MERCOSUR Y UNIÓN EUROPEA

MERCOSUR Y UNI?N EUROPEA

Manuel Cienfuegos Mateo y otros

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II. A construção jurisprudencial do primado

2. O princípio do primado do Direito Comunitário não tinha, e ainda não tem, consagração expressa nos Tratados, tendo sido erigido como um dos pilares de um processo de constitucionalização, concebido pelos juízes do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias(TJCE), os quais arvoraram-se em Founding Fathers3 de uma nova ordem jurídica4. Segundo este princípio, em caso de conflito entre uma norma nacional- seja qual for o seu valor hierárquico- e uma norma comunitária, deve sempre prevalecer esta última5. Esta argumentação do TJCE baseia-se, essencialmente, em dois vectores de diferente natureza: um de natureza funcional e outro de ordem substancial6.

3. Em primeiro lugar, este órgão recorre a uma linha argumentativa de cariz funcional, afirmando que se os Estados puderem adoptar unilateralmente medidas contrárias aos Tratados, a ordem jurídica por estes criada estará irremediavelmente condenada ao fracasso, atentando-se contra um princípio infra-estrutural da ordem jurídica europeia, que se consubstancia na necessidade do Direito Comunitário ser interpretado e aplicado de forma idêntica em todos Estados-Membros da União Europeia. Em segundo lugar, numa linha argumentativa de natureza substancial, o Tribunal Comunitário afirma a plena independência, e consequente superioridade, da ordem jurídica comunitária relativamente às ordens jurídicas estaduais.

Esta autonomia resultaria, segundo o TJCE, da transferência irreversível de poderes soberanos que os Estados realizaram a favor de uma entidade dotada de características específicas e originais. A fonte de legitimidade da ordem jurídica comunitária teria, deste modo, uma origem interna, pois esta seria uma entidade construída a partir das parcelas de soberania cedidas a título definitivo pelos Estados que a compõem. No entanto, o TJCE não se limitou a afirmar a existência de uma fonte interna, e necessariamente indirecta, da qual poderiam brotar os poderes da União, pois parece este Tribunal descobrir também uma fonte externa aos próprios Estados-Membros, da qual as Comunidades Europeias retirariam uma legitimidade originária, podendo aqui vislumbrar-se uma primeira afirmação jurisprudencial de um verdadeiro poder constituinte europeu. De facto, ao afirmar que as Comunidades são uma entidade não só de Estados mas também de cidadãos, o TJCE desloca a sua atenção para aqueles sujeitos que são os titulares últimos do poder político, e que podem fornecer uma legitimidade susceptível de permitir a esta entidade supranacional exercer uma supremacia absoluta sobre os Direitos estaduais.