Contribuciones a las Ciencias Sociales
Febrero 2012

INTERCULTURALIDADE E "CIDADES-GÊMEAS": NOVAS CONFIGURAÇÕES IDENTITÁRIAS?

Cirlani Terenciani (CV)
citerenciani@yahoo.com.br
Universidade Federal da Grande Dourados

 

 

RESUMO

Questões sobre diversidade cultural, étnica e territorial tornam-se cada vez mais presentes em nossa sociedade. Nesse contexto, áreas transfronteiriças tornam-se lócus deste tipo de discussão por apresentarem características específicas em função de sua localização geográfica. No caso das “cidades-gêmeas”, isto é, cidades conurbadas localizadas na “faixa fronteira”, como Ponta Porã (Brasil) e Pedro Juan Caballero (Paraguai), a condição de transitoriedade populacional conferem a esta fronteira um territorialidade própria, marcada por conflitos, tensões, encontros e desencontros entre os moradores locais, brasileiros e paraguaios. Para a compreensão das interações transfronteiriças, nos embasamos na perspectiva intercultural, que contribui para o entendimento dos diálogos culturais e processos de (re)configuração identitária. Dessa forma, áreas transfronteiriças representam uma “quebra” na “homogeneidade das identidades nacionais”, deixando claro que as culturas e os povos são dinâmicos e vivenciam tensões inerentes à existência humana e que possibilitam novas formas de viver, criando novas histórias e novas geografias.

Palavras-chave: Cidades-gêmeas; diversidade cultural; brasileiros; paraguaios; interculturalidade; (re)configurações identitárias.

 



Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Terenciani, T.: "Interculturalidade e "Cidades-Gêmeas": ¿novas configurações identitárias? ", en Contribuciones a las Ciencias Sociales, Febrero 2012, www.eumed.net/rev/cccss/18/

INTRODUÇÃO

No atual processo de globalização, temas relativos a fronteiras internacionais tornam-se pertinentes à medida que a mobilidade populacional se intensifica e a ação de controle territorial dos Estados-nação é questionada por muitos autores. Entretanto, o que vemos efetivamente é um fortalecimento de processos identitários, principalmente em áreas transfronteiriças, como é o caso das “cidades gêmeas” Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, a primeira localizada na porção sul do Estado de Mato Grosso do Sul (Brasil) e a segunda no Departamento de Amambay (Paraguai) e classificadas como “cidades gêmeas” em função da tipologia apresentada por ambas, na qual suas áreas urbanas estão conurbadas uma à outra, separadas/unidas apenas por uma rua (Avenida Internacional, no lado brasileiro, e Rua Dr. Francia, no lado paraguaio).
A fronteira pode ser entendida tanto como um elo entre países e sujeitos distintos, quanto um limite de separação para que este contato se efetive. A literatura referente ás fronteiras e os limites é intensa, variando de perspectivas teóricas e áreas de conhecimento, tornando-se comuns em disciplinas como a Ciência Política, a Geografia, Antropologia, Sociologia, dentre outras que se dedicam a este campo de pesquisa. Fronteiras e limites podem assim conter significados e formas de abordagens distintas entre si, variando das concepções geopolíticas, concernenete à discussão da área de influência e soberania do Estado-nação, até chegar a noções metafóricas, relativas às relações humanas, de aproximação e/ou distanciamento entre povos de origens étnica e/ou territorial distintas.
Nesse sentido, procuramos através deste ensaio apresentar alguns elementos presentes nestas duas cidades localizadas na “faixa de fronteira” 1 internacional entre Brasil e Paraguai, que em função de sua localização específica, possibilita que seus moradores, brasileiros e paraguaios, vivenciem uma territorialidade própria, marcada pela condição de transitoriedade, hibridismo e interculturalidade que perpassam o espoco do controle político-administrativo do Estado-nação.
A contiguidade física existente entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, permite aos sujeitos locais uma experiência múltipla e dinâmica, marcada por elementos culturais e identitários de culturas distintas e contrastantes, principalmente ao considerarmos os conflitos históricos vivenciados por brasileiros e paraguaios a partir da Guerra contra o Paraguai (1864-1870) que, após o seu fim, contribui para a divulgação e consolidação, por parte das elites brasileiras, de estereótipos negativos e depreciativos em relação ao povo paraguaio que ficou conhecido como um povo preguiçoso, desleal, contrabandista e, em contrapartida, brasileiros são considerados pelos paraguaios como oportunistas e aproveitadores. Assim, numa área transfronteiriça como esta, a fronteiras perpassam as relações humanas, que nem sempre se apresentam de forma harmônica entre povos.
Entretanto, acreditamos que a abordagem intercultural contribui para o entendimento das práticas de hibridismo cultural existente entre a população local, que através do contato diário, convivem com elementos culturais e identitários de ambas as culturas, originando uma outra cultura, híbrida, múltipla, transfronteiriça que pode trazer novos olhares e novas concepções do que é a fronteira e do que é “ser brasileiro e/ou paraguaio”, sem que estas formas de identificação signifique a reprodução dos antagonismos existentes entre a população local, (re)criando novas formas de ver e viver no mundo.

 

Fronteira e limite internacional: integração e/ou separação?

As cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero são classificadas pela Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PRPDFF), do Governo Federal brasileiro como “cidades gêmeas” em função da integração física existente entre ambas, localizadas na “zona de fronteira” que representa “[...] um espaço de interação, uma paisagem específica, com espaço social transitivo, composto por diferenças oriundas da presença do limite internacional, e por fluxos e interações transfronteiriças cuja territorialização mais evoluída é a das cidades-gêmeas” (BRASIL, 2005 p. 21).
Nesse contexto, o cotidiano destas cidades e da população que nelas reside, é marcado por uma territorialidade própria, pautada na mobilidade transfronteiriça, na qual o ir e vir para ambos os lados do limite internacional, que separa/une Brasil e Paraguai, se faz naturalmente. Para entrar ou sair do Brasil ou do Paraguai, basta apenas atravessar uma rua.

Nos propomos assim, a realizar uma breve discussão a respeito do sentido atribuído às fronteiras, que representam não apenas a demarcação da área de influência do Estado-nação, mas a uma situação representada pelo encontro/desencontro dos sujeitos, nas práticas sociais, nos preconceitos, discriminações e em atos que fazem emergir verdadeiros limites nas relações entre brasileiros e paraguaios. Mas qual a diferença entre limite e fronteira?
De acordo com Claude Raffestin (1993) as relações humanas são delineadas e permeadas por limites, “traçamos limites e esbarramos em limites” (p. 164) no decorrer de nossas relações socioespacais. Entretanto, no campo político, a noção de limite “justifica territorialmente as relações de poder” (p. 165). O limite então representa a delimitação de uma determinada área, seja a partir de elementos físicos (rios, montanhas...), ou imaginários como, por exemplo, as coordenadas geográficas, que podem definir a extensão e a  área de soberania de um determinado Estado-nação.
Para Lia O. Machado (2009), o limite internacional representa o “regulador das relações interestatais” (p. 3), definindo cinco principais funções do limite no âmbito da sociedade capitalista:

Primeiro, no sistema interestatal os limites internacionais definem o perímetro máximo do controle efetivo exercido por governos centrais. Segundo, os limites constituem um fator de separação entre unidades territoriais. Terceiro, os limites do estado moderno tem caráter legal, fundamentado no conceito de soberania. Quarto, a legitimidade desses limites é dada pelas leis internacionais mas principalmente pelos integrantes do estado, em nome de certos valores, lealdades e identidades. Quinto, o limite territorial embora seja um conceito mais antigo que o sistema capitalista passou a representar com a expansão deste não só o papel de regulador mas de produtor de redes de intercambio de todo tipo [...] MACHADO, 2009, p. 5, grifos da autora).

Mas qual a relação entre limite e fronteira? Para Claude Raffestin (1993) “o limite é uma classe geral, um conjunto cuja fronteira é um subconjunto” (p. 166). Para ele, a fronteira apresenta fases de funcionalização e desfuncionalização2 . Entretanto, “a fronteira nasce da diferença”, em um processo que, segundo o autor, pode ser resumido em quatro momentos: “diferenciação, tradução, relação e regulação” (RAFFESTIN, 2005, p. 11). A fronteira engloba assim, momentos distintos entre si, mas que se juntam criando territorialidades específicas.
A partir desta concepção, as fronteiras apresentam tanto uma função geopolítica de regulação, como um sentido de “diferenciação” ao qual remete Claude Raffestin (1993), isto é, ela age como um elemento de distinção e definição de uma ou mais identidades em relação a outras. Para este autor, a fronteira representa realidades vivenciadas diariamente, que ele caracteriza como um “sistema biossocial”.

A ordem e a desordem não são, paradoxalmente, noções opostas e não representam mais do que momentos de um processo semelhante ao da cinemática da fronteira. A fronteira não é uma linha, a fronteira é um elemento de comunicação biossocial que assume uma função reguladora. Ela é a expressão de um equilíbrio dinâmico que não se encontra somente no sistema territorial, mas em todos os sistemas biossociais (RAFFESTIN, 2005, p. 13).

Justamente por compreender “todos os sistemas biossociais”, como aponta Claude Raffestin (2005), acreditamos que para falar em fronteira, seja necessário refletir também sobre as “muitas fronteiras” que podem surgir nestas áreas fortemente institucionalizadas e militarizadas. As noções de limites e fronteiras fazem parte do cotidiano social, perpassando e avançando sobre as concepções geopolíticas que tradicionalmente as configuravam.
É nesse contexto transfronteiriço que estão inseridas as “cidades-gêmeas” de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, onde a proximidade física entre ambas as cidades possibilita que a população local (paraguaios e brasileiros) vivenciem cotidianamente uma situação de  mobilidade e trânsito para os dois lados do limite internacional, caracterizando uma territorialidade efetivamente múltipla e híbrida na qual se “misturam” idiomas, comidas, músicas e famílias, mas que surgem também preconceitos, discriminações e processos de  inferiorização do “outro”.
Assim, entendemos que a fronteira se caracteriza também de forma metafórica, configurando-se a partir das relações humanas, que fazem emergir nos espaços “limites e fronteiras” que dificultam o contato social, que congregam em si imagens estereotipadas do “outro”, que muitas vezes, impede a realização efetiva de troca e diálogo (inter)cultural.
Os moradores das cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero acabam vivenciando “muitas fronteiras” que se manifestam para além da “zona de fronteira” e do limite internacional entre Brasil e Paraguai. As fronteiras materializam-se no convívio social, nos encontros/desencontros entre brasileiros e paraguaios, nos preconceitos, discriminações, nas relações de parentesco, de amizade, nas trocas econômicas (TERENCIANI, 2011), enfim, nas diversas esferas do “sistema biossocial”.
Estas situações de proximidade/separação se manifestam nas relações cotidianas dos sujeitos como fronteiras simbólica e/ou material, pois é “[...] em qualquer lugar, ao aludirmos ao Outro, que (re) produzimos – fortalecendo ou distendendo – ‘fronteiras identitárias’ (que podem ou não se revelar também como ‘fronteiras de classe’) [...]” (GOETTERT & MONDARDO, 2009, p. 125). As fronteiras podem assim, se efetivar com significados que extrapolam sua função histórica de delimitação do território político-administrativo, de modo que para Anssi Paasi (2003, p. 466) as fronteiras estão presentes na “construção das comunidades, das identidades territoriais e na construção da imagem de grupos culturalmente homogêneos”.
Em função da dinamicidade presente nos espaços transfronteiriços e do caráter complexo do desenvolvimento de pesquisas nestas áreas, acreditamos que a proposta desenvolvida por Nicole M. D. Rochefort (2002), pode nos auxiliar em sua compreensão. Para ela, ao analisarmos áreas de fronteira devemos nos embasar em duas principais abordagens: externas (relativas ao poder e soberania do Estado-nação) e internas (referentes aos contatos, encontros e conflitos entre sujeitos e/ou grupos distintos). É nesse sentido que procuramos entender as cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, onde os conflitos e tensões entre os moradores locais se dão em escalas de contato e interação que perpassam o poder do Estado-nação, com seu controle político-administrativo, bem como abrangem as dimensões culturais e identitárias dos sujeitos que tanto entram em tensão e choque, como ocorrem relações de diálogo e intercâmbio cultural, característico das práticas interculturais.
As fronteiras, sejam elas político-administrativas ou identitárias, manifestam-se em diferentes contextos e em diferentes escalas de análise. Em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero a fronteira pode “unir” e/ou “separar” os sujeitos e seus territórios (re)criando identidades, culturas e territórios marcados pelo hibridismo e pela interculturalidade.

 

Ponta Porã e Pedro Juan Caballero: (re)configurações do agir e do existir transfronteiriço

O existir cotidiano numa área de fronteira internacional, como em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero fazem emergir conflitos e tensões culturais entre os sujeitos, brasileiros e paraguaios, que criam e reproduzem imagens e pré-conceitos do que possivelmente é o “outro”: os paraguaios são alvo de intensa discriminação e preconceito em função de sua origem cultural e étnica, sendo estes considerados pelos brasileiros como sinônimo de “ilegalidade”, de “falsidade”, de “preguiça” e outros adjetivos depreciativos que lhes são atribuídos. Já para os paraguaios, o brasileiro é representado muitas vezes como o “oportunista”, “malandro”, aquele com o qual se deve tomar cuidado. Para Álvaro Banducci Jr. (2011), “a convivência pacífica não se traduz, entretanto, num convívio fraterno e harmonioso entre os povos paraguaio e brasileiro” (p. 11). Para este autor, as representações em torno das identidades nacionais na fronteira Brasil-Paraguai aludem aos conflitos históricos entre ambos os povos e que se manifestam ainda hoje com grande intensidade.

[...] Existe uma rivalidade histórica, que advém do período da Guerra com o Paraguai, em função da qual são disseminadas imagens negativas do Brasil, visto como nação imperialista e usurpadora de territórios, enquanto que seu povo é tido como arrogante e presunçoso. Os brasileiros, por seu lado nutrem uma imagem do Paraguai como país atrasado, subdesenvolvido, com um povo pouco empreendedor, violento e desleal. (BANDUCCI JR., 2011, p. 11).

As representações em torno do “outro”, seja ele brasileiro ou paraguaio denotam a intolerância para com o “diferente” e a alteridade entendidas sempre como com uma oposição à identidade, do “eu” sendo, portanto, depreciada e negada (SILVA, 2000), fazendo emergir limites que se manifestam material, simbólica e espacialmente nestas duas cidades.
Por ser uma área de fronteira internacional, os conflitos e tensões tendem a se intensificar a partir dos contatos cotidianos, pois as identidades são questionadas a todo o momento e os processos de identificação na cultura, na língua falada e na nacionalidade são afirmados e reafirmados diariamente, expressando as fronteiras do humano3 , pois como afirma Roberto C. de Oliveira (2006, p. 108) “[...] no caso de uma situação de fronteira [internacional], aquilo que surge como poderoso determinador social, político e cultural – provavelmente mais do que a etnia – passa a ser a nacionalidade dos agentes sociais [...]”.
Identidade e cultura adquirem um papel central nas fronteiras internacionais para pensarmos as (re)configurações socioculturais, bem como a forma como os sujeitos se relacionam entre si e, por sua vez, produzem, reproduzem e vivenciam o espaço.
Entretanto, como observou Roberto L. Corrêa (2009), as discussões em torno do termo cultura não são simples. Para o autor, ele é um termo polissêmico, “[...] com muitos significados, aberto a debates em torno de distintas concepções sobre três aspectos, a abrangência dos fenômenos considerados, o papel da cultura na sociedade e sobre os processos de mudança [...]” (p. 1). Já na concepção de Paul Claval (2007), a cultura é entendida como:

[...] soma dos comportamentos, dos saberes, das técnicas, dos conhecimentos e dos valores acumulados pelos indivíduos ao longo de suas vidas e, em outra escala, pelo conjunto dos grupos de que fazem parte [mas] Não é portanto um conjunto fechado e imutável de técnicas e de comportamentos [...]” (CLAVAL, 2007, p.63).

Nestor G. Canclini (2009) considera a cultura enquanto “conjunto de processos sociais de produção, circulação e consumo da significação na vida social” (p. 41, grifos do autor). Para este autor, o significado de cultura está muito além de obras de arte, símbolos e signos reconhecidos mundialmente, no qual afirma:

[...] A cultura apresenta-se como processos sociais, e parte da dificuldade de falar dela deriva do fato de que se produz, circula e se consome na história social. Não é algo que apareça sempre da mesma maneira. Daí a importância que adquiriram os estudos sobre recepção e apropriação de bens e mensagens nas sociedades contemporâneas. Mostram como um mesmo objeto pode transformar-se através de uso e reapropriações sociais. E também como, ao nosso relacionamento uns com os outros, aprendemos a ser interculturais (CANCLINI, 2009, p. 41-42, grifos do autor).

A cultura é representada por signos e símbolos cujo valor se caracteriza subjetivamente, mas que ganha uma dimensão material ao se manifestar espacialmente. Para Joël Bonnemaison (2002), a cultura é uma manifestação simbólica que dá sentido e significado ao espaço e ao território. Em sua concepção, a cultura, embora seja uma realidade subjetiva, representa o que o autor chama de “vertente do real”, que congrega “visões de mundo”.

[...] A cultura tendo hoje a ser compreendida como uma outra vertente do real, um sistema de representação simbólica existente em si mesmo [...] como uma ‘visão de mundo’ que tem sua coerência e seus próprios efeitos sobre a relação da sociedade com o espaço. Para os geógrafos, a cultura é rica de significados porque é tida como um tipo de resposta, no plano ideológico ou espiritual, ao problema de existir coletivamente num determinado ambiente natural, num espaço e numa conjuntura histórica e econômica colocada em causa em cada geração [...]. (BONNEMAISON, 2002, p. 86).

Através da cultura a identidade se manifesta, se (re)cria em um constante processo de identificar-se, entendido por Rogério Haesbaert (2005) como uma “identificação em curso” (p. 175). Haesbaert alega que mesmo sendo de caráter representacional, os elementos identitários se materializam no espaço, dando ao mesmo sua configuração territorial: é o espaço que dá à identidade sua materialidade e concretude, sendo assim, um de seus elementos estruturadores. Nesse sentido, a identidade é entendida como um ato relacional, pois implica em um constante processo de “identificar-se”, trantando-se “[...] sempre de uma identificação em curso, e por estar sempre em processo/relação ela nunca é uma, mas múltipla [...]” (p. 175, grifo nosso).
Para Stuart Hall (2006) “[...] a identidade já está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é ‘preenchida’ a partir de nosso exterior, pelas formas através das quais nós imaginamos ser vistos por outros [...]” (p. 39). A dinâmica presente no processo de identificação implica em um constante movimento da identidade e da cultura, pois são carregadas de elementos externos, resultado da interação com o “outro”, com a “diferença” e a “alteridade”, que são frequentemente considerados como algo inferior (SILVA, 2000)4 .
Para Manuel Castells (2002), os processos identitários estão pautados em três formas:

  • Identidade legitimadora: representada pelas instituições dominantes como os Estados nacionais;
  • Identidade de resistência: representado pelos diversos atores sociais que são estigmatizados historicamente, desvalorizados perante a lógica dominante;
  • Identidade de projeto: caracterizada pela ação que os atores sociais podem construir no sentido de criação de uma nova identidade, redefinindo-a perante a sociedade).

As identidades são, nesta perspectiva, passíveis de mudança e transformação histórica e espacial. Além disso, os sujeitos podem apresentar elementos de identificação distintos, que podem ser acionados ou desativados dependendo o contexto em que estão inseridos. Dessa forma, Manuel Castells (2002) afirma a construção das identidades que cada sujeito pode desempenhar é formada por vários elementos de significação individual e coletivos.

[...] A construção de identidades vale-se da matéria-prima fornecida pela história, geografia, biologia, instituições produtivas e reprodutivas, pela memória coletiva e por fantasias pessoais, pelos aparatos de poder e revelações de cunho religioso. Porém, todos esses materiais são processados por indivíduos, grupos sociais e projetos culturais enraizados em sua estrutura social, bem como em sua visão de tempo/espaço [...] (CASTELLS, 2002, p. 23).

A identidade é assim um processo sempre em construção e, portanto, não é fixa, podendo apresentar diferentes configurações, englobar novos elementos, se (re)criar como identidades híbridas, com múltiplos pertencimentos. Nesse sentido, temos as palavras de Boaventura de Souza Santos (2005, p. 135):

Sabemos hoje que as identidades culturais não são rígidas nem, muito menos, imutáveis. São resultado sempre transitórios e fugazes de processos de identificação. Mesmo as identidades aparentemente sólidas, como a de mulher, homem, país africano, país latino-americano ou país europeu, escondem negociações de sentido, jogos de polissemia, choques e temporalidades em constante processo de transformação, responsáveis em última instância pela sucessão de configurações hermenêuticas que de época para época dão corpo e vida a tais identidades, identidades são, pois identificações em curso (grifos nossos).

A identificação em curso a que se refere Boaventura de Souza Santos (2005) se define a partir da alteridade, da diferença, do “outro”. Entretanto, esta relação nem sempre ocorre de forma harmônica, implicando em processos de negação e inferiorização do “outro”. Para Rogério Haesbaert “[...] a diferença do Outro se transforma na sua estigmatização, no seu ‘rebaixamento’, na sua depreciação”. (HAESBAERT, 2005, p. 176). Identidade e diferença/alteridade estão interligadas, entretanto, tendemos a considerá-las como realidades antagônicas, na qual a diferença é considerada, muitas vezes, como sinônimo de inferioridade, como aponta, dentre outros, Tomaz T. da Silva (2000).
A partir das proposições em torno dos conceitos de cultura, identidade e fronteira acreditamos que estes estão intimamente vinculados entre si, expressando em seus significados os encontros e desencontros de sujeitos que, por sua vez, são também dinâmicos, múltiplos e contraditórios em seu existir e é nesse sentido que procuraremos, a seguir, dialogar com a corrente intercultural relacionando-a com a realidade fronteiriça de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.

A interculturalidade como possibilidade de construção de novos saberes e novos viveres na fronteira Brasil-Paraguai.

As discussões em torno da interculturalidade nos fazem refletir sobre aspectos culturais e identitários de grupos distintos que se relacionam entre si e, muitas vezes, entram em conflitos e choques. Conceitualmente as questões sobre diversidade cultural e interculturalidade ganharam maior repercussão, quando em 1978 a UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura) aprova a “Declaração sobre Raça e os Preconceitos Raciais”, documento este que lança conceitos fundamentais que nortearão a educação intercultural e traz consigo uma maior visibilidade sobre temas como identidade e diferença/alteridade.
De acordo com Nestor G. Canclini (2009) a interculturalidade é uma condição da sociedade atual, de modo que em diferentes escalas e níveis de ação os sujeitos estão realizando práticas interculturais, mesmo que de forma inconsciente. Para este autor, a interculturalidade tornou-se um conceito central para análise da sociedade, pois em diferentes esferas da vida humana, estamos vivenciando situações interculturais de troca e diálogos com outras culturas que, por sua vez, apresentam uma dimensão espacial na medida em que são vivenciadas por sujeitos através de suas práticas cotidianas aos produzirem e reproduzirem o espaço humanizado.

[...] o que tratamos de ver atualmente [...] é como se reelabora interculturalmente o sentido [de cultura]. Não só dentro de uma etnia nem sequem dentro de uma nação, mas em circuitos globais, superando fronteiras, tornando porosas as barreiras nacionais ou étnicas e fazendo com que cada grupo possa abastecer-se de repertórios culturais diferentes [...] (CANCLINI, 2011, p, 43, grifos do autor).

De acordo com Lozandro A. Tedeschi (2008), a interculturalidade representa não apenas a coexistência e o reconhecimento da diversidade e da diferença cultural, mas busca promover relações e práticas dialógicas entre grupos culturais distintos, buscando assim, construir novas formas de viver e pensar o mundo.

Quanto ao nível social, a interculturalidade orienta processos que têm por base o reconhecimento do direito à diversidade, e a luta contra todas as formas de descriminação e desigualdade social e tentam promover relações culturais diferentes. Neste sentido, trata-se de um processo permanente, sempre inacabado, marcado por uma deliberada intenção de promover uma relação dialógica e democrática entre as culturas e os grupos involucrados e não unicamente de uma coexistência pacífica num mesmo território. Essa seria a condição fundamental para qualquer processo ser qualificado de intercultural [...]. (TEDESCHI, 2008, p. 14).

Lozandro A. Tedeschi (2008) argumenta que a interculturalidade caracteriza-se como uma postura teórica e política que tem por base o diálogo cultural para além do mero reconhecimento do outro. Nesta mesma perspectiva, temos os apontamentos de Reinaldo M. Fleuri (2004), para quem a interculturalidade representa um termo complexo que engloba diversos contextos socioculturais.

O que nós estamos chamando aqui de intercultura refere-se a um campo complexo em que se entretecem múltiplos sujeitos sociais, diferentes perspectivas epistemológicas e políticas, diversas práticas e variados contextos sociais. Enfatiza o caráter relacional e contextual (inter) dos processos sociais permite reconhecer a complexidade, a polissemia, a fluidez e a relacionalidade dos fenômenos humanos e culturais. (FLEURI, 2003, p. 22, grifos do autor).

Nesse contexto, acreditamos que o conceito de interculturalidade nos auxilia na compreensão das relações estabelecidas entre brasileiros e paraguaios em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, que mesmo vivenciando conflitos e tensões cotidianas, se relacionam entre si e compartilham elementos culturais e identitários em comum, que juntos formam a cultura e a identidade transfronteiriça, à medida que esta é representa o trânsito e a mobilidade nos quais os sujeitos expressam e vivenciam uma territorialidade híbrida, dinâmica, complexa e múltipla, tal como a própria fronteira.
No caso de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, a diversidade e a diferença cultural adquirem uma conotação política e nacional, e as relações interculturais representam uma alternativa para o processo histórico de rivalidade entre brasileiros e paraguaios, possibilitando a recriação identitária a partir da reelaboração e resignificação dos elementos culturais e identitários de brasileiros e paraguaios, que juntos, formam a identidade transfronteiriça.
A fronteira como um “sistema biossocial” pode apresentar-se como um “cruzamento de culturas” propício a hibridizações e relações interculturais. Acreditamos que em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero possa haver algumas aproximações com as proposições de Hommi K. Bhabha (2009), quando este autor tece algumas considerações a respeito de termos como identidade e diferença cultural. Em suas abordagens, o termo “fronteira” aparece de forma metafórica representando um “entre-lugar”, ou seja, um local “entre-culturas” que possibilita a recriação de novos significados e novos sentidos para elementos já existentes. Assim, mediante o acompanhamento dos processos de hibridização entre brasileiros e paraguaios na fronteira internacional Brasil-Paraguai, acreditamos que esta fronteira se assemelha ao conceito de “entre-lugar” proposto por Hommi K. Bhabha. Mas como ocorrem estes processos de hibridização?
A partir do levantamento bibliográfico e de pesquisas empíricas por nós realizadas no período de 2009-2011, constatamos que um dos principais fatores que contribuem para estas relações de encontros e desencontros culturais entre brasileiros e paraguaios em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero é a escola, especificamente as localizadas Brasil (TERENCIANI, 2011). Isto se deve ao fato de que muitos alunos e alunas paraguaios estudam no Brasil. Mas como isso é possível? A resposta a esta pergunta é simples e complexa ao mesmo tempo: muitos pais (paraguaios) registram seus filhos no Brasil. Os motivos são variados: a gratuidade do serviço de registro de nascimento brasileiro e do sistema de educação e saúde públicos inexistentes no Paraguai, são alguns deles.  Além disso, muitos acreditam que a “nacionalidade brasileira” possibilitará a seus filhos melhores oportunidades de emprego e condições de vida futura, como vagas em universidades, melhores salários, dentre outros fatores.
As escolas de Ponta Porã atuam como fator de “aproximação” entre brasileiros e paraguaios. Usamos o termo aproximação entre aspas porque esta não se dá de forma harmônica e homogênea em todas as esferas e escalas de análise. Mesmo estando numa área de grande proximidade física, brasileiros e paraguaios vivenciam tensões e conflitos interétnicos que se desdobram em inúmeras práticas de discriminação, preconceitos e estereotipagem do “outro”. Entretanto, apesar destas tensões diárias, os encontros entre culturas e sujeitos se fazem e refazem no espaço escolar e perpassam seus muros, criando novas estruturas socioespaciais, simbólicas e materiais.

A escola ganha assim uma importância central nesse processo de discussão e problematização da alteridade/diferença, sendo um ambiente no qual a interação e o contato entre brasileiros e paraguaios [...] pode se tornar uma fonte de relações nas quais o respeito para com as diferenças esteja presentes cotidianamente, sem inferiorizações alheias, para assim chegar a práticas sociais emancipatórias e a formas de exercer a cidadania além dos marcos legal-regulatório presente nas fronteiras internacionais. (TERENCIANI, 2011, p. 68).

Assim, o viver na fronteira, no “entre-lugar” traz novas possibilidades aos sujeitos locais. A fronteira e a escola representa um lugar de trocas, de aproximações/distanciamentos nos quais os moradores vivenciam uma territorialidade múltipla, atravessando e transitando a/na fronteira. Ao se referir ao processo de ensino/aprendizagem a partir da perspectiva intercultural, Ronaldo M. Fleuri (2003) argumenta que é “no espaço ambivalente entre os elementos apreendidos e os diferentes contextos a que podem ser referidos, é que pode emergir o novo, ou seja, os processos de criação que podem ser potencializados nos limiares das situações limites” (p. 22, grifos do autor).
Além disso, elementos identificadores de ambas as culturas são vivenciados por sujeitos de ambas as nacionalidades através do tereré (bebida típica da fronteira Brasil-Paraguai, produzida através da erva mate); da chipa e da sopa paraguaia (comidas típicas do Paraguai e que são muito apreciadas pelos brasileiros). Há também a estruturação de laços de parentesco entre brasileiros e paraguaios, principalmente através dos casamentos, que unem as culturas e as identidades, gerando novas representações e novos saberes sobre o viver transfronteiriço.
A identidade transfronteiriça se manifesta múltipla, congregando diferentes aspectos da cultura brasileira e da paraguaia, formando outra identidade. Como expressão desta “outra identidade”, podemos citar, por exemplo, a língua falada pelos moradores locais, principalmente em Pedro Juan Caballero, e que mesclam o guarani (idioma indígena considerado língua oficial do Paraguai a partir de 1992), espanhol e português formando um terceiro idioma transfronteiriço. Nesse sentido, temos as contribuições de Roberto L. Corrêa (2008, p. 16) quando, em diálogo com Daniel W. Gade, considera ser a língua “o mais relevante meio para expressar a identidade de um grupo [...] Mais do que isto, a língua interfere em um certo modo de ver, sentir e, talvez mesmo, de se comportar”.
Em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, a língua transfronteiriça é uma expressão dos processos de hibridização e interculturalidade que ocorrem nesta fronteira internacional, recriando identidades e também redefinindo os limites da alteridade. Assim, para Roberto L. Corrêa (2008) “[...] A identidade de si mesmo e a alteridade são, em parte, expressas por meio da língua. Constitui ela uma forma de capital cultural coletivo e, simultaneamente, pode ser vista como forma simbólica cuja espacialidade assume características específicas (p. 16).
A identidade passa por processos de reconfiguração a partir da negociação cultural e de tensões que se expressam nas tramas cotidianas de negação e afirmação cultural que ocorrem de geração para geração a partir do contato com o “outro”.
Dessa forma, através da vivência cotidiana no espaço transfronteiriço, sujeitos de diferentes nacionalidades e identidades constroem novas formas de identificação que podem contribuir para diluir as tensões identitárias entre brasileiros e paraguaios, dentro e fora da “faixa de fronteira” internacional, construindo novos sabores e novos saberes sobre as fronteiras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A fronteira internacional na qual estão localizadas as cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero apresenta-se como um espaço dinâmico e complexo em função da contigüidade física entre as duas cidades e da efetiva mobilidade populacional para ambos os lados do limite internacional. Aliado a esta mobilidade, temos também questões históricas de oposição entre brasileiros e paraguaios que acabam acarretando e intensificando os conflitos entre os povos.
A interculturalidade no contexto destas duas cidades representa uma postura teórica e política que propõe uma prática dialógica no que se refere a duas ou mais culturas existentes. Como considera Reinando M. Fleuri (2003), a interculturalidade implica no reconhecimento do caráter inter-relacional e fluido das relações humanas, de modo que não há algo dado e imutável espacial e temporalmente, especialmente no que diz respeito ás relações humanas, dentro ou fora da “faixa de fronteira”.
As relações entre identidade/alteridade, entre brasileiros e paraguaios a partir da perspectiva intercultural pode promover novas práticas de diálogos culturais. Como afirmamos em trabalho anterior, a interculturalidade contribui para a “construção de novas formas de pensar, agir e ver o mundo”, nas quais as diferenças culturais são “considerada como características eminentes das sociedades e uma opção autônoma por parte dos grupos e sujeitos em exercê-la, sendo este um direito coletivo e individual” (TERENCIANI, 2011, p. 187).
Assim, a fronteira apresenta-se não apenas como uma expressão político-administrativa, mas como esfera da vida cotidiana dos sujeitos, que diariamente se deparam com limites para a efetivação de diálogos culturais e identitários. Entretanto, ela age também como um importante elemento de aproximação entre brasileiros e paraguaios, contribuindo para que uma nova cultura e uma nova identidade se forme, marcada por este trânsito, característico da cultura e identidade transfronteiriça. Mesmo que de forma inconsciente, a interculturalidade se faz presente na fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, de modo que brasileiros e paraguaios vivenciam em diferentes escalas e em momentos distintos, elementos de ambas as culturas.
Brasileiros e paraguaios na fronteira Brasil-Paraguai, no constante movimento de ir e vir para além dos limites internacionais, podem transformar práticas socioculturais já estabelecidas de oposição entre “eu” e “outro”, criando por meio do contato intercultural novas formas de pensar e viver a fronteira, na qual a pluralidade e o diálogo cultural caracterizam-se como pressupostos para a (re)criação cultural e identitária.

 

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1 De acordo com a Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PRPDFF), a “Faixa de Fronteira interna do Brasil com os países vizinhos foi estabelecida em 150 km de largura (Lei 6.634, de 2/5/1979), paralela à linha divisória terrestre do território nacional. A largura da Faixa foi sendo modificada desde o Segundo Império (60 km) por sucessivas Constituições Federais (1934; 1937; 1946) até a atual, que ratificou sua largura em 150 km” (BRASIL, 2005, p. 9).

2 A funcionalização a que Claude Raffestin (1993) se refere diz respeito a funções fiscais, militares e ideológicas (no sentido de representar os “limites” para a unidade nacional do Estado-nação) que as fronteiras recebem a partir da institucionalização do Estado-nação. Estas funções, dependendo do contexto, podem se intensificar ou quase desaparecer. Para ele, “[...] a funcionalização ou a desfuncionalização  não afetam somente o território, mas também o tempo social no interior desse território. Com frequência, o espaço e o tempo sociais se fazem e se desfazem simultaneamente [...]” (RAFFESTIN, 1993, p. 169).

3 José de Souza Martins (1997) trabalha com a concepção de “fronteiras do humano” em uma alusão metafórica à fronteira como lugar de encontros e desencontros entre culturas e grupos distintos. Seu estudo visa discutir as frentes de expansão e as frentes pioneiras no norte do país, bem como as distintas temporalidades e a “situação de conflito social” que marcam os contatos entre tais grupos. Para este autor, “nesse conflito, a fronteira é essencialmente o lugar da alteridade” (p. 150).

4 De acordo com Tomaz Tadeu da Silva (2000), as noções de identidade e diferença estão interligadas, porém, há uma tendência vertical homogeneizante que tende a negar a diferença sob a identidade. Nesse sentido, o autor afirma que de uma maneira geral tendemos a considerar “a diferença como um produto da identidade”. Entretanto, “a identidade é a referência, é o ponto original relativamente ao qual se define a diferença. Isto reflete a tendência a tomar aquilo que somos como sendo a norma pela qual descrevemos ou avaliamos aquilo que não somos [...]. (SILVA, 2000, p. 76). Nessa perspectiva, muitas vezes, a diferença/alteridade representa elementos identitários considerados negativos que fogem aos padrões da “normalidade”, isto é, o padrão “ocidental-europeu-branco-cristão-masculino-heterossexual-nacional altamente segregador” (TERENCIANI, 2011, p. 64).