decrements of expenditure. This is, so to speak, the inverse of saving, since saving is the excess of income earning over expenditure; but since there are two senses in which income can be used, it is much preferable to use a term about which everyone agrees[18]“. Esta carta monstra obviamente que Keynes se preparava para escrever outro livro, procurando desfaz­er os equívocos e confusões em torno das equações fundamentais, i.e., do cerne teórico da sua obra anterior, pelo que necessaria­mente deveria ter um carácter teórico.

Uma terceira linha de crítica ao ‘Treatise‘ surge das fileiras dos seus colaboradores e ex-alumnos de Cambridge, conhe­cidos como o ‘Circus‘, P. Sraffa, R.Kahn. J. Meade, J. e A. Robinson.

Os problemas levantados por Sraffa seguem a linha de Robertson, e de certo modo o artigo de Keynes já citado, “A rejoinder”, responde a essas questões, o que mereceu o acordo satisfactório de R. Kahn numa carta de 7 de Maio de 1931, aprovei­tando de abrir outro frente de batalha, o problema da relação entre o preço dos bens de investimentos P‘ e o preço dos bens de consumo P. Para Kahn P depende de P‘, porque no caso mais geral o volume dos depósitos de negócios depende de P e P‘, pelo que a relação entre P e P‘ torna-se mais importante desde um ponto de vista lógico; de certo modo P‘ depende de P, porquanto P ajuda a formação dos depósitos de poupança, pelo que P e P‘ em certa medida estão correlacionados[19]. Para Keynes o nível dos preços dos bens de investimento estava determinado pelo volume dos depósitos de poupança e pela propensão à ‘acumulação‘, enquanto que o nível dos preços dos bens de consumo relativamente aos custos de produção depende  do excesso de poupança sobre o investimento, admitindo porém, que uma variação dos preços dos bens de investi­mento pode influenciar um excesso de poupança sobre o investimen­to e portanto no nível dos preços dos bens de consumo, enquanto que  o preço dos bens de consumo é incapaz de mudar a propensão à acumulação e portanto o preço dos bens de investimento[20].

Se houve uma resposta de Keynes, nada se pode dizer[21]. Neste período, o verão de 1931, Keynes vai à América, onde pronúncia as suas célebres conferências na Fundação Harris de Chicago, que em termos teóricos, e como não poderia deixar de ser, dada a natureza das conferências, nada de novo expressa, apenas uma passagem em que desenvolvendo a ideia de que a causa da depressão estava na queda do investimento, que pela sua vez conduzia a uma queda dos lucros que provocava uma queda do out­put, não dos preços como falava no ‘Treatise‘, fala de um equilíbrio de baixo nível de output “which represents a kind of spurious equilibrium[22]“. 

Mas o nó teórico da sua exposição, as causas do ciclo do crédito e as suas aplicações aos casos americano e británico segue o ‘Treatise‘. As soluções de resolver o problema, são de certo modo uma re-edição das suas propostas políticas contida últimos tres capítulos desse livro, mas numa dimensão internacional, dando lugar a necessidade da cooperação internacional em matéria de taxa de juros de curto e longo prazo a fim de cortar a espiral deflacionista mundial, com a retoma do investimento. Recobrar a confiança dos investidores a través da política combinada dos bancos centrais mais importantes do mundo através da taxa de juro de curto prazo, operações de mercado aberto áu outrance‘ para descer a taxa de juro de longo prazo contribuindo para que os preços dos títulos de longo prazo aumentassem, e intervenção dos governos incentivando o investimento em áreas pouco sensíveis à taxa de juro: construção, transportes e serviços públicos como ‘breaking point‘ na retoma do investimento.

Tínhamos dito que no ‘Treatise‘ e nos debates sobre política económica, Keynes tinha aceite teoricamente a necessi­dade de adequar os rendimentos monetários à queda dos preços, a fim de aumentar os lucros dos empresários, o que na práctica queria dizer reduzir os salários. A oposição à utilização desta arma era de natureza política e social. Agora Keynes retoma um argumento que está presente no ‘Treatise‘, mas que não tinha utilizado nos debates, i.e., uma redução dos salários implica uma redistribuição dos rendimentos, porquanto a redução não é simultânea, nem igual, e por outro lado a deflação mantém uma pressão sobre os devedores, favorecendo os rentiers. Os cortes salariais iriam significar sobre tudo uma distribuição dos rendimentos dos assalariados para os rentiers sem que a poupança em excesso sobre o investimento fosse diminuída: “ Therefore you will have larger purchasing power for these people whose money incomes are nor cut, so will be simply transferring purchasing power from the wage earner to the rentier class[23]“. O equilíbrio que pretendia manter é social, baseando-se numa postura ética, mas nada que teoricamente explique a rigidez dos rendimentos.

O  ‘Circus‘ de Cambridge tinha-se sentado a digerir o ‘Treatise‘  durante o período de Janeiro a maio de 1931-[24], com alguns convidados exclusivos, mas sem que Keynes toma-se parte no debate. Richard Kahn era considerado como o intermediário da troca de ideias e opiniões entre Keynes e o ‘Circus‘. J. Meade relata o processo de maneira curiosa: “ From the point of view of a humble mortal like myself Keynes seemed to play the role of God in a morality play; he dominates the play but rarely appeared himself on the stage. Kahn was the messenger Angel who brought messages and problems from Keynes to the ‘Circus‘ and who went back to heaven with the result of our deliberations[25].

Os temas discutidos principalmente são os que se derivam das equações fundamentais, onde a diferença potencial entre poupança e investimento é susceptível de ser ajustada  através dos movimentos dos níveis dos preços dos bens de investi­mento e de consumo. Na célebre parábola ‘The Widow‘s Cruse‘ utilizada por Keynes para exemplificar o processo de ajustamento que se deriva de uma trasferência de poupança para consumo a partir dos lucros dos empresários, que por incrementar as vendas de bens de consumo, deixa intacta a riqueza pertencente a estes, assume um output nacional fixo que se ajusta pelos preços. Como Teoria Geral, é inadequada na medida em que reporta um caso limitado, aparecendo os olhos do ‘Circus‘ como a ‘Widow‘s cruse fallacy‘‘.

O artigo de R.Kahn sobre o multiplicador foi o primei­ro impulso na crítica. De acordo com Moggridge, uma versão do artigo preparado no verão de 1930, tive o conhecimento de Keynes, embora tarde demais para modificar o ‘Treatise‘. A versão de 1931 era mais elaborado.  Do artigo de Kahn[26] resulta claro que o nível dos preços dos bens de consumo e os bens de investimento seria determinado pelas suas respectivas curvas de oferta e pelos movimentos ao longo delas provocadas pelas mudanças na despesa nacional em cada um desse sectores. Um aumento de preços signifi­cativo surgiria se a curva de oferta crescesse em declive, disto conclue Kahn “ At normal times, when productive resources are fully employed, the supply of consumption goods in the short period is highly inelastic.. But at time of intense depression when nearly all industries have at their disposal a large surplus of unused plants and labour, the supply curve is likely to be very elastic. The amount of secondary employment is then large and the rise of prices is small[27]“.

A tentativa de introduzir os factores que determinam o tamanho do multiplicador nas equações fundamentais do ‘Treatise‘ falharam, sendo apenas compatíveis no caso extremo em que “ where it is not the supply of consumtion goods that is completely inelastic but total employment if fixed, so that, if investment increased, the production of consumtion goods must diminish by an equal amount...that Mr. Keynes‘s equations apply in their full simplicity[28]“. A conclusão de Kahn é que os pressupostos de Keynes não eram realistas nas condições de de 1931, com a alta probabi­lidade que o emprego poderia ser incrementado sem que surgissem alterações significativas na diferença entre poupança e investi­mento.

Um outro problema que é discutido é a medida do custo de investimento, problema que é apresentado por J. Meade e que é incorporado no multiplicador de Kahn, sendo conhecido como a ‘Mr. Meade‘s Relation‘. Este propõe que quando  a oferta não é perfei­tamente elástica, o custo de investimento é igual a: poupança nos subsídios de desemprego + mais o incremento no excesso de importações sobre as exportações + o incremento nos lucros no gastos - a diminuição da poupança devido ao incremento dos preços. Explicada por Kahn  esta relação “ could be deduced in an a priori kind of way by considering that money paid out by the government to the builders of roads continues to be passed on from hand to hand until it reaches one of the culs-de-sac indi­cated by the various term on the right-hand side of the equation[29]“. Esta relação implica que o multiplicador deveria adicionar não apenas doses sucessivas de despesas de consumo como doses sucessivas de não-despesas, i.e., poupança, o que garante que  S é igual ao investimento inicial[30].

Um terceiro frente de ataque às equações fundamentais foi retomado por Kahn[31], devido as diferentes causas na determinação por Keynes dos níveis dos preços dos bens de inves­timento e dos bens de consumo. Para Kahn os níveis dos preços dos dois sectores estavam relacionados, exceptuo no caso em que os lucros não fossem  utilizados no consumo, pelo que a diferença entre bens de consumo e bens de investimento era uma questão de grau, sendo as formulações das equações fundamentais uma confusão[32]. Como sublinha Moggridge “ Thus another area of dissat­isfaction with the Treatise formulation was exposed..Thus within a short time i the winter and sprig of 1941 the ‘Circus‘ had in its hand most of the important ingredients of the system which was ultimately to appear in the General Theory[33]“, o que será verdade apenas se consideramos que o próprio ‘Treatise‘ continha material a ser escudrinhado,  revisto e desenvolvido a luz de crenças antigas. O que é verdade é que aparato das equações fundamentais se transforma num sistema em que os factores de ajustamento não privilegiam apenas o sistema de preços, mas num sistema da determinação da actividade e o emprego com reacções sobre os preços: o multiplicador de Kahn e a relação com Meade. O sistema de expansão e contracção examinado “ was a process that eliminated differences between saving and investment otherwise than thought the accumulation of unspent money balances. Such concepts as the elasticity of supply of output as a whole, of consumption goods and of investment goods were also in common use[34]“.

No artigo publicado na Economica em Fevereiro de 1933 de J.Robinson “ A Parable on Saving and Investment”, mas apresen­tado a Keynes em Abril de 1932, esta relata que Keynes concede justificação às críticas em relação a parábola da ‘Widow‘s cruse‘. Este estava apenas considerando a queda do nível dos preços, deixando o output inalterado. Numa outra carta Keynes escreve a J. Robinson “ I think you are a little hard on me as regards the assumption of constant output. It is quite true that I have not followed out the consequences of changes of output in the earlier theoretical part. I admit That this wants doing, and I shall be doing it in my lectures; though that does not absolve me from being criticise for not having done it in my Treatise. But in my Treatise itself, I have long discussions with the effects of changes in output; it is only at the particular point in the preliminary theoretical argument that I assume constant output, and I am at pains to make it absolutely clear[35]“. Embora seja verdade, como Keynes refere, que este considerou ajustamen­tos no output, nunca explicitou a forma como operava esse ajusta­mento, do mesmo modo como as forças equilibradoras da taxa de juro o faziam relativamente à poupança e investimento ou as outra forças que desequilibravam a poupança e o investimento, alias implicitamente este admite que existem re-equilíbrios a nível do output e o emprego, a fim de reduzir os salários, quando critica a política deflacionista da subida da taxa de juro bancária.

Entretanto J. Meade regressa no outono de 1931 a Oxford “ confident that he took with him back to Oxford most of esencial ingredients of the subsequent system of the General Theory[36]“. Certamente que esta confiança pode ser relevada se considerarmos o que efectivamente é novo na Teoria Geral. O contra-ataque de Keynes evidencia-se no prefácio a edição japone­sa do ‘Treatise‘: “It is not, however, my intention to revise the existing text of this Treatise in the near future. I propose, rather, to publish a short book of purely theoretical character, extending and correcting the theoretical basis of my views as set forth in Books III and IV below[37]“.


 

[1] Numa carta Robertson escreve a Keynes: "I should like to have been able to subscribe to the fundamental analysis of your Trea­tise. But the more I`ve studied it, the more the obstacles I find in the way of doing so. Ver Keynes J.M. , "From D.H.Robertson, 2 May 1931, CWJMK , vol. XIII, p. 211.

[2] Ver D. Robertson, " Mr Keynes`s  Theory of Money"; as referências retiradas de Keynes J.M. , " A Rejoinder", CWJMK , vol. XIII, pp. 219-236.

[3] Ver Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, " A Rejoinder", pp. 235-236.

[4] Ver Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, " A Rejoinder", 219-236.

[5] Alias Keynes sustitue o chamado estado ou grau de `bearish­ness` pela noção de `propensity to hoard´, Ver Keynes J.M. , op. cit. , CWJMK , vol. XIII, p. 221.

[6] Keynes J.M. , CWJMK , vol. VI, p. 132.

[7] R. Kahn, " Kahn Comments", 15 Aug. 1931 in Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, p. 238.

[8] D. Robertson, " Mr Keynes`s Theory of Money", Economical Jour­nal, 1931, 41, p. 407, citado por Peter Clarke, " The Keynesian Revolution in the Making 1924-1936", Claredon Press, Oxford, 1988, p. 236.

[9] As definições estão tomadas da carta de Keynes: "To R. Haw­trey, 28 November 1930", in Keynes J.M., CWJMK , vol. XIII, pp. 139-149, especialmente p. 139.

[10] R.Hawtrey, "Passages from R.G.Hawtrey`s Comments on the Trea­tise"in Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, p. 151.

[11] Idem.

[12] Parece relevante neste momento dizer que uma interpretação do pensamento de Keynes coloca ênfase no argumento de que o princi­pal contributo deste autor está no " systematic analysis of the behaviour of a system that reacts to disturbances through quanti­ty adjustment, rather than through price level or wage rate adjustment", ver A. Leijonhufvud, "On Keynesian Economics and the Economics of Keynes", Oxford University Pres, 1968. De acordo ao análise do equilíbrio parcial os ajustamentos são realizados pelos preços, suposto a existência de um mecanismo de preços de ajusta­mento infinito. Tomando em consideração este contraste, a contribuição de Keynes à teoria económica foi subverter o análise de Marshall, relativamente ao tempo e qualidade do ajustamento, em vez dos preços (salários, juros) os ajustamentos são primeira­mente pelas quantidades ( output, emprego), pelo que a revolução teórica necessária torna-se "understandable only when one realise the full extent to which the Marshallian dynamics was entrenched in the thinking of Keynes`s contemporaries", idem, p. 51.

[13] Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, p. 142.

[14] R.Hawtrey, op. cit. , in CWJMK , vol. XIII, p. 151-52.

[15] R. Hawtrey, op. cit. , p. 152.

[16] Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, p. 145.

[17] Keynes referendo-se na Teoria Geral a esta discussão escreveu: "I had not understood that, in certain conditions, the system could be in equilibrium with less than full employment", Keynes J.M. , CWJMK , vol. VII, p. 242 e seg.

[18] Keynes J.M., " From a letter to R. Hawtrey, 1 June 1932", in CWJMK , vol. XIII, p. 172.

[19] O problema simplesmente é: qual é a relação lógica entre P e P´, ver in Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, p. 237.

[20] Ver Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, " A Rejoinder", pp. 224-225.

[21] Numa carta datada posteriormente as suas conferências na América, Keynes escreve a Kahn: " When resources are fully em­ployed, the supply schedule for goods as a whole is inelastic. Thus any new factor can only have reaction of two kind-to cause changes in the proportionate division of output between consump­tion and investment goods, and to bid up( or down) the remunera­tion of the factors of production".." But if the cost of produc­tion is sticky or if there is already unemployment, there is a third reaction possible, namely changes in total output". Ver Keynes J.M., "To R.F.Kahn, 20 September 1931", CWJMK , vol. XIII, p. 374. Esta carta indicia que para além do ajustamento pelos preços, uma nova possibilidade é de considerar: o ajustamento pelas quantidade, nomeadamente o nível do output e do emprego.

[22] Keynes J.M. , "An Economic Analysis of Unemployment", in  CWJMK , vol. XIII, p. 356.

[23] Idem, p. 369.

[24] Sobre as personagens envolvidas no processo crítico de dis­cussão em Cambridge e as suas características veja-se A. Robin­son, " Keynes and his Cambridge Colleages", e " Keynes as Seen by his Students in the 1930`s", i) Robert B Bryce;ii) Walter Salant;iii) Lorie Tarshis in D. Patinkin and J.Clark Leith(eds), " Keynes, Cambridge and The General Theory", The MacMillan Press Ltd, 1977, pp. 25-38 e 39-63 respectivamente.

[25] J. Meade, citado por D.Moggridge in Keynes J.M. , CWJMK , vol. XIII, p. 339.

[26] O próprio Kahn dedica a sua quarta conferência das `Raffaele Mattioli Lectures` às recordações en torno ao significado da contribuição da teoria do multiplicador. Ver R. Khan, "The Making of Keynes`s General Theory", Cambridge, 1984, pp.91-104. Também, " Correspondence between Richard Khan and D. Patinkin on the 1931 multiplier article and the Cambridge `Circus´", in D. Pakinkin and J. Clark Leith(eds), " Keynes, Cambridge and The General Theory", The MacMillan Press Ltd, 1977, Appendix  II, pp. 146-149.

[27] R.Kahn, " The Relation of Home Investment to Unemployment", citado por D. Moggridge, op. cit. , p. 340.

[28] Idem. Moggridge comenta " Thus Kahn was asserting that Keynes`s Treatise system only held at full employment.

[29] R. Kahn, " The Financing of Public Works: A note", ver in D. Moggridge, op. cit., p. 341.

[30]Isto foi colocado por R. Kahn, " The Financing of Public Works: A note", ver in D. Moggridge, op. cit., p. 341, pé de página 1.

[31] Refiro-me as críticas formuladas na carta de Kahn a Keynes, de 15 de Agosto de 1931, anteriormente referida.

[32] Numa carta de 14 de Abril de 1932 a Joan Robinson, Keynes admite que existe um problema e que viria aborda-los nas suas conferências desse ano. Ver Keynes J.M. , " To Joan Robinson, 14 April 1932, CWJMK , vol. XIII, p. 269. As conferências começaram a 25 de Abril desse ano contendo de certa forma os elementos da sua nova abordagem. Ver T. Rymes,  " Keynes`s Lectures 1932-35: Notes of a Representative Student", MacMillan, 1988, também D. Patin­kin, " Anticipations of the General Theory", Basil Blackweel, Oxford, 1982.

Patinkin Don, "Keynes'Monetary Thought: A study of its Development", Durham, New Caroline, Duke University Press, 1976.

[33] D. Moggridge, op. cit. , p. 341.

[34] I dem.

[35] Keynes J.M. , " To Joan Robinson, 14 Abril 1932", in CWJMK , vol. XIII, p. 268.

[36] E o que expressa D. Moggridge, numa passagem que tem causado al­guma polémica. Patinkin procura demonstrar no seu livro sobre a teoria monetária de Keynes, que isto na realidade não poderia ser assim. O problema é saber o que constitui a principal novidade teórica contida na Teoria Geral, que este autor denomina de `Central Message', ver D. Patinkin , "Keynes'Monetary Thought: A study of its Development", Durham, New Caroline: Duke University Press, 1976, capítulo 8.

[37] O prefácio foi escrito em 5 de Abril de 1932. Ver Keynes J.M. , CWJMK, vol., V, pp. xx e seguintes; a passagem citada em que se refere aos desenvolvimentos teóricos futuros está na p. xxvii.