Este texto forma parte del libro
Ensaios de Economia
de Luis Gonzaga da Sousa
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O SISTEMA CAPITALISTA

 

 

 

Com o princípio evolutivo da sociedade política, social e econômica, tem-se consciência de que diversos outros sistemas foram superados ao longo da história, tais como o escravagismo, o feudalismo, e o mercantilismo. Todos estes sistemas tiveram a sua vigência no passado, porque os seus pressupostos cientificamente foram naturalmente superados ao longo do tempo, devido ao processo de conscientização, e o avanço tecnológico da humanidade da época. Foi nesse transcorrer histórico que surgiu o capitalismo, isto é, sistema que congrega a preponderância do capital (a máquina) sobre o homem; pois, a produtividade global cresceu mais rapidamente do que, quando a máquina era ineficiente, devido aos ganhos de escala no processo de produção. Por ser a máquina, o instrumento fundamental na economia, o homem pode ser substituído e a produção ser implementada por custos bem menores do que, quando o homem era o fator de produção necessário e suficiente na dinâmica da economia, tanto industrial, como agrícola.

Quando se comenta sobre o capitalismo, expressa-se com respeito a um sistema econômico, que vem sendo investigado ao longo dos tempos; diante muitas discussões e muitas polêmicas, especificamente quanto às bases de tal estrutura de organização econômica e social. Daí surgem diversas perguntas que são importantes: será realmente a era do capital? Será a era da exploração do homem pelo homem (homo hominis lupus)? Será a era do poderio da moeda (dinheiro)? Ou será a era dos desequilíbrios econômicos e sociais, no modo de pensar do ser humano? A primeira pergunta é fácil de responder, porque nos primórdios da humanidade, o capital já existia, e segundo Paul SINGER (1975), o capitalismo vem muito depois, quando a máquina sobrepõe o homem, e tem o seu espaço na filosofia desenvolvimentista dos séculos XVIII e XIX, e nas grandes descobertas da idade média.

Quanto a isto, diz SINGER (1975)[1], claramente: que capital é, na verdade, muito mais antigo que o capitalismo na história da humanidade. Já na antiguidade, o capital comercial desempenhava papel importante na economia: o desenvolvimento das trocas mercantis ensejava a inserção de intermediários entre produtores e consumidores. A função do mercador urge como uma especialização a mais num processo de divisão de trabalho que se aprofundava. Até determinado momento, os produtores mesmo, é que, se davam ao trabalho de levar seus produtos ao mercado e a realizar as transações de compra e venda necessárias ao prosseguimento de sua atividade produtiva.

Quanto à pergunta que diz respeito ao termo capital, existem duas maneiras de conceituá-lo e caracteriza-lo. Em primeiro lugar, uma visão neoclássica, que muitos economistas chamam de marginalista por conta de seu método. E, em segundo lugar, é a ótica marxista, que vê o capital de maneira dialética, num contexto social das relações de quem está com o poder e os que são e estão dependentes. Assim, diz SINGER que, para o marginalista, o capital é representado pelo conjunto de recursos materiais, ou mentais que permitem ao homem elevar sua produtividade. O capital está, constituído por: máquinas, implementos de trabalho, acumulação de investimento, a distribuição de energia, formação de poços de petróleo, assim como, de conhecimentos técnicos, patentes, etc,. Portanto, o capital se constitui de coisas inertes, que nada produzem por si só.

Já no contexto marxista, o capital se expressa de maneira diferente e já não tem o mesmo sentido, como propagam os neoclássicos de ontem e de hoje. Nesta visão político-sociológica, o capital é uma relação social, cujos meios de produção são apropriados por alguém que passa a participar do processo de produção sem contribuir diretamente na execução da atividade. Com isto, os proprietários dos meios de produção perdem seu domínio sobre a sua força de trabalho, a título de um mísero salário que aparentemente deveria ser a sua subsistência. Com a formalização do pagamento de um salário, concretiza-se a intromissão do capital no processo produtivo, e o poder de concentração para aqueles que pagam salários, que não acompanham a produtividade do capital, é cada vez maior.

Esse intróito sobre o conceito, e caracterização do capital denota claramente que este termo surgiu muito antes do capitalismo formal; pois, o capitalismo historicamente constituído, é um sistema econômico onde o capital assume definitivamente o poderio as relações de produção. Agora, é necessário lembrar que este sistema de produção, no transcorrer dos séculos, assumiu diversas facetas, a primeira delas, é o capitalismo agrícola, que é o capital (ainda embrionário) no campo; a segunda, é o capitalismo mercantil (comercial), fundamentalmente a era do mercantilismo; a terceira, o capitalismo industrial (capitalismo propriamente dito) do século XVIII, com as grandes revoluções das invenções das máquinas; e, finalmente, é quando se tem o capitalismo financeiro (o ganho pelo movimento do capital financeiro), talvez sem o nível de especulação que exige hoje em dia.

O fato é que, com a maturidade do capitalismo, quer seja no campo, ou na cidade, o poderio econômico buscou sempre bases para perpetuar sua exploração e fazer com que a máquina seja o princípio básico de qualquer desenvolvimento, em detrimento da força do raciocínio e da criatividade do homem assalariado. O capitalismo está pautado em um mercado livre, de uma economia competitiva; todavia, esta competição, com o tempo, torna-se concentradora e centralizadora da produção, culminando com a formação dos cartéis, dos conluios, e, até mesmo, de trustes que buscam e conseguem dominar o mercado, em prejuízo daqueles que não têm condições de competição; mas, quer sobreviver. É o caso dos micros e pequenos industriais que querem participar do mercado de igual para igual com os médios e grandes, que são frutos da formação oligopolista, conseqüentemente se condições de competição tête-à-tête no processo de comercialização da produção.

Todavia, é notório que o capitalismo, não se caracteriza, única e exclusivamente pela exploração do homem pela máquina; mas, do homem pelo homem explorador, pela tecnologia concentradora, e, pela ganância do homem em sobrepor aos outros, na busca incessante aos altos lucros a todo custo. A exploração do homem pela máquina não é um indicador único de um sistema capitalista, porque na era escravagista já acontecia tal crueldade, só acabando com a morte do escravo, e já existia o capital não sobrepondo ao homem. O mesmo aconteceu no período feudalista com a formação dos feudos, conseqüentemente, um escravismo disfarçado. Inegavelmente, eram regimes exploradores; porém, não se estava na fase do capitalismo selvagem e desumano da era industrial e financeira.

O avanço do sistema capitalista fez com que as idéias dos grandes industriais e financistas, que usam os princípios burgueses da exploração, se estruturassem de tal maneira que a sua sobrevivência dependesse, não unicamente da exploração da mão-de-obra; mas, de alguns outros artifícios que lhes assegurassem o poder de explorar e espoliar. Nesta linha de pensamento, este sistema expandiu-se pelos países ricos, pelas colônias, pelas regiões, e, por onde ele pudesse criar dependências, subservientes e, até mesmo, acorrentamentos pelas forças dos trustes internacionais que dominam o mundo. Assim sendo, quem não sabe que a dívida externa aos países do terceiro mundo foi e ainda é provocada pelo poderio internacional? Quem não conhece as formas de concentração em países de alta tecnologia, como corolário grande acervo de capital ultra-moderno? Isto é a dominação do capitalismo em todos os recantos do mundo.

Hoje (século XX), os países do terceiro mundo não podem produzir; não podem se organizar; e, não podem possuir a sua estrutura de dinamização, sem pedir aos participantes do poder internacional, a forma de como se organizar e viver. Esses consentimentos que os burgueses internacionais dão aos seus subordinados só existem, quando os retornos para eles são maiores do que o sacrifício, em conceder aos seus sub-julgados, liberdade de organização, trabalho e dignidade para seus participantes. A verdade, é que o capitalismo continua mais forte do que nunca e extrapolou as expectativas dos princípios marxistas que previam a falência deste sistema e a dominação do socialismo, como bem demonstra Wright MILLS (1963), em seu livro Os Marxistas que faz uma análise pormenorizada das filosofias marxistas e neo-marxistas de todos os tempos.

Assim, foi no sistema capitalista que se começou o uso dos conceitos de desenvolvimento e subdesenvolvimento, ou mais especificamente, países centrais e países periféricos (marxismos), onde os primeiros exercem  funções de patrões, de imperialistas e, os segundos, de colônias, e capitanias. O subdesenvolvimento é produto justamente do poder de exploração daqueles que dominam as modernas tecnologias; o sistema financeiro internacional; e, sobretudo, criam mecanismos que subjugam muito mais aqueles que têm precárias condições de sobrevivência no planeta. A função básica dos países periféricos é fundamentalmente sustentar os países centrais, de matérias-primas e mão-de-obra baratas, para os seus projetos, como explicam os princípios marxistas.

Desta feita, ao considerar os argumentos de Yves LACOSTES (1968), pode-se listar quinze (15) caracteres principais, quanto ao que se entende por subdesenvolvimento, e é um panorama geral de todos os países da América Latina. Em primeiro lugar, aparece a insuficiência alimentar; em segundo, a baixa renda nacional média; em terceiro, baixos níveis de vida; em quarto, industrialização reduzida e tardia; em quinto, fraco consumo de energia mecânica; em sexto, situação de subordinação econômica; em sétimo, setor comercial hipertrofiado; em oitavo, estruturas sociais ultrapassadas; em nono, fraco desenvolvimento das classes médias; em décimo, frágil integração nacional; em décimo primeiro, importância do subemprego; em décimo segundo, deficiente nível de instrução; em décimo terceiro, intensa natalidade; em décimo quarto, estado sanitário imperfeito; e, em décimo quinto, tomada de consciência. Estes pontos caracterizam os países que vivem em pleno subdesenvolvimento econômico e social.

No que se refere ao desenvolvimento, os países com alguns recursos financeiros se aventuraram pelo mundo em busca de aumentar o seu poderio, saqueando e invadindo terras distantes para incrementar o seu parque industrial, ou então o seu nível de riqueza interna através do seu poderio internacional. Isto aconteceu com os grandes descobrimentos; porém, nos tempos modernos, aparece o desenvolvimento concentrador e centralizador, com a formação dos oligopólios e com as sucursais que são abertas em países distantes para aumentar a renda interna das matrizes, ao proporcionar um melhor bem-estar ao povo do país de origem. Com isto, tem-se uma renda percapita dessas nações muito alta; com condições suficientes para dinamização da tecnologia interna; financiar a produção de países distantes; e, subordinar trabalhadores e industriais de regiões que não conseguiram ainda o seu desenvolvimento, que é o resultado do progresso do capitalismo. 

Em resumo, é nesta situação que sobressaem os países de centro, tomando partido da miséria dos países pequenos, das regiões enfermas, das nações fracas, e incentivando a formação de dependência em lugares onde não se conseguiu dominação subordinação ao seu poderio econômico. Isto tem sido a práxis dos países capitalistas, que se aventuram nos países africanos, nos países latinos americanos, e em alguns países da Europa Ocidental, em busca de dominação e usurpação da produção nacional, às custas de quem já não dinamiza mais seu país, devido seus parcos recursos financeiros para exploração de seu torrão natal. Portanto, precisa-se de uma nova ordem internacional, porque se sabe que o capitalismo clássico não serve mais, assim como o socialismo, que já começa mostrar sinais de fraqueza na sua linha de desenvolvimento econômico, político e social.

 


 

 


 

[1] SINGER, P. Curso de Introdução à Economia Política. Rio de Janeiro, FORENSE, 1975, p. 132.