TURyDES
Vol 4, Nº 10 (julio/julho 2011)

INTERNACIONALIZAÇÃO E GESTÃO AMBIENTAL: UM ESTUDO NOS MEIOS DE HOSPEDAGEM VINCULADOS À ASSOCIAÇÃO ROTEIROS DE CHARME EM SANTA CATARINA, BRASIL

Luisa Coelho Cardoso, Graziela Dias Alperstedt, Jane Iara Pereira da Costa y Tiago Savi Mondo (CV)

 

1 INTRODUÇÃO

O turismo, assim como os demais setores da economia moderna, depende da apropriação e exploração da natureza demandando uma transformação radical dos ecossistemas e um grande consumo de recursos naturais (LEMOS, 1999).

As atividades de turismo podem provocar rupturas da biodiversidade, pois envolvem desde práticas com danos mais persistentes, como a caça e a pesca, até danos menos óbvios, como a observação da vida selvagem e as caminhadas por colinas. O fato é que a presença de turistas gera mudanças ambientais inevitáveis e muitas vezes irreversíveis. Estas mudanças são mais evidentes nas áreas esparsamente ocupadas e não sujeitas à visitação freqüente. Quanto mais frágil e único for um ambiente, mais vulnerável ele será a mudanças ocasionadas pela presença humana (COOPER et al., 2007).

A rede hoteleira no Brasil parece estar aderindo, de forma crescente, as práticas de gestão ambiental. Isto acontece não apenas em razão da elevação dos impactos ambientais ocasionados pelo turismo, mas em função de sua dependência da natureza como forma de sobrevivência.

O paradoxo criado pela simultânea degradação e dependência do meio ambiente pelo turismo torna claro o desafio do turismo sustentável, definido pela Organização Mundial do Turismo (OMT) como a gestão de todos os recursos de forma que as necessidades econômicas, sociais e estéticas possam ser satisfeitas mantendo-se a integridade cultural, os processos ecológicos essenciais, a diversidade biológica e os sistemas de apoio à vida (COOPER et al., 2007). O turismo sustentável visa garantir o bem-estar econômico, ambiental, sociocultural e político de longo prazo de todos os interessados.

As práticas organizacionais de gestão ambiental, de forma geral, são motivadas por diversos fatores, que englobam desde aspectos externos à organização, como a localização geográfica ou o setor onde atua, até aspectos internos, como o tamanho da organização ou seu nível de internacionalização (BENITO; BENITO, 2006).

A internacionalização promove um intercâmbio entre diferentes culturas, já que as empresas passam a vender seus produtos e serviços para clientes estrangeiros. Segundo Christmann e Taylor (2001), estas diferenças culturais estão relacionadas também às diferenças de comportamento ambiental. Isto pode levar as organizações, em razão da necessidade de atender às exigências dos clientes, a melhores práticas de gestão ambiental.

Com o fluxo de clientes internacionais, os meios de hospedagem passam a estabelecer contato direto com pessoas de diferentes culturas, que podem apresentar hábitos e exigências diferenciados em relação ao meio ambiente. Assim, tendo em vista a necessidade de atender as demandas dos consumidores como forma de alcançar a competitividade, pressupõe-se que a internacionalização destes empreendimentos é capaz de afetar suas práticas de gestão ambiental.

No Estado de Santa Catarina de 2004 a 2008, o fluxo de turistas aumentou 26,68%, segundo dados do Ministério do Turismo (2010). Apesar de não ser um dos estados que receberá diretamente os turistas que virão para a copa do mundo de 2014 e as olimpíadas de 2016, Santa Catarina passou da oitava para a sexta posição de maior receptor de turistas do Brasil e, com certeza, indiretamente receberá turistas que virão para esses dois eventos.

Contando com cinco meios de hospedagem em Santa Catarina, a Associação Roteiros de Charme foi fundada com a proposta de criar uma hotelaria de qualidade com responsabilidade sócio-ambiental, sempre de forma economicamente viável e sustentável (ROTEIROS DE CHARME, 2010). Por isso, e pelo apelo de marketing que possui, foi escolhida para esta pesquisa cujo objetivo é analisar a influência da internacionalização nas estratégias de gestão ambiental de seus meios de hospedagem em Santa Catarina.

A idéia deste estudo surgiu a partir dos indícios existentes de que a internacionalização poderia gerar práticas ambientais mais pró-ativas e se justifica em razão tanto do pequeno número de estudos existentes, quanto da importância deste assunto para as organizações.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Turismo Sustentável

O turismo, como qualquer outra atividade humana, exerce impactos sobre o meio ambiente, já que consome combustíveis, eletricidade, alimentos e outros recursos da água e da terra, gerando lixo e emitindo poluentes (PIRES, 2010). Além disso, o turismo em massa sobrecarrega a carga de infra-estrutura de saneamento básico (RIBEIRO; STIGLIANO, 2010), atinge a vida selvagem por meio da aproximação e agitação excessivas e da alimentação induzida e danifica áreas naturais, uma vez que são frequentemente expostas, por exemplo, a grandes volumes de atividades náuticas ou usos descontrolados de trilhas (PIRES, 2010).

Lemos (1999) comenta que a grande quantidade de turistas e veranistas que surgem nas temporadas altera ou destrói as culturas locais, eliminando com elas a possibilidade de realização de qualquer atividade integrada ao meio natural específico da região visitada. Esta desconsideração dos elementos culturais locais no planejamento e desenvolvimento de atividades turísticas está profundamente relacionada à degradação ambiental.

A partir deste contexto e tendo como base a evolução do turismo, Ruschmann (1997) constata que, a partir dos anos 70, a qualidade do meio ambiente começa a constituir elemento de destaque do produto turístico. A deterioração da qualidade de vida nas grandes cidades faz com que um número cada vez maior de pessoas procure justamente as regiões com belezas naturais mais abundantes e climas mais agradáveis, ou seja, áreas mais frágeis ecologicamente (PIRES, 2010). Esta situação faz com que o turismo apresente uma situação contraditória em relação ao meio ambiente, tendo em vista o amplo dano provocado e a necessidade de controle sobre estes impactos como forma de sobrevivência, já que a natureza é considerada sua principal fonte de recursos (RIBEIRO; STIGLIANO, 2010). Dentro deste contexto, surge a expressão "turismo sustentável".

Lu e Nepal (2009) revisaram o conteúdo de 341 artigos dos primeiros 15 volumes da revista Journal of Sustainable Tourism com o objetivo de analisar a evolução do termo "turismo sustentável". Para os autores, este conceito se aperfeiçoou no decorrer do tempo. Nos artigos mais antigos, o turismo sustentável referia-se apenas à perturbações mínimas em ambientes intactos e nos mais recentes passa a abordar uma grande variedade de ambientes naturais e construídos. Sendo assim, o Turismo Sustentável atinge a sua forma atual e passa a ser definido pela OMT (IRVING et al., 2005, p. 3) como “aquele ecologicamente suportável em longo prazo, economicamente viável, assim como ética e socialmente eqüitativo para as comunidades locais”.

Ruschmann (1997) destaca como aspecto principal para que o turismo sustentável possa acontecer, a criação de uma cultura turística. Esta ação objetiva a mudança de comportamento dos visitantes, já que usualmente estes agem de forma alienada em relação ao meio que visitam. Apesar das declarações de atitudes positivas no que diz respeito ao meio ambiente, poucos turistas escolhem de fato produtos ecologicamente corretos, meios de transporte limpos ou fazem uso de comportamentos responsáveis em relação às comunidades de destino (BUDEANU, 2007), o que pode ser visto como uma barreira ao turismo sustentável.

Ribeiro e Stigliano (2010) concordam com as opiniões anteriormente, porém, entendem que é necessário pensar no turismo em seus dois lados: a produção e o consumo. Para os autores, não são apenas os turistas os responsáveis pelos problemas de ordem ambiental das localidades, mas também, e em grande medida, aqueles que produzem a infra-estrutura, os equipamentos e os serviços para os turistas.

Dief e Font (2010) realizaram um estudo com 194 meios de hospedagem no Egito cujos resultados mostraram que a pró-atividade das estratégias ambientais é maior nos meios de hospedagem pertencentes a cadeias internacionais. Uma razão consiste nas exigências dos consumidores estrangeiros, em especial daqueles provenientes de países desenvolvidos, já que a preocupação ambiental varia conforme a nacionalidade dos consumidores. Os autores destacam que os empreendimentos internacionalizados são mais propensos a adotar estratégias ambientais pró-ativas para manter a sua legitimidade e credibilidade aos olhos dos seus stakeholders.

Estas afirmações vão ao encontro dos resultados das pesquisas de Christmann e Taylor (2001), Shamdasani et al. (1993) e Montgomery e Stone (2009) mencionadas anteriormente, que mostram um impacto positivo da internacionalização na adoção de práticas ambientais pró-ativas no que diz respeito à pressão dos consumidores estrangeiros, tendo em vista que o comportamento dos consumidores ecologicamente corretos é guiado pelos seus valores e personalidade, provenientes das culturas de seus países de origem.

A adoção de práticas ambientais nos meios de hospedagem pode ser realizada por meio da utilização de normas que estabeleçam os requisitos mínimos para este fim. Sendo assim, a promoção do turismo sustentável pode partir da implementação de um Sistema de Gestão Ambiental ligado a um mecanismo de certificação amplamente aceito e adequado para este ramo de atividade.

Com esse intuito, a NBR 15401 foi criada para o setor turístico em novembro de 2006 com o objetivo de estabelecer requisitos para meios de hospedagem que possibilitem o planejamento e operação de suas atividades de acordo com os princípios do turismo sustentável. A Norma aplica-se a todos os tipos e portes de organizações e adéqua-se a diferentes condições geográficas, culturais e sociais, com atenção particular à realidade e à aplicabilidade nas pequenas e médias empresas. Nela são estabelecidos requisitos objetivos que podem ser utilizados tanto para fins de certificação como para auto-avaliações dos estabelecimentos.

A Norma leva em conta os requisitos legais e contém informações referentes aos impactos ambientais, socioculturais e econômicos significativos, aplicando-se aos aspectos que podem ser controlados pelo estabelecimento ou sobre os quais ele possa exercer influência. Os princípios do Turismo Sustentável nos quais a NBR 15401 se baseia são os seguintes: (i) Respeito à legislação vigente; (ii) Garantia dos direitos das populações locais (iii) Conservação do ambiente natural e sua biodiversidade; (iv) Consideração do patrimônio cultural e de valores locais; (v) Estímulo ao desenvolvimento social e econômico dos destinos turísticos; (vi) Garantia de qualidade dos produtos, processos e atitudes; (vii) Estabelecimento de planejamento e gestão responsáveis.

Como requisitos ambientais são estabelecidas práticas quanto aos seguintes aspectos: (i) Preparação e treinamento a emergências ambientais; (ii) Áreas naturais, flora e fauna; (iii) Arquitetura e impactos da construção no local; (iv) Paisagismo; (v) Emissões, efluentes e resíduos sólidos; (vi) Efluentes líquidos; (vi) Eficiência energética; (vii) Conservação e gestão do uso da água; (viii) Seleção e uso se insumos.

2.2 A Internacionalização de Serviços e a Gestão Ambiental

O interesse na internacionalização dos serviços é recente. Isto ocorre em razão do aumento de sua proporção no comércio mundial e do reconhecimento pelos estudiosos de sua importância como força de dinamização da economia global (CLARK et al., 1996). Segundo dados da United Nations Conference on Trade and Development, UNCTAD (2009), a movimentação financeira gerada pelas exportações de serviços no Brasil aumentou cerca de 250% entre os anos de 2002 e 2007.

Os serviços possuem algumas características que os diferem dos bens, tais como a intangibilidade, uma vez que não podem ser vistos, sentidos, ouvidos, cheirados ou provados, a inseparabilidade, visto que a produção e o consumo são simultâneos, a variabilidade, pois um serviço nunca poderá ser repetido de modo exatamente igual e a perecibilidade, já que não podem ser estocados (CARNEIRO et al., 2008).

São estas características que fazem com que a internacionalização dos serviços seja diferente da internacionalização de bens. O General Agreement on Trade in Services (GATS), elaborado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), classifica os modos de oferta dos serviços em quatro tipos, propostos em razão da localização dos consumidores e prestadores do serviço (WTO, 2009): (i) Modo 1 (O Comércio Além-Fronteiras) – o serviço é prestado em um território e consumido em outro; (ii) Modo 2 (Consumo no Exterior) – o serviço é prestado e consumido no território do prestador do serviço, exigindo a movimentação do consumidor; (iii) Modo 3 (Presença Comercial) – o serviço é prestado e consumido no território do consumidor, exigindo a mobilidade do prestador do serviço; (iv) Modo 4 (Presença de Pessoas Naturais) – o serviço é prestado por meio da movimentação de pessoas físicas ao território do consumidor.

Esta classificação refuta a teoria da não-comercialização dos serviços, já que considera quatro diferentes formas em que podem ser comercializados. A teoria da network proposta pela Escola Nórdica pode ser aplicada para o mercado de serviços, já que a internacionalização de algumas destas formas de comercialização pode não ser facilmente mensurada, uma vez que não exigem a migração das atividades produtivas para o país estrangeiro, como ocorre no Modo 2. Neste caso, o grau de internacionalização pode ser medido através do grau de internacionalização da network na qual a empresa está inserida, seguindo a linha de raciocínio de Björkman e Forsgren (2000).

A aplicabilidade dos pressupostos do modelo de Uppsala nas empresas prestadoras de serviços também pode ser questionada. Para Carneiro et al. (2008) esta análise pode ser feita a partir da classificação deste mercado em subcategorias, já que os prestadores de serviços não pertencem a uma classe homogênea.

Dentre as diversas classificações possíveis para a internacionalização de serviços, pode-se citar as contribuições de Clark et al. (1996), que a diferencia a partir da forma pela qual os serviços cruzam as fronteiras nacionais, conforme segue: (i) Serviços baseados no contato – pessoas (produtores ou consumidores) se movimentam para dentro ou para fora de determinado país para realizar as operações (por exemplo, serviços de consultoria e de turismo); (ii) Serviços baseados em veículos facilitadores – o serviço é prestado por meio de veículos, tais como cabos, satélites ou antenas. A fronteira nacional é cruzada por sinais eletromagnéticos; (iii) Serviços baseados em ativos – ativos físicos cruzam a fronteira para que o serviço seja prestado. A implantação de uma plataforma operacional no país de destino é necessária (por exemplo, hospitais e bancos); (iv) Serviços baseados em objetos – objetos portadores dos serviços cruzam a fronteira (por exemplo, DVDs com filmes e softwares gravados em mídia eletrônica).

Carneiro et al. (2008) analisam a aplicabilidade do modelo de Uppsala para cada um destes tipos de serviços e afirmam que alguns destes possuem certas características que se opõem a uma trajetória de compromisso gradualmente crescente de recursos ou tornam a distância psíquica um aspecto menos relevante, violando dois conceitos básicos do modelo de Uppsala.

Os serviços baseados no contato pessoal não podem comprometer recursos de forma gradual, já que precisam ser oferecidos de forma integral, desde o início, devido à simultaneidade de produção, distribuição e consumo e são de difícil padronização, podendo exigir mais controle e participação (e, portanto, um compromisso maior de recursos). Existem diferenças entre os serviços também no que tange à distância psíquica. Os serviços serão mais imunes às diferenças culturais quanto menor for o contato pessoal existente. Segundo Clark et al. (1996), enquanto os serviços baseados no contato requerem interação direta entre as culturas durante a transação, os serviços baseados em objetos usualmente não. Sendo assim, o modelo de Uppsala pode não afetar universalmente e homogeneamente todos os tipos de serviços (CARNEIRO et al., 2008).

Clark et al. (1996) afirmam, no entanto, que o mercado internacional de serviços é particularmente mais sensível às variações culturais do que o mercado de bens de consumo. Isto ocorre em razão da interação direta que acontece na simultaneidade da produção de do consumo. Os autores classificam os serviços baseados no contato como os mais puros da categoria, em virtude de contarem com todas as clássicas características dos serviços – intangibilidade, heterogeneidade, perecibilidade, inseparabilidade. Desta forma, a teoria da distância psíquica proposta pelo modelo de Uppsala não apenas pode ser aplicada ao mercado de serviços, como parece ser adequada para analisá-lo.

As diferenças culturais existentes entre os países interferem diretamente na distância psíquica existente entre eles. Para Cavusgil et al. (2010, p. 100), "a cultura refere-se aos padrões de orientação aprendidos, compartilhados e duradouros em uma sociedade". Segundo os autores, mais do que qualquer outra característica, a cultura é capaz de sinalizar diferenças entre as sociedades com base em idioma, hábitos, costumes e modos de pensar. As pessoas podem demonstrá-la através de idéias, atitudes, valores, comportamentos e símbolos. Benito e Benito (2006) afirmam que a internacionalização é capaz de influenciar positivamente a gestão ambiental empresarial porque através dela acontece uma maior troca de conhecimentos entre países, facilitando a adoção de novas práticas e a imitação de organizações mais avançadas. Além disso, os autores constatam que as empresas tendem a aumentar sua pró-atividade ambiental em função dos rigorosos requisitos vigentes nos respectivos países onde atuam.

Christmann e Taylor (2001) entrevistaram 101 empresas de diferentes países com o objetivo de analisar a relação existente entre a internacionalização e a adoção uma postura pró-ativa no que diz respeito às práticas ambientais utilizadas. Os resultados mostraram que a internacionalização afeta positivamente o atendimento às regulamentações e a adoção de práticas mais pró-ativas. Além disso, as empresas estabelecidas em países em desenvolvimento que vendem seus produtos para consumidores estrangeiros e para países desenvolvidos mostraram adotar ações mais favoráveis à pró-atividade ambiental do que as demais.

Segundo os autores, esta atitude deriva das altas pressões dos stakeholders, inclusive de consumidores estrangeiros, às quais as organizações com atuação internacional estão sujeitas. As vantagens do uso de estratégias voluntárias residem no aumento da auto-regulação empresarial gerado por esta prática, que ultrapassa muitas vezes as regulamentações nacionais, fazendo com que as empresas deixem de sofrer com as diferenças de pressões ambientais entre países. A melhor adequação aos regulamentos internos percebida nas organizações estudadas acontece porque, com outros requisitos mais relevantes, as regulamentações governamentais nacionais se tornam um determinante de conduta ambiental menos importante.

A pressão dos consumidores estrangeiros é citada pelos autores porque o comportamento das pessoas em relação ao meio ambiente pode variar entre os países. Para Plumwood (2002), a preocupação com o meio ambiente é uma questão cultural que deve ser trabalhada para que se possa melhorar as práticas ambientais e gerar resultados positivos para o planeta. Shamdasani et al. (1993) conduziram uma pesquisa com 207 consumidores de Cingapura e concluíram que o comportamento dos consumidores ecologicamente corretos é guiado pelos seus valores e personalidade. Os autores comentam que campanhas governamentais podem gerar atitudes, mas não são capazes de mudar comportamentos, já que estes derivam dos ideais culturais de cada consumidor.

A relação entre a cultura e o comportamento ambiental fica evidenciada também na pesquisa realizada por Montgomery e Stone (2009). Com o objetivo de investigar a ligação existente entre a sensibilidade ambiental e a origem cultural, os autores entrevistam 459 consumidores de 5 diferentes países – Azerbaijão, Itália, Espanha, Estados Unidos e Venezuela. Os resultados mostraram diferenças significativas entre o comportamento ambiental dos consumidores de diferentes culturas.

Contrariando as hipóteses levantadas pelos autores, os consumidores provenientes de países menos desenvolvidos economicamente, como é o caso da Venezuela e do Azerbaijão, apresentaram preocupações ambientais individuais mais elevadas, enquanto os oriundos de países mais desenvolvidos, como Estados Unidos e Itália, se mostraram menos preocupados com o meio ambiente.

Tendo em vista os resultados das pesquisas mencionadas, é possível afirmar que o comportamento ambiental dos consumidores pode variar entre diferentes países. Como a satisfação dos clientes faz parte dos objetivos das empresas, esta variação faz com que a internacionalização, uma vez atrelada à venda de produtos e serviços para o público estrangeiro, possa afetar as práticas ambientais organizacionais. Esta relação é possível também no mercado de serviços, principalmente no que diz respeito à pressão dos consumidores estrangeiros, haja vista a origem cultural na qual se fundamenta este argumento.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para alcançar o objetivo deste trabalho buscou-se compreender o estudo sob a perspectiva dos proprietários dos meios de hospedagem. Tendo em vista a complexidade envolvida neste processo, optou-se pela utilização da pesquisa qualitativa.

A pesquisa qualitativa é realizada com base em métodos múltiplos, interativos e humanísticos que envolvem a participação ativa dos entrevistados. Este tipo de estudo possui um caráter emergente, já que vários aspectos podem surgir durante a pesquisa, e é fundamentalmente interpretativo, cabendo ao pesquisador tirar conclusões sobre seu significado (CRESWELL, 2007).

O estudo qualitativo foi escolhido por garantir a riqueza dos dados, permitindo a visão dos fenômenos em estudo na sua totalidade e facilitando a exploração de contradições e paradoxos. Seus defensores argumentam que a realidade é socialmente construída, não podendo, portanto, ser apreendida e expressa por meio de estudos do tipo levantamento ou experimentos (VIEIRA; ZOUAIN, 2006). Este tipo de pesquisa é indicada para estudos que requerem uma maior profundidade de aspectos relacionados a um menor número de casos, como é o caso deste.

O modo de investigação utilizado foi o estudo de caso, que Yin (2001) define como uma investigação empírica de um fenômeno dentro de seu contexto de vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos. Nesta pesquisa, mais especificamente, optou-se pelo estudo de casos múltiplos, o que permitiu a obtenção de informações mais completas a respeito do objeto de estudo. Ainda segundo Yin (2001) os estudos que compreendem mais de um caso são menos vulneráveis e suas conclusões analíticas mais contundentes.

Tendo em vista os objetivos do estudo, o universo desta pesquisa compreende os estabelecimentos pertencentes à Associação Roteiros de Charme localizados no estado de Santa Catarina. Atendem a este requisito cinco meios de hospedagem e optou-se pela realização de um censo.

Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas com proprietários dos meios de hospedagem da Associação Roteiros de Charme localizados em Santa Catarina e com o auxilio de um roteiro elaborado com base na NBR 15401.

As entrevistas foram agendadas e realizadas entre os meses de agosto e setembro de 2010. Os agendamentos foram feitos via telefone e e-mail com os cinco proprietários de meios de hospedagem localizados em Santa Catarina e pertencentes à Associação Roteiros de Charme. Em função da impossibilidade de acesso aos dados em um dos estabelecimentos, somente foram realizadas quatro entrevistas que tiveram em média 50 minutos cada. Todas as entrevistas foram gravadas. No meio de hospedagem 1 foi realizada também uma conversa informal não gravada com o supervisor de operações, do qual foi possível obter informações pertinentes para este estudo.

Para preservar a identidade dos meios de hospedagem e dos entrevistados, os mesmos foram nomeados nesta pesquisa como Entrevistado 1, Entrevistado 2, Entrevistado 3 e Entrevistado 4. De forma a facilitar a leitura, variações como Meio de Hospedagem 1 ou Proprietário 1 também foram utilizadas. Outro meio utilizado para preservar a identidade dos proprietários consistiu na igualdade de gêneros, sendo todos referenciados no masculino.

Como orientação para o processo de análise dos dados coletados foi utilizada a análise de conteúdo proposta por Bardin (2004). Este método é aplicado para revelar o conteúdo das mensagens permitindo a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens. Na abordagem qualitativa, como é o caso deste estudo, esta técnica busca identificar a presença ou ausência de determinadas características nas mensagens, procurando não apenas a descrição, mas interpretações mais profundas baseadas na inferência. As estratégias de gestão ambiental dos meios de hospedagem objetos desta pesquisa foram analisadas em dois aspectos. O primeiro diz respeito à variável ambiental, que trata das principais práticas ambientais utilizadas pelos empreendimentos. O segundo corresponde à variável empresarial, a partir da qual é analisada a percepção dos entrevistados frente ao desafio ambiental.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

4.1 A Associação Roteiros de Charme

Formada por empresários do setor hoteleiro, a Associação Roteiros de Charme foi fundada em 1992 com a proposta de criar uma hotelaria de qualidade com responsabilidade sócio-ambiental, sempre de forma economicamente viável e sustentável (ROTEIROS DE CHARME, 2010). A Associação congrega 51 meios de hospedagem, entre hotéis, pousadas e Refúgios Ecológicos situados em todas as regiões do Brasil.

Na Associação Roteiros de Charme é possível encontrar desde pequenas pousadas cujo atendimento é despretensioso e singelo até hotéis muito confortáveis, com estilo, requinte e serviço esmerado. Uma característica particular da Associação consiste na forma como estes diferentes meios de hospedagem são classificados. Cada estabelecimento possui uma categorização segundo cinco pedras preciosas do solo brasileiro. Elas identificam os diversos tipos de hospedagem oferecidos. A Esmeralda caracteriza-se por um hotel ou pousada com uma localização privilegiada, espaços generosos, instalações e serviços que atendam aos padrões de exigência da tradicional hotelaria internacional. O Topázio Imperial pode ser um hotel ou pousada bem equipado, com instalações e espaços sociais adequados, serviços esmerados, estilo e decoração requintada. A Água Marinha descreve hotéis ou pousadas bem equipados, com instalações e espaços sociais adequados, serviços esmerados, estilo e decoração requintada. Ametista diz respeito a uma pousada ou refúgio num paraíso ecológico, onde o serviço despretensioso e a decoração guardam identidade com a região. Por fim, Cristal identifica todos os hotéis, pousadas e refúgios ecológicos durante o ano de seu ingresso na Associação.

Assim, o ingresso na Associação Roteiros de Charme ocorre por meio do atendimento a alguns critérios. O primeiro deles é o charme, conceituado pela Associação como uma união entre bom gosto, atenção com detalhes, paixão em servir, conforto, localização privilegiada, construção adequada ao meio ambiente e à região, entre outros. O conjunto destes fatores deve conferir personalidade única ao local e ao próprio meio de hospedagem.

Como forma de garantir a responsabilidade ambiental, a Associação faz uso de um Código de Ética e de Conduta Ambiental que visa, entre outros aspectos, identificar e reduzir os impactos e riscos ambientais, respeitar os locais, a população anfitriã, seus valores culturais e suas tradições, evitar o desperdício de água e energia, impedir o vazamento de esgoto, reduzir a poluição sonora e atmosférica e controlar o uso de produtos adversos ao meio ambiente. Este código foi desenvolvido com o auxílio do Programa de Turismo da United Nations Environment Programme (UNEP), organismo ambiental da Organização das Nações Unidas (ONU), com quem a Associação possui acordo formal de cooperação. A Associação também é vice-presidente da Junta Diretiva dos Membros Afiliados, fórum empresarial da Organização Mundial do Turismo (OMT), organismo de turismo da ONU no qual possui assento desde 2007.

4.2. Os Meios de Hospedagem Pesquisados

Os meios de hospedagem pesquisados correspondem a quatro membros da Associação Roteiros de Charme localizados no estado de Santa Catarina.

A Entrevista 1 foi realizada com o proprietário de um meio de hospedagem fundado em 1999, que atualmente conta com uma média anual de 30 funcionários e uma taxa de ocupação anual de 40%. O empreendimento é classificado como Topázio Imperial, de acordo com a categorização da Associação Roteiros de Charme. O empreendimento possui 18 chalés que contam com camas king size, lençóis térmicos, TV a cabo, telefone, frigobar e mini-bar, varanda, secador de cabelos, aquecedor de toalhas e calefação. Alguns possuem também DVD, lareira e jacuzzi com vista panorâmica. Fazem parte de sua infra-estrutura salas de fitness, saunas secas e úmidas, home cinema, biblioteca, jogos, piscina interna e jacuzzi externa aquecidas, boutique, restaurante sobre um lago com deck e vista 360º e adega nacional e internacional. Todos os ambientes possuem vista para a natureza. Pesca de trutas, trilhas, canoagem e cavalgadas até canyons e cascatas fazem parte das opções de lazer.

A Entrevista 2 foi realizada em um meio de hospedagem fundado com 1998, que conta com oito funcionários fixos, podendo aumentar durante os períodos de maior movimento. Sua taxa de ocupação média anual é de 39%. Este estabelecimento se enquadra na categoria Água Marinha, segundo a classificação da Associação Roteiros de Charme. Este estabelecimento oferece trilhas ecológicas e pesca da tainha, além de uma estrutura com piscina térmica, jacuzzi aquecida, sauna a vapor, aparelhagem para exercícios aeróbicos, anaeróbicos e de alongamento e serviço de praia. São 10 unidades habitacionais divididas em oito apartamentos com TV à cabo, telefone, frigobar, ar split, cofre e internet Wi-Fi e duas suítes que têm como diferencial uma cama super king, home theater, DVD, hidromassagem, terraço com jacuzzi, sauna e vista da praia.

O meio de hospedagem no qual foi realizada a entrevista 3 foi fundado em 1993, seu número de funcionários varia entre 13 e 16, dependendo da época do ano e sua taxa de ocupação média é de 50%. Tendo em vista a classificação da Associação Roteiros de Charme, este empreendimento se enquadra na categoria Topázio Imperial. O estabelecimento conta com bar, sala de relaxamento, sala de jogos, restaurante, duas jacuzzi aquecidas, uma externa e uma interna, academia, sauna, sala de massagem e oferece banho de espuma. São 10 apartamentos, todos com varanda e vista para o mar, TV à cabo, DVD, telefone, ar condicionado split, frigobar, cofre, travesseiros de pluma e látex, roupões, secador de cabelos e colchões de mola importados.

A entrevista 4 foi realizada em um meio de hospedagem fundado em 1993, que possui em média 40 funcionários. O empreendimento tem uma taxa de ocupação média de 65%. O estabelecimento é classificado pela Associação Roteiros de Charme como Topázio Imperial.

O local oferece restaurante, serviços de praia e piscina, barqueiro, sala de massagem, bar na praia, sala de ginástica, mergulho, sala de TV, jogos, telefonista, internet Wi-Fi, pesca da tainha e passeios de lancha. São 20 chalés com cofre, secador de cabelos, frigobar, TV, DVD, cofre, ar condicionado, CD player, varanda, rede e vista.

4.3 A Gestão Ambiental dos Meios de Hospedagem

4.3.1. Práticas e estratégias ambientais dos meios de hospedagem

De modo a facilitar o entendimento e a visualização, o Quadro 1 a seguir sintetiza as respostas dos proprietários de cada um dos meios de hospedagem entrevistados aos principais questionamentos sobre suas práticas de gestão ambiental. Dentre elas encontram-se assuntos relacionais aos efluentes líquidos, consumo de água e energia, resíduos sólidos, preservação da flora e da fauna e insumos.

Os entrevistados utilizam em média 84% das principais práticas questionadas. A partir de uma análise comparativa entre os empreendimentos, é possível afirmar que suas práticas ambientais são similares. Esta conclusão de deve ao fato de existirem apenas pequenas diferenças entre as ações ambientais. Este cenário pode ser justificado pelo compromisso comum existente entre os meios de hospedagem pesquisados e a Associação Roteiros de Charme.

Os meios de hospedagem pesquisados parecem, desta forma, compreender a atual problemática sobre o desenvolvimento sustentável que atenta para necessidade do uso de práticas ambientais pelas empresas como forma de reduzir o impacto sobre o meio ambiente.

Levando em consideração as práticas ambientas que os estabelecimentos pesquisados utilizam e os aspectos ambientais das abordagens propostas por Barbieri (2007), seria possível supor que todos se encontram na abordagem denominada prevenção da poluição. Isto se deve ao fato de todos os estabelecimentos apresentarem pelo menos uma prática que busque não apenas controlar, mas prevenir a poluição, promovendo o reuso e a reciclagem, a redução na fonte e a recuperação energética.

Como exemplo pode-se citar a reutilização dos resíduos orgânicos promovida pelos meios de hospedagem 1, 3 e 4 como forma de reuso, a utilização de energias renováveis pelos empreendimentos 1, 2 e 3 como recuperação energética e o uso da iluminação natural por todos os entrevistados como meio de redução.

No entanto, a teoria proposta pelo autor não compreende apenas os aspectos ambientais, mas também os empresariais e somente pode ser aplicada por meio da análise de ambos. Isto ocorre porque esta teoria visa classificar a estratégia ambiental das organizações que, diferente da eficácia operacional presente na prevenção da poluição, engloba todo o conjunto de atividades da empresa (PORTER, 1996).

Esta relação fica clara quando se trata da abordagem estratégica citada por Barbieri (2007), que consiste o estágio mais avançado das estratégias ambientais das organizações. Os fatores que diferenciam esta abordagem das demais não correspondem às práticas ambientais utilizadas, mas justamente aos aspectos empresariais como, por exemplo, o tipo de preocupação básica existente na organização, a percepção dos empresários e administradores e o envolvimento da alta administração. Segundo Sharma (2000), a classificação das estratégias ambientais entre pró-ativas e reativas também depende do modo como os administradores percebem os desafios ambientais.

Além disso, as estratégias ambientais dos estabelecimentos estudados nesta pesquisa somente podem ser diferenciadas por meio da análise destes dois aspectos, o ambiental e o empresarial, tendo em vista a similaridade existente entre os aspectos ambientais.

Levando em consideração este cenário e a necessidade da análise dos aspectos empresariais para a aplicação das teorias ambientais estudadas, a análise das estratégias ambientais dos meios de hospedagem pesquisados é resgatada a seguir.

As práticas de gestão ambiental levantadas correspondem ao que Porter (1996) chama de eficiência operacional. De acordo com a teoria de autor, o número de práticas ambientais utilizadas define o grau de eficiência operacional. A partir deste momento são levantadas as posições dos entrevistados frente ao desafio ambiental, incluindo as suas motivações para o uso de práticas ambientais. Estes aspectos, em união às práticas ambientais, vão compor o que Porter (1997) chama de estratégia organizacional. A partir da análise dos aspectos empresariais, então, foi possível analisar o tipo de estratégia ambiental utilizada por cada um dos meios de hospedagem, conforme descrito a seguir.

De forma a facilitar a visualização, as informações a respeito do posicionamento dos entrevistados em relação à questão ambiental foram compiladas no Quadro 2 a seguir.

Os entrevistados ficaram divididos no que diz respeito às motivações para as práticas ambientais. No entanto, todos citaram pelo menos um aspecto positivo relacionado à questão ambiental. Nenhum meio de hospedagem foi classificado como possuidor de estratégias reativas. A razão pela qual isto ocorre pode estar relacionada ao fato de todos pertencerem à Associação Roteiros de Charme e estarem submetidos aos seus requisitos ambientais mínimos para ingresso.

4.4. A Internacionalização dos Meios de Hospedagem e sua Influência na Gestão Ambiental

Os serviços de turismo são prestados e consumidos no território do prestador do serviço, o que faz com que o grau de internacionalização não possa ser facilmente mensurado. Conforme definido anteriormente neste trabalho, neste caso, a internacionalização pode ser compreendida, de acordo com o conceito de Björkman e Forsgren (2000), através do grau de internacionalização da network na qual a empresa está inserida. Tendo em vista esta conceituação, a internacionalização dos meios de hospedagem está atrelada à quantidade de hóspedes estrangeiros recebida.

Segundo Clark et al. (1996), o mercado internacional de serviços é mais sensível às variações culturais do que o mercado de bens de consumo. Isto ocorre em razão da interação direta existente na simultaneidade da produção e do consumo. No caso dos serviços de turismo, esta interação se caracteriza pelo relacionamento com clientes estrangeiros. As variações culturais, neste caso, podem fazer com que o comportamento ambiental seja diferente entre os países. Por esta razão, a pressão dos consumidores estrangeiros é citada por Dief e Font (2010) como capaz de influenciar as estratégias ambientais.

Sendo assim, os entrevistados foram questionados a respeito das diferenças de comportamento ambiental entre hóspedes estrangeiros e brasileiros e sobre o impacto que estas diferenças podem causar nas práticas de gestão ambiental. Os dados obtidos são descritos e analisados nos itens a seguir.

As respostas dos entrevistados aos principais questionamentos relacionados à internacionalização são sintetizadas no Quadro 3. Nele estão inseridas as percepções dos entrevistados a respeito das diferenças de comportamento ambiental entre estrangeiros e brasileiros e da influência da internacionalização nas práticas ambientais dos estabelecimentos, além da evolução do fluxo de estrangeiros desde a fundação dos meios de hospedagem.

Percebe-se, a partir da análise do Quadro 3, que apenas um entrevistado afirmou não perceber diferenças de comportamento ambiental entre hóspedes estrangeiros e brasileiros. No entanto, em conversa informal, o supervisor de operações deste estabelecimento afirmou notar as diferenças de comportamento. Considerando a hipótese de que o supervisor de operações tenha um maior contato com os hóspedes do que o proprietário do meio de hospedagem, sua opinião pode ser considerada neste estudo. Nestes termos, a maior preocupação ambiental dos hóspedes estrangeiros fica evidente entre os entrevistados.

Os empreendimentos também possuem a mesma opinião entre si no que diz respeito às diferenças de comportamento ambiental entre as nacionalidades estrangeiras. O público europeu foi considerado o mais preocupado com o meio ambiente. Os motivos mais citados foram educação e consciência.

No entanto, no que diz respeito à influência da internacionalização nas práticas de gestão ambiental, nem todos os entrevistados concordam. Para os entrevistados 1 e 2, as práticas ambientais são decorrentes de uma consciência ambiental e, por isso, não são influenciadas pelos clientes estrangeiros. Já para o entrevistado 3, apesar de as práticas advirem de uma consciência ambiental pré-existente, as exigências dos clientes estrangeiros são citadas como incentivadoras das ações praticadas. O entrevistado 4, por sua vez, afirma utilizar práticas ambientais em razão das exigências do público internacional e que, sendo assim, este hóspede atua não apenas como incentivador, mas como agente capaz de modificar as práticas ambientais do estabelecimento.

Os empreendimentos 1, 2 e 3 possuem práticas ambientais, recebem clientes internacionais e notam diferença entre o comportamento ambiental do estrangeiro e do brasileiro. Quando questionados afirmam que não percebem a influência do fluxo de estrangeiros nas práticas ambientais porque suas ações advêm de uma consciência própria. Uma possível razão para este fato poderia ser o desinteresse em atrair este hóspede, tendo em vista o fato de serem empresas pequenas, com menos de 30 funcionários. As práticas ambientais, além da consciência, são realizadas por exigência da Associação Roteiros de Charme, cuja associação pode ter sido realizada para atrair clientes, mas não necessariamente internacionais. Uma evidência deste cenário consiste no fato do fluxo de hóspedes estrangeiros destes estabelecimentos não ter se alterado desde a fundação, enquanto esta quantidade se multiplicou no estabelecimento 4.

O meio de hospedagem 4 se configura, desta forma, o único estabelecimento no qual o fluxo de hóspedes internacionais aumentou desde a fundação, fato este derivado do aumento de suas práticas ambientais. A percepção deste cenário faz com que o entrevistado se motive a novamente aumentar as suas práticas, desta vez, com o real objetivo de ampliar o fluxo internacional. Esta realidade pode explicar o fato deste entrevistado perceber a influência da internacionalização em suas estratégias ambientais.

Desta forma, é importante ressaltar a existência deste caminho inverso. Assim como a internacionalização pode afetar as práticas de gestão ambiental, as ações utilizadas podem afetar o nível de internacionalização da empresa. Na medida em que as práticas se multiplicam, o fluxo internacional aumenta.

A partir da análise destas informações é possível inferir que o impacto da internacionalização nas estratégias de gestão ambiental varia conforme o modo como o proprietário administra o desafio ambiental. Os entrevistados 1, 2 e 3, por exemplo, afirmam utilizar práticas ambientais em razão de uma consciência pessoal e encaram o desafio como positivo em razão dos benefícios que podem ser gerados ao meio ambiente. Apesar de notarem diferenças de comportamento entre estrangeiros e brasileiros, não percebem impacto direto da internacionalização nas práticas de gestão ambiental. Já o entrevistado 4 utiliza práticas ambientais justamente para atender às necessidades dos hóspedes estrangeiros e encara o desafio ambiental como positivo porque o considera um investimento na área de marketing da empresa, uma propaganda. Esta percepção faz com que este proprietário note a influência da internacionalização nas práticas de gestão ambiental. Desta forma, com base na interpretação das entrevistas realizadas, pode-se dizer que o impacto da internacionalização nas práticas ambientais está atrelado à forma como o desafio ambiental é encarado pelo proprietário do negócio.

A quantidade de hóspedes estrangeiros recebida não pareceu influenciar as práticas ambientais, já que o único entrevistado que nota a influência deste público nas estratégias de gestão ambiental recebe um fluxo de 12% de clientes internacionais, enquanto este público nos meios de hospedagem 1, 2 e 3, que não percebem esta influência, corresponde respectivamente a 2%, 30% e 10%.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa buscou analisar a influência da internacionalização nas estratégias de gestão ambiental dos meios de hospedagem de Santa Catarina vinculados à Associação Roteiros de Charme. Dentre os fatores motivadores para o estudo estão o crescimento do turismo no estado de Santa Catarina e o paradoxo criado pelo impacto que esta atividade causa no meio ambiente e a sua dependência dele, levando em consideração a busca cada vez maior de turistas por locais onde a natureza seja abundante.

Há evidências na literatura de que a internacionalização poderia influenciar de forma positiva as práticas ambientais dos meios de hospedagem, já que a recepção de clientes estrangeiros faz com que o empreendimento entre em contato com hóspedes provenientes de diferentes culturas e com comportamentos e exigências ambientais diferenciados. De forma a adquirir competitividade no mercado, as empresas buscariam a satisfação das necessidades deste público. Tal assertiva passou a ser uma pressuposição inicial deste trabalho.

No que se refere à internacionalização dos estabelecimentos, todos os entrevistados afirmaram receber hóspedes estrangeiros e, portanto, puderam ser classificados como detentores de algum nível de internacionalização. De acordo com as informações obtidas, o entrevistado 1 mostrou possuir o menor grau de internacionalização e o entrevistado 2 o maior.

O estudo constatou que as práticas ambientais dos estabelecimentos pesquisados são bastante similares. Uma possível razão para esta realidade seria o fato de todos estarem vinculados à Associação Roteiros de Charme e compartilhando de suas exigências.

Quando levantadas as principais motivações para a gestão ambiental dos empreendimentos, observou-se que todos os meios de hospedagem, com exceção do de número 4 foram classificados em estratégias intermediárias. Não foi possível classificá-los como reativos, já que fazem uso de ações preventivas e não encaram o desafio ambiental como ameaças, nem como pró-ativos, uma vez que ainda não visualizam os problemas ambientais como oportunidade mercadológica. Já o meio de hospedagem 4, tendo em vista suas ações preventivas e sua percepção do aspecto ambiental como oportunidade para adquirir vantagens competitivas, mostrou fazer uso de uma estratégia pró-ativa.

Quanto à relação entre as práticas de gestão ambiental e a internacionalização dos meios de hospedagem estudados, os resultados confirmaram as teorias existentes no que diz respeito às diferenças de comportamento ambiental entre estrangeiros e brasileiros. No entanto, mostraram que a influência deste aspecto nas estratégias ambientais só é verdadeira se o administrador visualizar o aspecto mercadológico do desafio ambiental. Sendo assim, o impacto da internacionalização nas estratégias de gestão ambiental varia conforme a maneira pela qual o empresário encara o desafio ambiental, chamando a atenção para o papel dos gestores e empresários nesse sentido.

Os dados analisados neste estudo mostraram também a existência de um caminho inverso em relação à internacionalização e as estratégias ambientais. Assim como o fluxo de estrangeiros pode influenciar as estratégias de gestão ambiental, estas podem influenciá-lo, tendo em vista que boas práticas atraem este tipo de público.

Todavia, a quantidade de hóspedes estrangeiros recebida não pareceu influenciar as estratégias de gestão ambiental. O único meio de hospedagem no qual o proprietário notou esta influência possui um fluxo de clientes internacionais intermediário, em comparação com os demais.

Tendo em vista as evidências na literatura de que a internacionalização poderia influenciar as práticas de gestão ambiental dos meios de hospedagem, esperava-se que todos os entrevistados fossem perceber esta influência e explicar o seu funcionamento. No entanto, apenas um entrevistado correspondeu ao esperado. Os demais, apesar de corroborarem a informação de que os hóspedes estrangeiros são mais preocupados com o meio ambiente, não notaram esta influência. Segundo os resultados deste estudo, isto ocorre principalmente porque estes gestores não percebem o aspecto mercadológico envolvido no uso das práticas ambientais.

Por fim, observou-se também que classificação (em pedras preciosas) dos meios de hospedagem parece não considerar sua atuação frente o meio ambiente, o que pode remeter à baixa consciência deste aspecto no sucesso da associação.

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