Este texto forma parte del libro
Ensaios de Economia
de Luis Gonzaga da Sousa
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O SISTEMA SOCIALISTA

 

 

 

Os teoristas utópicos esperavam que depois de superadas as contradições do capitalismo apareceria naturalmente o socialismo, como uma nova fase de um sistema econômico, político e social mais avançado. O processo de evolução da humanidade acontece de forma lenta e gradual, porque isto não acontece por uma imposição de grupo, nem tão pouco, medida provisória presidencial; mas, uma tomada de consciência de todos que labutaram com vistas a conseguir um mundo melhor para todos. Todavia, as fases da evolução não se ultrapassam de forma impositiva; porém, tais como os passos seqüenciais do progresso, como o escravagismo, o feudalismo, o mercantilismo, o capitalismo; e hoje, como já existe o prenúncio de uma vida de cooperação, de mutualidade; e, sobretudo, de socialização da humanidade, isto significa dizer, uma passagem ao socialismo, que é que toda humanidade espera. Daí, pergunta-se o que é um sistema socialista? Como chegar a este sistema? Quais os passos a serem seguidos neste processo? É isto que se tentará explicar neste artigo informacional.

O sistema socialista é mais uma etapa da evolução histórica da humanidade, em termo político, econômico e social. Entrementes, é uma fase em que não seria provocada por golpes militares como aconteceu em muitos países que hoje vivem aparentemente num sistema socialista. Foram as armas que fizeram tais transformações, e nunca um trabalho de consciência de classe, que dentro de uma solução natural, chegasse a um sistema que preparasse para o mundo comunista previsto por Karl MARX (1867) nas suas profecias no processo de evolução do capital. Em verdade, as condições naturais da história, talvez conduzissem a uma demolição gradativa do sistema capitalista; contudo, a euforia de alguns fanáticos fez antecipar a história; e, por conseqüência, as previsões dialéticas não se concretizaram a contento.

Mas, claramente, o que seria um sistema socialista, tão propalado pelos teóricos da economia, da sociologia, e da política? Dentro das previsões marxistas, um sistema socialista seria aquele onde reinasse menos desigualdades entre os seres humanos; os preços dos bens e dos serviços não seriam determinados de acordo com a busca incessante pelos lucros excessivos; todavia, de forma positiva, teriam como referência básica, os custos dos fatores de produção, e apenas existiria uma margem para manutenção do capital e do trabalho indireto, ou improdutivo; os meios de produção não seriam comprados por particulares; porém, o homem seria dono de sua força de trabalho; e o salário do trabalhador seria pago pelo seu valor, quer dizer, pelo emprego de seu trabalho socialmente necessário, conforme MARX (1867).

Diante desta pequena exposição, do que seja um sistema socialista, só resta uma indagação, será que todos os homens pensam no sentido da igualdade social para toda humanidade? Será que esta mesma humanidade perdeu o espírito egoísta, próprio do ser humano, que perdura milênios? É difícil responder a estas questões, tendo em conta que a humanidade ainda não alcançou o estágio do socialismo puro, ou real, cristalizado dentro do princípio de conscientização natural. Como se sabe, o socialismo que existe efetivamente foi provocado; e culminou com a morte de milhares de inocentes que enfrentaram as armas em busca de um mundo melhor, talvez sem saber que mundo seria este. O socialismo puro seria conseguido pela eliminação dos contrários, dentro de um trabalho de conscientização da massa, onde o poder seria montado em bases sólidas e consistentes, sem fisiologismo, nem alienação.

No sistema socialista, acabar-se-ía o poder privado de algum usurpador que conseguiu renda, ou riqueza à custa da exploração do trabalho alheio, desapropriando a liberdade do trabalhador em usar a sua força de trabalho como queira e entenda em sua atividade laboral. Neste sistema, a ganância seria substituída pela solidariedade, justiça e eqüidade social. O poder aqui é do povo, coordenado pelo Estado, que controla todos os recursos da sociedade, na busca de um maior bem-estar para todos indistintamente de cor, de religião e de sexo. Como se vê, este é um sistema utópico que nunca chegaria a tal estágio de vida de uma humanidade embevecida pelo poder, no sacrifício constante do irmão que está mais próximo, e quer sobreviver igualmente como um ser vivo, tal como pregava SAINT-SIMON e seus seguidores (séc. XIX).

No entanto, nas investigações minuciosas de Friedrich ENGELS (1892), diz MILLS (1968)[1] em seus estudos sobre o socialismo que,

a solução das contradições. O proletário toma o poder público e por meio deste poder transforma os meios de produção socializados, arrancando-os das mãos da burguesia, em propriedade pública. Com isto, o proletariado liberta os meios de produção do caráter do capital, até então evidenciado por eles, e dê ao seu caráter social completa liberdade para se afirmar. Uma produção social dentro de um plano pré-determinado, torna-se possível. O desenvolvimento da produção torna um anacronismo a continuação da existência de diferentes classes da sociedade. À medida que desaparece a anarquia na produção social, a autoridade política do Estado também desaparece. O homem, finalmente, senhor de sua própria forma de organização social, torna-se ao mesmo tempo o senhor da natureza, dono de si mesmo e livre.

Esta idéia, tal como foi exposta, apresenta-se encantadora, alvissareira e admiradora para quem é levado pela primeira imagem; porém, a coisa não se processa desta maneira devido a dinâmica de como se está vivendo o dia-a-dia, num relacionamento social complexo e difícil de entender.

Um dos objetivos principais do socialismo é a solução das contradições comuns nos sistemas capitalistas, como a relação patrões e operários; proprietário de sua força de trabalho e não proprietário dessa mesma força de trabalho. Neste tipo de contradição só quem consegue sair ganhando é o patrão por diversos motivos. Primeiro, porque o patrão tem os recursos para pagar a força de trabalho que necessita, e remunera como bem as condições lhe favorecer. Segundo, de posse de tais recursos, o patrão escolhe seus trabalhadores, determinando que tipo de pagamento lhe é mais conveniente fazer, conseguindo o máximo de mais-valia no processo produtivo. E, terceiro, a escolha das atividades capitalistas fica para o interesse privado do proprietário dos recursos e nunca uma atividade social, determinada democraticamente por quem necessita.

Com isto, o operário perde seu poder de decidir sobre qualquer coisa, e não o faz, nem com o seu próprio recurso que é a força de trabalho, que passa a ser subordinada a quem tem dinheiro, ou estrutura de poder. Inegavelmente, o trabalhador de um sistema capitalista, é como se fosse uma extensão do escravismo que se chama atualmente de escravismo branco. Esta é uma contradição que o sistema socialista teria condições de resolver, se não fosse o grande poder dos recursos financeiros sobre toda humanidade, desmobilizando os princípios de conscientização para que a sociedade se transformasse sob armas e sangue. Enquanto isto, os subjugados ao poder econômico ficam impedidos de procurar o melhor sistema, para uma gente que busca a equidade, a paz e a união dos povos.

No sistema socialista, não se tem o paraíso que os cristãos de todas as épocas pregam ao povo; no entanto, viver-se-á em uma sociedade menos injusta e mais humana, onde o ser humano é a peça fundamental na crosta terrestre, e a máquina será apenas um instrumento de auxílio ao desenvolvimento econômico e social. Ao se acabar qualquer tipo de contradição, desaparecerá o Estado protecionista e o poder da máquina. Não haverá preço competitivo. Não existirá contenda pela participação nos parcos recursos do consumidor. Não haverá pagamento diferenciado ao trabalhador que tenha o mesmo nível e capacidade. Finalmente, o homem se libertará do egoísmo e desaparecerá a injustiça de quem quer lucrar mais à custa dos trabalhadores que derramam seu suor para ter o seu bem-estar de maneira saudável e tranqüila.

Com a queda do poderio do capital, provocada pelo nível de conscientização da humanidade, é que o homem poderá chegar à era da liberdade e isto demonstra muito bem o discurso de ENGELS (1892)[2], quando diz de forma objetiva e consciente que

... a própria existência social do homem que, até aqui, era enfrentada como algo imposto pela natureza e pela história é a partir de agora, obra sua. Os poderes objetivos e estranhos que, até aqui, dominavam a história colocam-se sob a influência do próprio homem. Só a partir desse momento, o homem começa a traçar a sua história com plena consciência do que faz; só a partir desse momento, é que as causas sociais postas em movimento pelo homem começam a produzir predominantemente, e cada vez em maior grau, os efeitos desejados. É o salto da humanidade do reino da necessidade para o reino da liberdade.

Tal processo de conscientização é muito difícil de implantar na cabeça do trabalhador que ainda busca o seu bem-estar individualizado, porque as idéias de pequeno burguês ainda estão muito fortes em seu modus vivendi, difícil de um desprendimento consciente para os seus atos socializantes.

O socialismo pressupõe ser uma das últimas fases da evolução histórica da solidificação da sociedade humana. Essa sociedade humana quando começou a se transformar, começou na fase de auto-consumo, de inexistência da moeda, da produção que satisfaça a todos sem brigas e sem discórdias, de uma existência da divisão do trabalho sem exploração, e do acúmulo de excedentes coletivos. A transformação se seguiu e deveria culminar com uma sociedade justa, sem as contradições que ainda estão em uma sociedade capitalista, mesmo que seja menos desigual. Mas, como relata a história, o socialismo seria a fase de transição entre o capitalismo contraditório, espoliador, e o comunismo de SIMON, de FOURRIER, de MARX, e de muitos outros, onde se estaria em uma espécie de paraíso celeste, com povos conscientes e conseqüentes de seus atos laborais e de vida.

A sociedade precisa se libertar do egoísmo que invade o ser humano, que em busca de se locupletar, procura demolir a liberdade daquele que está bem próximo que é o trabalhador do campo, ou da cidade. É importante que a sociedade se conscientize de seu poder político, na transformação de um mundo que só vive brigando por recursos e mais recursos. Os recursos são importantes, apenas no contexto da organização da comunidade que precisa se desenvolver e facilitar as suas condições de vida, nunca armazenar recursos que objetivem a usurpação dos mais fracos e a escravidão da humanidade. O socialismo tem seu objetivo e é de fundamental importância que se conheça seus prós e seus contras; pois, só assim conseguirá a libertação da humanidade, das garras da exploração daqueles que querem dominar o mundo sob o comando do capital privado (poder econômico e social).

Em conclusão, um sistema socialista caminharia de maneira tal que os ganhos e as perdas das atividades econômicas seriam repartidas de igual para igual com todos aqueles que participam da economia como um todo. Os sacrifícios que existissem, todos deveriam arcar, instintivamente, e não apenas a classe inferior, ou dos trabalhadores. Os ganhos não seriam açambarcados pelos donos privados do poder; contudo, distribuídos a todos aqueles que contribuíram para o desenvolvimento do novel sistema econômico vigente. Portanto, o planejamento econômico é a forma de programar a atividade econômica, onde ela possa crescer harmonicamente sem prejuízo de alguém, porque tudo está distribuído de comum acordo com todos e para todos.

 


 

[1] MILL, Wright. Os Marxista. Rio de Janeiro, ZAHAR, 1968, p. 84.

[2] ENGELS, Friedrich. Materialismo e Empiriocriticismo. Lisboa, Progresso, 1982, p. 56.