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Keynes em Cambridge 1932-1935
Mario Gómez Olivares

2.         As lições de Keynes em Cambridge: Da Teoria Monetária da Produção á Teoria Geral.

 

Conclusões

Os objectivos de Keynes a partir do modelo construído no `Treatise` foram os de demonstrar que o nível dos preços do output dependem do nível dos rendimentos monetários relativamente à eficiência, do volume do investimento(medido em custos de produção) relativa­mente à poupança e dos sentimentos `bearish` ou `bullnish` dos capitalistas relativamente à oferta de depósitos de poupança disponível no sistema bancário. Como o poder heurístico da equações não permite tecer considerações definitivas sobre as flutuações no emprego, estava aberto o caminho à procura de outro modelo em que o objecto de estudo fossem o output e o emprego.

 

Keynes afirma que a teoria clássica representa o caso limite de uma economia empresarial no qual a moeda é neutra. A neutralidade requer que a quantidade de moeda permaneça constante, e são nas mudanças da quantidade de moeda que está a origem dos problemas. Deste modo a teoria clássica deixa de fora a possibilidade da existência do desemprego involuntário aceitando a lei de Say de que a oferta cria a sua própria procura.

 

As flutuações na procura efectiva é a razão porque o produto que seria elaborado numa economia cooperativa seria não-lucrativo numa economia monetária. Excepto em casos excepcionais, a procura efectiva não flutua numa economia neutral ou cooperativa. O output tende a estar sempre no nível de pleno emprego. No modelo clássico a moeda é um instrumento temporário de conveniência usado pêlos factores para comprar o produto dos empresários num determinado período de tempo. A `classical neu­tral entrepreneur economy` é uma economia cooperativa, onde a moeda apenas serve como meio de troca e de suporte à circulação das mercadorias, pelo que a moeda não complica a transformação da poupança em investimento. O resultado mais importante que surge desta reflexão e a nova qualidade que assume a moeda numa economia capitalista, a função de entesouramento. Embora esta qualidade perde-se na análise posterior, ela vai alimentar implicitamente o carácter da noção de preferência pela liquidez num sentido do comportamento especulativo que influência as variações na quantidade de moeda e por conseguinte a taxa de juro. Uma conclusão importantíssima neste ponto é que a teoria de longo período de uma economia monetária não pode ser construída sem a política monetária, i.e. a política da taxa de juro faz parte de qualquer mecanismo de ajustamento.

No modelo de economia monetária e empresarial em que se evidência a interdependência entre as variáveis e os mercados que elas representam, Keynes estabelece uma relação entre output, investimento e despesa, mas as determinações teóricas assentam ainda no modelo do Treatise, a poupança e o investimento são variáveis que determinam as variações da taxa de lucro e estas variações determinam a oferta. O ponto fulcral é a definição de poupança como F - E, a qual está pendente de uma melhor explicação da relação entre o rendimento e a taxa de juro. O output incre­menta-se quando a despesa aumenta mais rapidamente que os custos e as mudanças no investimento têm o mesmo sinal que mudanças na despesa relativamente aos custos. O importante neste ponto é a relação que se estabelece entre as quase rendas B e a quantidade de moeda A, porque o entesouramento assume um caracter concreto e aponta na direcção da especulação monetária que se deriva de aproveitar uma situação  de quase rendas e determinar a quantidade de moeda que se pretende manter. Como o conceito de eficiência marginal padece ainda de uma clara distinção entre expectativas de curto e longo prazo, a interacção entre entesouramento e liquidez está no ar.

Neste modelo Keynes conclui que se a despesa agregada é diferente dos custos agregados, então o incremento no incentivo numa direcção não é igual ao incentivo diminuído num outro, isto é, se pretende-se aumentar o consumo não se pode diminuir os salários monetários. As flutuações que surgem a partir da diferença entre despesa e custos é uma característica essencial da economia empre­sarial o que contradiz a lei de Say. O grande problema está no entesouramento, a dificuldade está em como os empréstimos bancários e a poupança igualam a despesa da sociedade, que é uma decisão de diferentes agentes que não comunicam entre si. Embora Keynes não desenvolva ainda o seu conceito de propensão ao consumo, têm claro que I é a variável que domina a equação da despesa, com G, o Estado, como agente da confiança seja para soluções de curto prazo como para a estabilidade no longo prazo. Keynes inclina-se a discutir mas a relação consumo-poupança que a relação poupança-investimento, pois esta relação pode explicar: a descida dos lucros, os rendimentos dos factores e dos preços mas não do output.

A variação dos lucros é variação da despesa. Se a oferta cria uma procura, a monetização dessa procura, quando existe entesouramento, implica potencialmente perdas para os empresários, embora a quantidade de moeda não se modifique. O nível do output é determinado pela despesa mas pode ficar prejudicado pelo entesouramento. É imprescindível uma análise da determinação das relações entre consumo e rendimento, entre investimento e consumo, entre consumo e poupança e entre poupança e investimento, i.e.,  é necessário determinar as componentes da despesa agregada. Keynes conclui que I = Y - C mas como Y- C = S então I = S, mas S = F(Y) obriga a uma reflexão teórica que começa a configurar um outro modelo. Ao mesmo tempo constata que a velha teoria quantitativa capta apenas a procura de moeda por motivo rendimento, descurando outros motivos de procura.

A procura agregada é igual a procura para consumo e a procura  para bens de investimento. Quando a procura se incrementa, o consumo não se  incrementa proporcionalmente. Quando o emprego de N homens é lucrativo, o investimento se incrementa. Por cada N existirá  uma distribuição da produção entre bens salários e bens não‑salários. O salário real é igual a produtividade marginal do trabalho na indústria produtora de bens salários, nesse caso s, y, e D2 determinam N. Quando O - D1 se incrementa, a diferença Z ‑ D1 aumenta, pelo que existirá uma situação de superprodução, de pobreza na abundância.

Como a eficiência marginal decresce com o aumento do stock de capital, essa descida pode remediar‑se com uma descida da taxa de juro. Mas também pode distribuir‑se a riqueza mudando C, diminuindo S  ou aumentando I através de trabalhos públicos. Se D2 flutua, N flutua. Se nada acontecem, esperar‑se‑á um desemprego persistente. Como as despesas realiza­das em  consumo não serão muito diferentes das expectativas de consumo, a menos que mudem os hábitos, o rendimento não pode aumentar a menos que o investimento aumente mais rapidamente.

Das novas definições resulta claro para Keynes que quando S > I, o rendimento reduz-se, pelo que o output diminui. Os empresários corrigem as expectativas no período a seguir, dadas as expectativas realizadas neste período. Não considera a possibilidade de que as expectativas de curto prazo influenciem o output corrente, no sentido de que quando o rendimento esperado do  empresário é inferior ao do equilíbrio,  este contrai o output no curto prazo, o que explica o desemprego como um equilíbrio abaixo de pleno  emprego. Como não existem mecanismos automáticos de ajustamento, o desemprego é tenaz.

Keynes inverte o raciocínio do `Treatise` no sentido que, dado o existente nível de rendimento e a distribuição dos rendimentos para um determinado nível de output, não existe uma mudança espontânea na propensão a poupar, as mudanças na situação geral são frequentemente iniciadas a partir de mudanças no investimento. O investimento é o factor que gera a mudança dos outros factores, embora não se conheça a medida exacta desse efeito.

Keynes constrói a teoria do emprego, a teoria da procura efectiva, a teoria da preferência pela liquidez e a taxa de juro. Faltava precisar a integração da eficiência marginal do capital  na teoria do investimento, das expectativas nas várias teorias. Faltava, sobretudo, explicar a relação entre a eficiência marginal e a taxa de juro e porque esta última era recalci­trante à baixa.

Keynes estabelece as bases para um modelo que admite a instabilidade no comportamento dos investidores, na incerteza dos produtores; verifica a discrepância entre a capacidade potencial da produção e o emprego; descobre o conflito entre uma economia de interesses privados que produz um excesso de bens e não pode produzir moeda suficiente.

O resultado teórico deste processo heurístico condensa-se numa bateria de noções e relações que surgem através da observação dos comportamentos económicos e sociais e a análise económica, sendo integradas em diferentes momentos explicativos do fenómeno do desemprego. O processo heurístico é também um processo axiomático de aperfeiçoamento das próprias crenças e visões do funcionamento capitalista através da análise e da observação dos fenómenos que no seu próprio tempo se revelam mutáveis.

     Uma a heurística nos aproximou do modelo que integra o conjunto de teorias auxiliares, procurei desenvolver a teoria que encarna a visão de Keynes. Esta visão manifesta-se na demonstração de que no mundo capitalista as decisões dos agentes económicos são inevitavelmente tomadas na base de expectativas sobre o futuro económico em condições de incerteza, que a instabili­dade do capitalismo reside na variabilidade da taxa de investimento, o que provoca em última instância a flutuação do nível do emprego. A demonstração de que o sistema capitalista não possui mecanismos de ajustamentos automáticos capazes de manter um estado aceitável de produção e emprego, conhece no processo de construção da Teoria Geral uma precisão decisiva.

     Neste sentido, em consonância com a sua visão, Keynes propõe-se  não apenas estudar as determinantes do nível do equilíbrio do output e do emprego, como elucidar porque a teoria dita clássica ancorada nas suas ideias de laissez-faire não consegue ser uma teoria geral,  porque o salário monetário é rígido à baixa, o que invalida a política de redução dos salários nominais para conseguir mais emprego e, porque a taxa de juro é recalcitrante, quando a eficiência marginal do capital desce, o que reduz a eficácia da política monetária.

     Na estrutura do modelo geral em que se integram as ideias teóricas desenvolvidas nos modelos anteriores e que paulatinamente foram dando corpo à visão keynesiana, apreciamos que Keynes utiliza uma metodologia baseada na construção de hipóteses que emergem da sua noção de probabilidade, da abordagem orgânica dos problemas económicos, da sua ideologia anti-laissez-faire, recorrendo a argumentos de persuasão, construindo uma linguagem teórica nova, procurando demostrar que o mecanismo de intervenção do estado deriva duma necessidade intrínseca para o funcionamento da economia de mercado. A política de intervenção do estado era um produto obrigatório dos novos tempos, tal como no século anterior as crises periódicas tinham obrigado a uma regulação monetária permanente. O propósito era atingir uma sociedade que acautelasse o bem social, pondo a disposição para tal efeito os meios que possibilitava o diagnóstico teórico.

     O conjunto de crenças que constituem o núcleo duro do programa keynesiano emergem sinteticamente numa Teoria Geral através duma análise das determinantes do emprego, contextualizando a época histórica de crise e depressão. Surge assim um anel protector constituído por um conjunto de teorias que auxiliam as ideias, crenças de J.M. Keynes e que completam o programa de investigação. Se não existem mecanismos automáticos que assegurem o pleno emprego e a estabilidade dos preços, os factores explicativos envolventes dessa ideia tornaram-se visíveis.