TURyDES
Vol 7, Nº 16 (junio/junho 2014)

PATRIMÓNIO CONSTRUÍDO, TURISMO CULTURAL E A CIDADE HISTÓRICA DO DONDO (ANGOLA)

Bumba de Castro y Paulo Carvalho

1. Património construído vs planeamento turístico

Uma das expressões culturais mais significativas das cidades é, indubitavelmente, a configuração do seu património construído, que representa geralmente uma referência na memória coletiva dos visitantes e contribui bastante para a beleza estética dos locais. O património construído é, a par de outros elementos culturais, uma projeção externa da criatividade humana que transporta ao longo dos anos um acumulado de vivências e experiências, valorizadas no presente.
Nesta perspectiva, “a (re)descoberta dos territórios e dos seus valores patrimoniais são hoje condições basilares na construção de novas identidades e na identificação de alternativas de desenvolvimento (dos territórios e das populações)” (Silva & Carvalho, 2011, p. 259). Esta acepção nos leva a percepcionar que a exposição mediática das localidades no network global tem originado a perda de referências e identidades que urge nestes tempos recuperar, por meio da herança dos antepassados, transformada em património.
Segundo Grammont (2006), até ao século XIX, o património era definido como um conjunto de edificações, objetos e documentos de valor artístico ou histórico. No século XX, a abordagem do património histórico foi adquirindo outras características, o monumento histórico passou a ser analisado levando-se em conta a integração com a sua envolvente, visto como uma relação essencial com a edificação. A ideia de isolar um monumento passou a ser percebida como “mutilação”.
A autora afirma que somente na XXV conferência da Unesco realizada em Paris, em 1989, é que o conceito de património cultural, que evoluíra do conceito de património histórico, abarcou o património imaterial, fazendo menção a uma maior valorização das culturas não dominantes. Desta forma, “entra-se para o século XXI com o património histórico integrado no conceito de património cultural; e este dividido entre o material e o imaterial, engloba o conceito antropológico de cultura enquanto todo fazer humano, desde objetos, conhecimentos, capacidades e valores” (Grammont, 2006, p. 440).
Fazendo uma contextualização para a realidade Angola, “entende-se por património cultural todos os bens materiais e imateriais que pelo seu reconhecido valor devem ser objeto de tutela do direito” (Angola, Lei nº 14/05, de 07 de outubro de 2005). Ainda na mesma lei, encontramos o enquadramento do conceito de património histórico, ao considerar os bens culturais imóveis, como conjuntos traduzidos em agrupamentos arquitetónicos urbanos ou rurais de suficiente coesão, delimitados geograficamente e notáveis, simultaneamente, pela sua unidade ou integração na paisagem e pelo seu interesse histórico, arqueológico, artístico, científico ou social. 
Para Ollagon (1994), citado por Henriques (2003), património é um conjunto de elementos materiais e imateriais que concorrem para salvaguardar a autonomia e identidade do seu titular e a sua adaptação ao longo do tempo num universo variável. Henriques (2003) acrescenta que parte tangível do património inclui todos os activos que têm materialização/corporalização física, os valores culturais tais como as cidades históricas, edifícios, lugares arqueológicos, paisagens culturais e objectos culturais; já o intangível inclui todas as formas de cultura popular e folclore, isto é, ativos coletivos originários numa dada comunidade e baseados na tradição.
Podemos, todavia, depreender que ao abordarmos o património histórico construído, estamos a cingir-nos num ativo cultural, materializado em edifícios ou cidades históricas, que marca o sentido de lugar de um determinado território, representado muitas vezes o elemento central, no qual todo o território ou cidade gravita. De acordo com Franch (2006), as cidades históricas devem considerar o património como um instrumento integral, centro de planificação local, pela sua capacidade de integrar, implicar e entusiasmar a comunidade local na construção do futuro.
Portanto, “o património deve ser salvaguardado, valorizado e divulgado, pois permite uma constante ligação do passado com o presente, possibilita distinguir e afirmar as identidades geográficas e representa a herança de uma sociedade; quer-se com isto dizer, que o património remete para o percurso histórico-cultural, socioeconómico e político” (Silva & Carvalho, 2011, p. 259). Assim, para a salvaguarda e valorização desde ativo cultural é fundamental disciplinar o seu uso e encontrar mecanismos sustentáveis para a sua manutenção. Por outras palavras, significa dizer que, para perpetuar a vida útil do património construído, é necessário planear a sua manutenção e utilização.
Uma das atividades que tem sido utilizada para a conservação e valorização do património construído, e não só, é precisamente o turismo. “O crescente interesse dos turistas pelos valores patrimoniais, históricos e culturais veio contribuir para se dar ênfase às medidas de conservação e salvaguarda do património arquitetónico” (Henriques, 2003, p. 55). Desta forma, um dos objetivos é fazer com que o património histórico passe a ser entendido como um aspecto específico da oferta turística, com potencialidades de captar um dado segmento da procura turística.
No entender de Santos, Cravidão e Cunha (2010) e Oliveira, Pinto e Ferreira (2011), a ligação cada vez maior entre os produtos turísticos disponíveis nos destinos e o respetivo território, converge para uma transformação do espaço, com evidentes preocupações na preservação ambiental e na patrimonialização dos recursos existentes. Os produtos turísticos emergem como oportunidade para revitalizar territórios, melhorar a qualidade de vida das populações e valorizar os seus recursos mais relevantes, como o património natural, cultural e paisagístico (Carvalho, 2012).
Prats (2003) e Cruz (2012) defendem que turismo e património necessitam um do outro. No entanto, para que se estabeleça uma simbiose frutífera entre ambos no plano local, há que ter em conta, além da sistemática exploração do contexto, a necessidade de reunir pontos de vistas e interesses tanto do turismo como do património, para criar ou implementar produtos turístico-patrimoniais integrados, que optimizem os efeitos benéficos para ambos. Segundo Prats (2003), o turismo pode representar para o património receitas, vitalidade e relevância política, mas não deve fazê-lo à custa de um mercantilismo abusivo e mal entendido que produza trivialização da atividade. Por sua vez, o património pode servir para enriquecer a oferta, criar imagem, reorientar o posicionamento, pelo que deve entender a dimensão lúdica do turismo, numa mútua conjugação de esforços e benefícios.
O turismo é um consumidor intensivo de espaço geográfico, ou melhor, do território e, portanto, este facto exige o planeamento do seu desenvolvimento numa óptica que evidencie de forma clara os objetivos sociais e económicos que se pretende alcançar, bem como os espaços que devem ser explorados e os que devem ser protegidos (Marujo e Carvalho, 2010). Por outro lado, se o turismo é considerado um dos mais importantes agentes de mudança em qualquer sociedade, então não pode deixar de evoluir sem um planeamento.
Cruz (2012) e Sánchez, Garrido, Micossi e Marzana (2013) por exemplo, fazem referência da existência de inúmeros exemplos do desenvolvimento turístico ter ignorado ou devastado o património em todas as suas expressões (naturais ou culturais), provocando impactos nefastos e insustentáveis. A falta de planeamento no processo de valorização turística pode acarretar diferentes riscos, tais como: a) o congestionamento dos espaços histórico-artísticos ou dos monumentos; b) a deterioração do património material ou imaterial e a variação injustificada de seu uso; c) a diminuição da qualidade de vida nas cidades; d) a banalização do significado cultural, devido a oferta de produtos culturais que são meros espetáculos (Sánchez et al., 2013).
Para Carvalho (2009), o forte crescimento do número de turistas e a expressão urbanística de lazer e do turismo são argumentos de peso que justificam as preocupações actuais em matéria de sustentabilidade e planeamento da actividade turística. Por esta razão, o autor defende que a transposição dos seus princípios nucleares para o campo do turismo pretende salvaguardar recursos, criar e distribuir benefícios, e envolver as populações locais.
Planear o turismo é uma condição necessária para a organização, a viabilidade e a sustentabilidade da própria atividade, a sua evolução em harmonia com os pilares do desenvolvimento sustentável designadamente as vertentes económica, social, cultural e ambiental (Carvalho, 2009). Por isso, a revalorização turística do património é um processo complexo que implica a participação e o consenso de um conjunto heterogéneo de agentes (gestores, comunidade local, turistas, entre outros), como refere Sánchez et al. (2013).
Definitivamente, a solução para a simbiose património-turismo deve passar pela elaboração de um projeto de incidência especial, como sustenta Carvalho (2009), que unifica diagnósticos, combina e concretiza ações públicas e privadas e estabelece um quadro de mobilização e de cooperação dos atores sociais. Na verdade, trata-se de um plano estratégico, enquanto um instrumento de apoio fundamental para a tomada de decisões e uma proposta de responsabilidade partilhada que coloca grandes desafios para a modernização do território e melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.

2. Turismo cultural de base patrimonial

Hunziker e Krapf (1942), citados por Beni (2007) e Cunha (2013), estabeleceram a premissa de que sem cultura não há turismo. O turismo é, em certo sentido, o instrumento que serve de veículo à reabilitação das culturas, contribuindo em grande medida para a sua difusão mundial. A OMT (2001) considera que o turismo é um instrumento de desenvolvimento pessoal e coletivo para buscar a compreensão e a promoção de novos valores éticos comuns da humanidade, num espírito de tolerância e respeito da diversidade de crenças, prestando atenção às tradições e às práticas sociais e culturais de todos os povos.
Neste contexto, o turismo assume uma dimensão que exige a compatibilização entre os valores materiais e as formas de expressão espirituais e afetivas que contribuem para a valorização do homem e para a criação de uma memória para o futuro. O turismo é um instrumento de promoção cultural, um agente de formação de estilos, formas, atitudes, gostos e experiências a partir dos quais o homem adquire um certo sentido de vida e de sociedade. “Tal como a atividade agrícola deu origem à cultura que se expressa nas tradições, nas relações sociais, na arquitetura, na música ou no pensamento, também o turismo tem de ser concebido como uma forma de o homem expressar sentimentos, ideias ou concepções e adquirir experiências que formam um património para o futuro e dão testemunho de si próprio” (Cunha, 2013, p. 221).
“Se definirmos cultura como património de conhecimentos, de costumes, de princípios, de usos de regras, de experiências e de opções que contribuem para transformar o mundo material e criar novos valores espirituais. E se definirmos o turismo como o conjunto de atividades desenvolvidas pelos visitantes em razão das suas deslocações, as atrações e os meios que originam, as facilidades criadas para satisfazer as suas necessidades e os fenómenos resultantes de umas e outras; então podemos definir o turismo cultural, como o conjunto de meios que permitem aos visitantes conviverem com os modos de vida autênticos de outros povos ou comunidades e de poderem desfrutar de todas as suas heranças e dos seus conhecimentos, seja qual for o modo pelo qual os expressam” (Cunha, 2013, p. 221).
De acordo com Henriques (2003), o turismo cultural começa a ser reconhecido como uma categoria de produto turístico distinta nos finais dos anos 70 do século passado, com o reconhecimento de que algumas pessoas viajavam especificamente com o objectivo de conhecer a cultura ou património de dado destino.
A autora considera que, no sentido amplo, o turismo cultural como toda a viagem que, pela sua natureza, satisfaz a necessidade de diversidade, de ampliação de conhecimento que todo o ser humano traz de si. É uma tipologia de turismo que, “tendo como motivação principal, alargar o horizonte e despertar novos conhecimentos e emoções ao visitante, através da descoberta de um património e de um território, promove e «vende» o acesso a cultura preexistente, transformada em produto” (Oliveira et al., 2011, p. 169). Isto é, combina a actividade com os factores diversos para, mediante um preço, permitir a uma pessoa desfrutar de uma manifestação ou expressão cultural (Cunha, 2013).
Para o MINHOTUR (2013), o desenvolvimento do turismo cultural passa, por conseguinte, pela potenciação da visita dos principais pontos de interesse e pela garantia do conforto do viajante, o que implica dispor de atracções turísticas: a) ligadas aos monumentos, arquitectura, gastronomia, diversidade e riqueza cultural (costumes, tradições, dança, música, pintura, escultura); b) eventos culturais com visibilidade; c) roteiros de touring; facilidade de acesso; e d) serviços complementares (oferta hoteleira, informação, restauração, animação).
Nesta perspetiva, pensamos ser coerente, e de acordo com a visão de Henriques (2003), perspetivar o turismo cultural sob um enfoque triplo: como superação do turista consumista e da necessidade de evasão, como forma de unir os povos e como oportunidade de desenvolvimento económico para as regiões, sendo por isso uma alternativa à trivialidade da viagem.
Em síntese, importa perceber a diversidade de componentes que constituem o turismo cultural, que no essencial, configura diferentes formas de produção turística de vertente cultural. Neste sentido, Cunha (2013) sistematiza num esquema os componentes principais do turismo cultural assentes em três dimensões: património construído, modelos e estilos de vida da população e, finalmente, manifestações culturais associadas à região (figura 1).

3. Desenvolver o turismo cultural na cidade do Dondo

A agenda 2011-2020 para o desenvolvimento do turismo de Angola perspetiva o desenvolvimento de ações para alcançar, num horizonte de 10 anos, uma cifra anual de 4,6 milhões de turistas, mais de 1 milhão de postos de trabalho e uma receita anual de 4.700 milhões de dólares americanos, representando 3,21% do PIB (MINHOTUR, 2013). No ano da elaboração desta agenda, o país recebeu 481.168 turistas, produziu 145.564 postos de trabalho diretos e realizou um volume de negócios de 698.283.738,31 dólares americanos, representando 0,75% do PIB nacional (MINHOTUR, 2012).
Como se pode constatar, os objetivos de crescimento e desenvolvimento da atividade turística em Angola são bastante ambiciosos. Pretende-se que o turismo seja uma das principais atividades do país com o propósito de minorar a dependência na economia mineral, nomeadamente no petróleo, apostando em setores com reconhecido potencial estratégico, que geram capacidades e acrescentem valor à economia nacional. Para a dinamização da atividade, a estratégia assenta no aproveitamento do vasto e riquíssimo património natural, com a definição de produtos turísticos estratégicos de sol e mar e de natureza, mas também na afirmação dos valores e dos ativos histórico-culturais, mediante a aposta no turismo cultural. Nesta perspectiva, o processo desenvolvimento pelo Instituto Nacional do Património Cultural, desde 2009, para a candidatura a património mundial da UNESCO da cidade de M’banza Congo, das pinturas rupestres de Tchitundo-Hulu e do Corredor do Kwanza, fortalece o potencial estratégico do turismo cultural em Angola.
Ao abordarmos o património construído e o turismo cultural de base patrimonial em Angola, a cidade histórica do Dondo apresenta-se como uma referência incontornável, visto ser um dos principais atrativos do Corredor do Kwanza. Antes mesmo que nos debrucemos sobre o local de estudo, importa salientar que o Corredor do Kwanza é um percurso navegável de 258 km do rio Kwanza 1 e áreas adjacentes, que se estende desde a sua foz, a sul de Luanda, até ao Dondo (figura 2). É detentor de um vasto conjunto de riquezas patrimoniais, naturais e culturais, e foi sempre uma área de ativo comércio.

A cidade do Dondo é a sede do município de Cambambe, província do Kwanza-Norte. Reveste-se de grande importância histórica, devido a memória das transações comerciais nas épocas coloniais e pré-coloniais, e possui atualmente cerca de uma centena de locais históricos identificados (figura 3). Dondo e os seus bairros periféricos situam-se aproximadamente a 180 km de Luanda, capital de Angola, possui uma área de 5.212 Km2 e uma população estimada em 60.000 habitantes (segundo dados fornecidos pela Administração Municipal do Dondo). A história da cidade remonta do século XVI. Consta que era uma importante localidade do reino do N’dongo, um dos principais reinos de Angola da era colonial e pré-colonial, formada pela migração de povos negros bantus oriundos do centro de África. O soberano deste reino recebia o título de N’gola (que deu origem à designação atual do país: Angola). Entre os mais referenciados soberanos desse reino destaca-se a Rainha N’jinga Mbande (1582-1663) (Heintze, 2007).
O acervo económico e industrial do Dondo permitiu que em 1973 fosse elevada a categoria de cidade e se convertesse na altura no quarto polo de desenvolvimento industrial do país. Contribuíram particularmente para este feito, a extensão do ramal do caminho-de-ferro de Luanda e a construção da barragem hidroelétrica de Cambambe. A maioria da população vive no meio rural, as atividades mais comuns e que constituem as principais fontes de renda das famílias são a agro-pecuária de subsistência, a caça, a pesca, o comércio e a exploração de carvão vegetal. O feijão, a batata-doce, a banana, os citrinos, as hortícolas, o milho e a mandioca são os principais produtos cultivados, enquanto o pescado local mais apreciado é o “cacusso” e o “bagre” (peixes de água doce do rio Kwanza).
A cidade do Dondo possui uma localização geográfica bastante privilegiada, pois constitui uma importante placa giratória e um ponto de trânsito obrigatório nas ligações rodoviárias entre Luanda e as províncias do centro e sul do país, assim como às províncias do leste. A cidade possui um potencial turístico assinalável, perfeitamente enquadráveis nos produtos estratégicos definidos pela agenda 2011-2020 referida anteriormente.
Além do património natural, expresso no majestoso rio Kwanza e na sua envolvente de montanhas, fauna e flora, o centro da cidade é preenchido por um património construído com estruturas do século XVIII e XIX. Na sua circunscrição, num raio aproximado de 20 km, pontificam monumentos e sítios históricos de interesse, tais como a fortaleza de Massangano, a sepultura do Capitão Paulo Dias de Novais2 , o mercado municipal, as ruínas de Cambambe, entre outros. Para além dos pontos turísticos apresentados, Dondo possui áreas turísticas já identificadas na circunscrição, entre praias fluviais, áreas históricas e florestais que se mantêm inexploradas.
No que concerne à hotelaria, é de registar apenas a existência de pequenos estabelecimentos, pensões e hospedarias, com capacidade de alojamento limitada, assim como restauração precária e em muitos casos, informal. Grande parte do parque hoteleiro, onde se destacavam 3 hotéis, está inoperante e sem possibilidade de recuperação (figura 4).

Um dos acontecimentos mais significativos na cidade é a feira anual de artesanato, um evento comercial histórico que foi reatado em 2010. No evento, normalmente de 3 dias, são expostas e vendidas obras manufacturadas por artesãos, oleiros, cesteiros, escultores, agricultores, pescadores, caçadores, etc., transformando a feira numa verdadeira bolsa de negócios com expositores e visitantes provenientes de todos os pontos do país. Regatas de canoa, concurso de natação, espetáculos músico-culturais, palestras, excursões turísticas, encenações de trocas comerciais, peças teatrais são dos muitos atrativos do evento.
Pela sua importância geográfica, a cidade do Dondo regista um movimento assinalável de visitantes ao longo do dia e, inclusive no período nocturno. A marginal do rio Kwanza personifica a actividade turística da cidade, grande parte da atividade turística e de lazer é desenvolvida nesta área, sendo um ponto de paragem obrigatório para qualquer viajante, quer seja para um retrato ou para filmagem da maravilhosa paisagem combinada do rio com o verde e as montanhas. Destacam-se nesta área as atividades como os banhos diários dos residentes e a concentração de barracas para proporcionar ao visitante um cacusso grelhado, acabado de pescar, e a cerveja da região.
Com essa breve caracterização da cidade do Dondo e áreas circunvizinhas, percebe-se o potencial turístico expresso no seu património natural, susceptível de originar produtos turísticos de desporto, recreio, saúde, aventura e wellness. O trajeto fluvial em barco entre o Dondo e Massangano é feito em menos de 20 minutos, e pode ser visto como ensaio para um produto turístico assente em circuitos fluviais e exploração de lugares inóspitos, com projeção de caminhadas em grutas e locais de refúgio dos nativos à perseguição colonial da época.
O legado histórico e patrimonial da cidade deve ser aproveitado para a criação de produtos turísticos ligados a cultura, touring cultural, rotas ou circuitos de diferente duração e extensão. Deve favorecer o resgate duma parte da memória nacional, da consciencialização da sua riqueza cultural e da valorização de um património imaterial pouco acessível a muitos angolanos.
No essencial, desenvolver o turismo cultural na cidade do Dondo, significa reforçar a patrimonialização do seu acervo histórico-cultural, disponibilizar de forma responsável a sua utilização para melhor garantir a sua conservação. Por conseguinte, para o alcance deste desiderato, é fundamental transpor para o campo do turismo os princípios nucleares de sustentabilidade e planeamento da atividade, com o objetivo de salvaguardar recursos, criar e distribuir benefícios, e envolver as populações locais (Carvalho, 2009). Significa planear e valorizar o património histórico construído por meio do turismo.

4. Conclusão

O património histórico construído tem funcionado como instrumento impulsionador para a valorização turística de muitas cidades históricas numa simbiose com o turismo, em que a intenção é a busca de vantagens comuns. No entanto, compreende-se que, se não forem acautelados mecanismos sustentáveis para a utilização dos recursos patrimoniais, as probabilidades de mercantilização desmesurada e de trivialização dos produtos culturais são elevadas, com danos muitas vezes irreparáveis no património. Afigura-se, pois, fundamental que a sua valorização seja projetada na base de um planeamento turístico que tenha em atenção os diferentes agentes no local e salvaguarde as mais-valias económicas, sociais e culturais.
Por outro lado, importa referir que o visitante atual possui um maior nível cultural e uma maior consciência acerca da importância do património natural e cultural que, associado a experiências turísticas mais vastas e diversificadas, conduz a procurar serviços personalizados e com melhor qualidade.
No caso da cidade histórica do Dondo, o turismo cultural de base patrimonial possui um potencial de desenvolvimento enorme, não apenas pelo seu património cultural, assumindo-se como um elemento fundamental para a candidatura a património mundial da UNESCO que se pretende apresentar de toda uma envolvente, mas também devido ao seu património natural e a sua localização geoestratégica, de viabilização da circulação de pessoas e bens pelo interior do país.

Bibliografia

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Beni, M. (2007). Análise estrutural do turismo (12ª edição). São Paulo: Senac.
Carvalho, P. (2009). Planeamento, turismo e património em territórios de baixa densidade. Biblos, vol. VII (2ª série), 485-506.
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Cunha, L. (2013). Economia e política do turismo (3ª edição). Lisboa: Lidel.
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Ministério da Hotelaria e Turismo (MINHOTUR) (2012). Boletim estatístico do mercado hoteleiro e turístico de Angola do ano 2011. Luanda: Edições de Angola.
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Recibido: 20/04/2014
Aceptado: 10/05/2014
Publicado: Junio de 2014

1 É o maior rio de Angola, nasce e desagua no território angolano, com uma extensão de 960 km. Dá o seu nome à moeda nacional.

2 Primeiro Governador da província ultramarina de Angola do regime colonial português.



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