Revista OIDLES - Vol 2, Nº 5 (diciembre 2008)

POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTO LOCAL: MODELO DE ANÁLISE DO PROJETO FLORES DA BAHIA, SOB O ENFOQUE DO CAPITAL

Por Lessí Inês Farias Pinheiro y João Pedro de Castro Nunes Pereira (CV)

 

 

1 - INTRODUÇÃO

Muitos estudos procuram investigar o papel do Estado na formação do capital social ou mesmo sua mobilização (ARRIAGADA e MIRANDA, 2005; RACZYNSKI, 2005; NASCIMENTO, 2000; MILANI, 2003). No entanto, poucos são os estudos empíricos que investigam a relação do capital social com desenvolvimento local, especificamente no contexto agroindustrial. Este artigo tem como principal objetivo a proposição de um modelo para análise das políticas públicas relacionadas ao agronegócio de flores do estado da Bahia, sob o enfoque do capital social. Dentre todas as atividades de produção vegetal que atualmente estão sendo desenvolvida no estado da Bahia, a produção de flores tropicais e subtropicais, é uma das atividades em que papel do Estado na promoção de políticas setoriais foi muito expressivo nos últimos dez anos.

A análise justifica-se pela carência de estudos sobre os elementos estruturais capazes de orientar a elaboração de políticas para o setor e, também, pela a importância crescente da floricultura no contexto dos agronegócios na Bahia. A partir da análise de dados secundários de nove municípios baianos em que o papel do Estado foi preponderante. São eles: Cruz das Almas e Paulo Afonso, na produção de flores tropicais; Barra do Choça, Bonito, Ibicoara, Maracás, Miguel Calmon, Mucugê e Vitória da Conquista a produção de flores subtropicais.

O artigo foi estruturado em três partes. Na primeira parte é apresentada a conceituação teórica, hoje existente na literatura, enfocando a relação capital social e políticas públicas para o desenvolvimento local e agronegócios. A segunda parte do trabalho apresenta um panorama geral do setor de flores no país o no estado da Bahia. Na terceira parte é apresentado o modelo de análise proposto e que deverá nortear a análise do Projeto Flores da Bahia. A guisa de conclusão são apresentadas considerações finais.

2 - APONTAMENTOS TEÓRICO

2.1 - Capital Social e as políticas públicas para o desenvolvimento local

O marco teórico do capital social relaciona a sua criação com a ampliação teórica do termo capital. A noção de capital implícita no conceito de capital social, reconfigura a noção de capital, (re)socializando a economia e (re)politizando os espaços público e privado, ao mesmo tempo que amplia a influência do ator social (NASCIMENTO, 2000).

Destacando que o capital social constitui-se de características que equivalem a um ativo social, Nascimento (2000), enfatiza que o mesmo pode ser adicionado como um componente superestrutural na equação do desenvolvimento, em que D é o desenvolvimento, Ke é o capital econômico, Kn é o capital natural, Kh é o capital humano e Ks o capital social, ou seja:

D = f(Ke, Kn, Kh,Ks).

Coleman (1990), destaca que existe uma relação de complementação direta entre o capital econômico (infra-estrutura produtiva, políticas de financiamento), capital humano (educação) e capital social (relações de confiança, cooperação e ações conjuntas). Já para Abu-El-Haj, (1999) a junção entre o capital econômico e o capital humano será potencializada na medida em que as relações de confiança e cooperação aumentem entre os atores de uma mesma comunidade. Assim, os capitais econômico e humano apresentam-se constantes e similares, o possível diferencial de desempenho das atividades econômicas que estas venham a desenvolver pode ser explicado pelos laços de confiança estabelecidos entre os atores que compõem determinado sistema produtivo, que permite assim a mobilização coletiva e otimização dos recursos individuais existentes.

Os primeiros registros sobre capital social remontam 1916, quando Lyda Hanifan construiu uma definição de capital social, partindo da idéia do valor econômico das redes sociais (MILANI, 2003). Esse debate ficou mais acentuado na década de 1980. Em 1985 o trabalho de Bourdieu considerou ser o capital social “um agregado de fontes potenciais e atuais que estão ligadas à possessão de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de conhecimento e reconhecimento mútuo” (BOURDIEU, 1986, p. 82). Para ele, o caráter econômico do capital social é importante e deve sempre ser abordado. Entretanto, enfatiza, que este conceito vai além do caráter puramente econômico.

Uma visão menos econômica e mais social foi delineada por Coleman (1988), que abordou o capital social como uma forma de organização social, mais do que uma variável presente nesse tipo de organização, à exemplo do que pondera Bourdieu. Ou seja, o capital social emergiu como característica intrínseca de uma estrutura social. Para Coleman, as formas de expressão deste capital podem ser identificadas em elementos como confiança e obrigação, informação disseminada através de redes, sistemas regidos por normas, estruturas autoritárias, entre outras.

Nos anos 1990 intensificou-se o interesse pela presença e qualidade das relações sociais e institucionais no processo de desenvolvimento, interesse este que envolveu diversas áreas de conhecimento: i) na economia, Douglas North destacou a relação entre as instituições formais e informais no desempenho da economia; ii) na sociologia, Wade e Ostrom salientaram a importância de relações sociais e institucionais locais no tratamento da pobreza; iii) e na ciência política, Putnam evidenciou que a densidade de fatores sócio-culturais, tais como tradição cívica, explicam diferenças de desenvolvimento regional (MILANI, 2003).

A bibliografia consultada aponta para a diferenciação do capital social baseada na posição social dos agentes envolvidos (NICOLA, COLLE e CALCANHOTO, 2006). São três os tipos de capital social citados atualmente.

i) Capital social institucional (linking) - descreve as relações entre a sociedade civil e o Estado. Trata-se de ligações entre diferentes estratos da pirâmide social. Nas comunidades onde este tipo de capital social é relevante os governos são sensíveis às demandas dos estratos inferiores.

ii) Capital social extracomunitário (brinding) - refere-se às relações sociais que a comunidade estabelece com grupos externos, tanto sociais como econômicos. A importância deste tipo de capital refere-se à capacidade dos agentes de realizarem trocas econômicas, ou seja, estabelecerem relações de mercado e obterem acesso a conhecimentos externos.

iii) Capital social comunitário (bonding) - trata das relações travadas entre agentes da mesma posição, ou seja, baseadas na confiança nas suas comunidades e na reciprocidade entre agentes.

Ao mesmo tempo, as abordagens sociológicas dão centralidade a dois outros conceitos-chave, que definem dimensões distintas e complementares do capital social, o enraizamento e a autonomia. O enraizamento refere-se à inserção ou integração dos indivíduos nas relações sociais. A integração aqui referida, baseada em identidade ou projetos comuns, pressupõe precursores culturais como a confiança. Já autonomia, tem a ver com a postura e qualidade da atuação dos agentes sociais, refere-se à capacidade cívica dos agentes, sejam eles governantes, funcionários públicos ou sociedade civil. Esta dimensão é relativa à capacidade de agir em prol de interesses coletivos e públicos (MORAES,2003).

A funcionalidade de uma teoria em grande parte depende da capacidade de se obter indicadores mensuráveis e quantificáveis. A questão que aqui se coloca é como mensurar níveis de confiança e as relações sociais de uma comunidade e como esses fatores influenciam o desenvolvimente. É possível encontrar na literatura diversos trabalhos voltados à proposição metodológica para medir o capital social disponível, seja este em caráter individual ou para uma comunidade. Muitos desses estudos acabam por desconsiderar, para fins dessa medição, o caráter multidimensional que engloba esse conceito.

Combinando-se os diferentes tipos (institucional, extra-comunitário e comunitário) e dimensões (enraizamento e autonomia) de capital social, obtém-se um resultado analítico interativo e multidimensional. Nicola, Colle e Calcanhoto (2006) apresentam um esquema de análise, baseado no trabalho de Woolcock (2000) e adaptado por Castilhos em 2002, em que o capital social institucional representa o nível macro, o capital social extra-comunitário o nível meso e o capital social comunitário o nível micro. O modelo proposto está reproduzido no quadro 1.

As variáveis destacadas no quadro - níveis de interação entre tipos e dimensões do capital social - servirão como ponto de partida para a construção de uma ferramenta análise empírica de políticas públicas sob uma perspectiva que leva em conta o capital social das comunidades destinatárias da política pública.

Para prosseguir a explicitação do arcabouço teórico sobre o qual repousará a análise das normas e procedimentos operacionais do projeto Flores da Bahia em seu potencial de formação de capital social, é necessário destacar algumas reflexões teóricas. Primeiramente, a questão levantada por Woolcock (1999) como fragilidade/preocupação teórico empírica do uso da idéia de capital social segundo a qual não é possível distinguir se o capital social é fonte ou conseqüência da ação coletiva. Para o autor, as diversas abordagens teóricas levam a questão se, quanto à infra-estrutura econômica e relações sociais, o capital social é meio ou fim, ou ambos. Para alguns autores esta questão é uma vantagem, ou seja, a “[...] força eventual da noção de que se origina e, concomitante, tem impacto em uma série de comportamentos humanos e atividades sociais devidamente contextualizadas” (MILANI, 2003).

Outra questão, também levantada por Woolcock é se a implementação das políticas públicas pode ser justificadas pela idéia de capital social. Vários autores apontam o capital social e a participação como um elemento importante para fortalecer a democracia, uma vez que desenvolve a capacidade de as pessoas se envolverem com o desenvolvimento social, resolvendo problemas comuns e tendo controle sobre os resultados. Nesta perspectiva, torna-se “[...] cada vez mais comum que políticas públicas de redução da pobreza incentivem a formação de redes e a geração de capacidades para as pessoas exercerem, com autoridade, os processos que afetam diretamente o seu bem-estar. [...]” (FERRAREZI, 2003, p. 17).

Importa destacar, ainda, que vários estudos identificam obstáculo para que o setor púbico trabalhe numa perspectiva de capital social. Bebbington (2005) levantou várias delas. Primeiramente, os tempos do setor público não são adequados aqueles requeridos pelo setor privado. Em segundo lugar, a cultura de muitos programas do setor público tende à tecnocracia. Muitos programas são regidos por objetivos quantitativos, enquanto outros são regidos por profissionais técnicos quer não observam o contexto social das intervenções. Existe, também a tendência a que os programas não captem as dinâmicas locais, nem tampouco demonstre interesse em fortalecê-las.

Como se observa, a análise de políticas públicas, sob a ótica do capital social, requer que se delimite/quantifique seus impactos, se ele trabalha com os ativos locais já disponíveis, ou trabalhará ações de intervenção visando potencializá-los. Assim sendo, um programa pode trabalhar com ações priorizando o nível micro (organizações já existentes nos destinatário), o nível meso (criação de fóruns e ações horizontais), nível macro (vínculos com agentes institucionais e ações verticais), ou ações nos três níveis.

2.2 - Conceito Geral de Agribusiness e suas possíveis abordagens

O termo "agronegócio" tem sido largamente utilizado nos estudos referentes à organização das cadeias produtivas relacionadas aos negócios agropecuários, muitas vezes relacionando-se a "complexos agroindustriais", "cadeias agroindustriais", "agronegócios", "sistemas agroindustriais", etc. Para Batalha e Scarpelli (2005), apesar de apresentarem ampla variação quanto aos seus objetivos, métodos e grau de academicismo, a grande maioria desses trabalhos busca compreender a geração e a respectiva distribuição entre os agentes geradores desses valores. O conceito foi utilizado pela primeira vez por Davis e Goldberg, em 1957, e segundo seus proponentes, representa a "soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, das operações de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos com base neles” (ZYLBERSZTAJN, 1995).

Segundo Batalha e Scarpelli (2005), os autores seguramente se basearam nos conceitos e idéias oriundos da teoria dos sistemas. O caráter sistêmico da abordagem dos agronegócios implica na condição de que exista uma organização dos componentes para que os objetivos comuns do sistema possam ser efetivamente atingidos. Tal abordagem está baseada em três segmentos, concentrados em sua grande maioria nas unidades de produção rural ("da porteira para dentro"), de insumos (máquinas, implementos, defensivos, fertilizantes, sementes, tecnologia, etc) e as atividades dos segmentos concentrados fora das unidades produtivas ("da porteira para fora"), representados pelas atividades de armazenamento, beneficiamento, industrialização, distribuição e consumo (ZYLBERSZTAJN 1995).

Um outro enfoque de análise foi apresentado por Goldberg, envolvendo um conceito mais amplo, denominado Commodity System Aprpoach (CSA), que traz como base, um determinado produto dando origem a vários outros (Goldberg 1968 apud BATALHA; SCARPELLI, 2005). A análise desenvolvida sob o enfoque do conjunto de várias cadeias agroindustriais relacionadas a produtos de basetem sido comumente utilizado com a denominação de “Complexo Agroindustrial”. A análise sob esse enfoque, por ser mais amplo do que o enfoque em função do produto, tem seu maior significado para o estudo das estratégias corporativas das empresas envolvidas e especialmente no que se refere aos estudos relacionados a políticas públicas setoriais (BATALHA E SCARPELLI, 2005).

Nem sempre, as cadeias produtivas estão restritas a uma mesma localidade delimitada por critérios sociais, políticos ou geográficos naturais. Geralmente, as cadeias de produção transpõem esses limites, e passam a abranger áreas distintas. Como cada área possui suas especificidade em termos culturais, políticos, sociais, etc, tanto a análise do ambiente competitivo quanto o estabelecimento de ações para uma determinada cadeia produtiva que abranja localidades com tais diferenças, devem considerar prioritariamente esses aspectos.

Sob a análise sistêmica apresentada por Davis e Goldberg (1957) apud Zylbersztajn (1995) considera-se o agronegócio de flores no Brasil como sendo o conjunto de todas as atividades de produção, preparo, distribuição e aquisição dos produtos relacionados à floricultura. Em seu sentido mais amplo, a floricultura engloba além do cultivo de flores para corte, a produção de folhagens, mudas e plantas arbóreas de pequeno e grande porte (CASTRO, 1988; FRANCISCO et al. 2003a). Assim, a abordagem sob o enfoque da cadeia produtiva fica comprometida quando não se define ao certo o produto oriundo dessa cadeia.

3 - O AGRONEGÓCIO DE FLORES NO CONTEXTO NACIONAL E NA BAHIA

3.1 - Os Agronegócios de Flores no Contexto Nacional

Segundo dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Floricultura – Ibraflor, o setor de flores e plantas ornamentais hoje é responsável pela geração de mais de 120 mil empregos diretos, dos quais 58 mil (48,3%) alocados diretamente nas atividades de produção; 4 mil (3,3%) em distribuição e logística distribuição; 51 mil (42,5%) no comércio varejista e 7 mil (5,9%) em funções como apoio, administração e outras (IBRAFLOR, 2006).

Esses resultados em parte podem ser explicados pelo fato de que o desenvolvimento da floricultura no País, quando comparado a outras atividades agrícolas, apresenta no geral uma alta rentabilidade, associada ao rápido retorno do capital investido (YAMAMUCHI, 1995, apud CLARO; OLIVEIRA, 1999). Segundo Almeida (2004), a produção de flores pode gerar um rendimento dez vezes superior a média do rendimento obtido com o cultivo de frutas tradicionalmente plantadas no país, como banana, uva, abacaxi e uva. Segundo Claro (1998) a produção de flores gera uma grande rentabilidade por área cultivada e retorno rápido do capital empregado.

Além disso, a floricultura é uma das atividades agrícolas que gera um número elevado de empregos fixos, em torno 15 a 20 pessoas/ hectare (CLARO, 1998; KIYUNA et al.,2003), resultando em mais de 120 mil empregos diretos (IBRAFLOR, 2006). Para cada R$ 1 milhão investido, a floricultura gera 404,24 novos empregos, quase quatro vezes mais a geração de empregos observada nos agronegócios brasileiros como um todo. Essa mão-de-obra tem um melhor nível de qualificação se comparada com as demais atividades agrícolas e apresenta uma importância crescente nos processo geração de valor do setor em termos nacionais (Francisco et al ., 2003a).

3.2 - O Agronegócio de Flores no Estado da Bahia

A produção de flores baiana está baseada na predominância de pequenos e médios produtores estabelecidos em todas as regiões do estado, especificamente na Região Metropolitana de Salvador, nos Litorais Norte e Sul do estado, na Região do Recôncavo e na Região Central do estado.

Com relação aos valores brutos de produção, tem-se atualmente uma carência muito grande de informações detalhadas, a esse respeito. Em termos gerais, dados apresentados nos relatórios de atividades de governo nos anos de 2004 a 2006 mostram que a floricultura baiana desde 2004 está na casa dos R$ 9 milhões, num mercado que movimenta cerca de R$ 45 milhões/ano (BAHIA, 2005 e 2006).

A história da floricultura no estado da Bahia está intimamente ligada ao papel do poder público como agente indutor. Essa história pode ser dividida em dois momentos: o primeiro é caracterizado por ações de capacitação tecnológica e pela implantação de políticas públicas de financiamento e isenção de impostos, o segundo é quando as ações se voltaram mais a inclusão de população em situação de risco social (especialmente jovens).

No inicio, em 1996, as ações estavam focadas na capacitação de produtores e técnicos do governo, na importação de tecnologias de outros estados da federação (sobretudo São Paulo) e na estruturação de planos de financiamento. Linhas de financiamento para pequenos produtores foram enfatizadas pelo Banco do Nordeste, que firmou entre 2002 e 2005 contratos no montante de R$ 916 mil, sendo que no ano de 2005, houve o maior aporte de financiamento, totalizando R$ 210 mil.

Posteriormente, em 2003, o estado passou a imprimir um caráter social mais intenso, focando suas ações na associação desse tipo de negócio a projetos comunitários que entre outros benefícios contemplavam a isenção de impostos de comercialização e a priorização de ações de formação profissional de jovens em situação de risco social como produtores rurais (BAHIA, 2005; 2006).

Quando o governo estadual começou a intervir diretamente no cenário da floricultura, houve um aumento expressivo da importância desse setor no cenário estadual: a área de plantio passou de cerca de 10ha, em 1995, para 150ha, em 2005. O crescimento da área cultivada no Estado foi mais expressivo no período entre 2004 e 2005, que apresentou crescimento ao redor de 20% de um ano para o outro (BAHIA, 2005; 2006).

Após intervenção maciça do poder estatal, a produção interna, que não conseguia atender a mais do que 3% do mercado interno, passou a atender cerca de 20% do mercado estadual. Especificamente para a cultura do crisântemo, segundo dados da própria Secretaria Estadual de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária, a produção atual dessas flores chega suprir cerca de 80% da demanda estadual.

4 - A PROPOSIÇÃO DE UMA ESTRURA DE ANÁLISE

Retomando o objetivo principal deste trabalho, analisar as normas e procedimentos operacionais do Projeto Flores da Bahia em seu potencial de formação de capital social, apresenta-se o modelo de análise proposto. O modelo parte do esquema apresentado no quadro 1, desagregando a análise de acordo com as dimensões do capital social e focando os ativos disponíveis localmente. A análise segue os três níveis/tipos de capital social (macro, meso e micro), subdividindo-os nas duas dimensões citadas anteriormente (enraizamento e autonomia).

Para o nível macro, apresentado no quadro 2 as questões que devem ser respondidas são:

Dimensão enraizamento - A implementação do Projeto Flores da Bahia promoverá o capital social vertical mediante a criação/manutenção de nexos entre as comunidades locais e os governos estadual e municipal?

Dimensão autonomia - A relação vertical entre os agentes transcorre de forma transparente de forma a fortificar os laços de confiança no setor público?

Nas relações verticais, a ação conjunta e/ou integrada das diversas esferas do poder público indubitavelmente potencializa o efeito das políticas públicas. Essa interação deve ser medida através da medida do crescimento do número de ações.

Existe um certo consenso de que não há capital social sem capacidade de associativismo, visto como capacidade de ação entre pessoas que não são das mesmas famílias, via de regra visando questões ligadas a sobrevivência, questões religiosas, geração de capital humano, acesso a bens e serviços. A implementação da capacidade vínculos baseados na confiança implica na construção de marco de normas amplamente conhecidos que permitam a institucionalização de ações conhecida, habituais e exitosas de ações sociais (ARRIAGADA e MIRANDA, 2005). Nesta vertente serão medidas a variações no número de novas organizações, as ações visando a qualificação das organizações já existentes e a análise dos métodos de ação dessas organizações.

No que se refere à melhoria do acesso pelos produtores às instituições e serviços do Estado e aos bens públicos percebe-se que é requisito básico para construir e manter capital social e para a distribuição mais equitativa dos bens coletivos (ARRIAGADA e MIRANDA, 2005). Nesta variável é relevante o reconhecimento das normas e valores sociais locais e a intermediação dos órgãos públicos na relação entre instituições que fornecem a assistência técnica e os produtores assistidos.

É importante referir, ainda, que tensões entre as diferentes esferas de governo é um obstáculo à construção de capital social através de políticas públicas. Tais tensões podem se manifestar através colocação de entraves ao acesso aos recursos do programa por razões políticas. Nestas situações é comum a esfera superior criar uma espécie de governo paralelo, executando as ações através de instituições privadas ou mesmo públicas, ignorando os governos locais.

Quanto ao nível meso (quadro 3), devem ser respondidas as seguintes questões que dizem respeito às dimensões enraizamento e autonomia.

Dimensão enraizamento - O capital social existente nos municípios envolvidos no projeto é suficiente para promover a integração e o trabalho conjunto das instituições (financeiras, técnicas, vias de comercialização, etc.) e pequenos produtores de flores?

Dimensão autonomia - A produtividade das relações de trabalho conjunto entre os agentes (instituições e pequenos produtores) permitem constatar confiança mútua?

As tomadas de decisão por meio de estratégias participativas contribuem para aumentar a confiança dentro da comunidade, entre os diversos agentes - institucionais e individuais ou os envolvidos em um projeto – sendo as decisões tomadas baseadas no conhecimento da realidade e das demandas das comunidades

Uma questão importante nesta variável é a diferença nos tempos requeridos pelos agentes públicos e o necessário para as metodologias participativas. Via de regra, os prazos previstos nos projetos públicos não é escasso para que haja participação das comunidades. Esta é uma dificuldade que precisa ser superadas para que surjam mediadores locais sejam implementada uma participação de todos os agentes de forma a potencializar os resultados dos projetos.

Quanto a sinergia e complementaridade entre os ativos sociais, a importância dos agentes que operacionalizam a execução dos objetivos do projeto é acrescida. Estes agentes fazem a ponte entre o governo e os beneficiários do projeto e a sua intermediação é fundamental a sua execução plena. Em muitos casos as tensões entre técnicos e beneficiários está ligada á questões que tem a ver com transferências de saberes e diferenças nos tempos de atuação de cada um dos grupos, nomeadamente quando há cobranças de prazos (ARRIAGADA e MIRANDA, 2005).

Já em relação ao nível micro, as questões são:

Dimensão enraizamento - A operacionalização do programa permite trabalhar com os ativos sociais de que os pequenos produtores dispõe, na busca do aumento da produtividade e da melhoria dos padrões de vida das comunidades envolvidas ?

Dimensão autonomia - A implantação/execução desvela as relações de confiança existente/inexistentes nas comunidades?

Em nível micro, é fundamental que os formuladores da política pública disponham de instrumentos capazes de realizar diagnósticos precisos acerca das realidade das comunidades locais. O êxito de uma política depende de que a sua formulação, e a sua posterior aplicação, não levem em conta comunidades idealizadas longe das realidades locais que serão encontradas depois pelos agentes que levarão a cabo as tarefas operacionais dos projetos.

Nesta perspectiva, os agentes públicos devem ter em conta o capital social pré-existente nas comunidades. É de suma importância conhecer e respeitar as trajetórias, utilizando os conhecimentos acumulados como matéria-prima importante. Menosprezar as trajetórias das e os conhecimentos acumulados pode inclusive gerar focos de desconfiança em relação às intenções do poder público (ARRIAGADA e MIRANDA, 2005).

Como se observa, o modelo de análise aqui proposto e explicitado tem a preocupação de elencar parâmetros plenamente identificáveis e mensuráveis, tentando captar o caráter multidimensional presente no conceito de capital social, tanto em caráter individual como comunitário. Nesta perspectiva, pretende-se o modelo idealizado para a análise do projeto Flores da Bahia, possa ser aplicado, mediante adaptações, em análises a cerca do capital social em locais ou regiões onde estejam sendo implantados projetos e programas públicos.

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo trouxe como objeto a proposição de um modelo para análise das políticas públicas voltadas ao agronegócio de flores e plantas ornamentais no estado da Bahia, sob o enfoque do capital social. Para tanto, utilizou-se como estrutura teórica os conceitos de capital social e agronegócio, considerando as especificidades do setor analisado.

Com relação à mensuração e análise do capital social em suas mais variadas esferas optou-se por privilegiar na estrutura analítica o contexto bidimensional (enraizamento e autonomia), congregando três níveis possíveis de abordagem (macro, meso e micro). Para cada uma das combinações entre dimensão e nível, foram definidos os parâmetros sobre aos quais se dará a mensuração, sob a estrutura proposta.

Nesse sentido, é possível observar a pertinência empírica de aplicação do instrumento, uma vez que todos os parâmetros relacionados são plenamente identificáveis e passíveis de mensuração (quali e/ou quantitativa) no contexto dos agronegócios de flores e plantas ornamentais da Bahia, dadas as características apresentadas por este setor, onde há uma forte presença do Estado na promoção das políticas públicas e cuja relação social, muito intensa, reforça a pertinência da abordagem pela ótica do capital social.

Assim, o presente modelo será alvo de aplicação empírica, no desenvolvimento futuro de atividades relacionadas ao programa pesquisado, cujo resultado deverá fornecer os devidos parâmetros para ajuste e construção de uma base empírica e conceitual que possa abranger outros segmentos do agronegócio nacional.

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